Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O mercado de startups

É dura a vida das startups de jornalismo digital ao redor do mundo. De acordo com o relatório “Chasing sustainability on the net“, fruto da análise de 69 cases na Europa, Japão e Estados Unidos, os modelos comerciais dessas empresas são variados, mas não oferecem muitas garantias. Entre eles estão: publicidade, venda de conteúdo, marketing afiliado, doações, venda de dados ou serviços, organização de eventos, trabalho freelancer e treinamento ou venda de mercadoria. O mercado é tão desafiador que o estudo “Survival is Success: Journalistic Online Start-Ups in Western Europe“, elaborado pelo Reuters Institute for the Study os Journalism, sugere que sobreviver já é considerado um êxito. 

A análise “Buscando a sustentabilidade na rede” mostra que os modelos de negócio podem ser divididos em dois grupos. Os que investem em reportagens produzindo conteúdo original prevalecem, mas um segundo grupo, orientado para serviços, parece estar crescendo. Esses sites são os que não tentam monetizar o conteúdo jornalístico, mas sim moldar uma nova funcionalidade.

Muitos jornalistas investem suas esperanças em paywall, ou seja, no pagamento direto pelo acesso ao conteúdo on-line, mas, segundo o relatório, encontrar startups jornalísticas que fazem lucro com a venda de conteúdo original diretamente para o público é raro. Se esse não é o caminho, qual é? O documento apresenta algumas soluções garimpadas em três continentes.

No Reino Unido e Estados Unidos, empresas hiperlocais geram receita de modo 'tradicional' com a venda de banners em taxas semanais, mensais ou diárias. Tipicamente, estas empresas são tão pequenas que as vendas de anúncios e editoriais são tratados pela mesma pessoa. Um dos empreendedores começou a apresentar seu mídia kit, de porta a porta, para quase todos os estabelecimentos da região. O estudo confirmou assim quão forte o velho modelo de exibição de publicidade está presente em muitos dos sites estudados.

Uma saída é fazer jornalismo e vender outra coisa para financiá-lo. Uma startup no Reino Unido faz dinheiro vendendo tecnologia. No caso, análises de determinadas indústrias, tópicos ou mercados baseadas em um software de curadoria automática de dados, sem intervenção humana. Como a empresa se apresenta como especializada em política britânica, tudo que está fora dessa esfera é cobrado. Eles então vendem uma licença de utilização do software e quanto maior a demanda dos clientes, mais o preço sobe.

Na Itália, duas soluções. Uma empresa de comunicação fundada por italianos em Pequim, oferece uma profunda cobertura multimídia de assuntos relacionados à China para grupos de comunicação da Itália e Espanha. Outra empresa foca seu conteúdo em mídia, inovação e internet e serve como um subcontratado para grandes jornais italianos que procuram reportagens inovadoras e produtos multimídia. 

Uma outra empresa baseada na Inglaterra optou pelo modelo de contribuição para financiar seu negócio. Com 5.500 colaboradores pagos em todo o mundo, a empresa vende suas fotos, vídeos e histórias para mídia, principalmente para o The Guardian, The Daily Telegraph e The Wall Street Journal. A receita de vendas é dividida 50/50 com os contribuintes. 

Recorte da realidade brasileira

O conceito de startups de jornalismo no Brasil ainda não está muito difundido, mas alguns empreendedores têm apostado em boas ideias. O Platform to Support Dynamic Ontologies for News, da GPNX Tecnologia, de Campinas, tinha a proposta de um website de notícias em que fosse possível visualizar o conteúdo em variadas formas de apresentação, como mapas, tabelas e infográficos, facilitando uma navegação de acordo com os interesses de cada leitor. O projeto foi finalista em 2011 do Knight-Mozilla News Innovation Challenge, iniciativa do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas em parceria com o Mozilla, que reúne jornalistas e hackers para criar novas tecnologias a fim de beneficiar o jornalismo utilizando a web aberta.

A plataforma não se desenvolveu como um produto de mercado, mas representou um passo importante para o amadurecimento do negócio e gerou a empresa Propzmedia, com o foco em uma plataforma de gerenciamento, automatização para ativação e engajamento de audiências em múltiplos canais digitais.

Outra startup é a YouCa.st, uma agência de notícias colaborativa sediada em São Paulo que fornece fotos e vídeos aos meios de comunicação. Qualquer pessoa pode fazer uma postagem por meio da plataforma que faz a indexação desse conteúdo de acordo com tags, geolocalização, qualificação do usuário e entrega de maneira organizada aos veículos de comunicação. 

“Utilizando nossa rede, qualquer jornalista associado pode solicitar pedidos de coberturas” conta Felipe Gazolla, CEO da empresa. “Para isso, ele cadastra a pauta sobre o assunto e o YouCa.st repassa aos usuários mais adequados a produção de conteúdos sobre aquele determinado tema.” O objetivo é ampliar o poder de curadoria dos jornalistas sobre os conteúdos colaborativos, gerando assim uma valorização da informação. “Por outro lado, aumentamos o poder de compartilhamento dos nossos usuários que, a partir de agora, podem contribuir de maneira determinante para a geração das notícias.”

A empresa tem planos comerciais com os veículos jornalísticos que podem utilizar os conteúdos compartilhados. Os meios de comunicação pagam para cada material utilizado – que segue o mesmo modelo de uma agência de notícia – e os usuários que colaboram são remunerados com parte desse valor.

“De fato, não é comum vermos casos de sucesso em startups de jornalismo. Mas encaro isso como mais um desafio. Ao mesmo tempo vivemos um momento ímpar no segmento. Talvez nunca tenha se discutido tanto a profissão e o futuro dos meios de comunicação quanto agora. E isso é o mais importante”, acredita Felipe, que reconhece a oportunidade de fazer parte de um momento de transição, contribuindo para construir novas maneiras de se fazer jornalismo e de se ganhar dinheiro com isso. “E não posso reclamar da receptividade do mercado. Já temos conversas avançadas com os principais veículos de todos os meios.”

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[Christina Lima, do Nós da Comunicação]