Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os novos números da violência

Estão em todos os principais jornais do país, nas edições de terça-feira (26/2), os números inquietantes da violência na cidade de São Paulo: em comparação com janeiro de 2012, todos os tipos de crimes violentos tiveram aumento significativo, com destaque para latrocínio, ou roubo seguido de morte, que subiu 114,3%. O total de homicídios dolosos (quando há intenção de matar) aumentou 16,7%, os estupros 23,4%, assim como as diversas modalidades de roubos com uso de armas, com exceção do roubo de cargas.

Os indicadores são muito semelhantes no resto do estado, o que indica a ocorrência de problemas sistêmicos na estratégia de segurança pública.

Os jornalistas não conseguiram ser atendidos pelas autoridades, e cada redação produziu sua própria análise dos números. Segundo os jornais, em seu site oficial a Secretaria de Segurança Pública produz uma pequena contrafação, comparando janeiro de 2013 a dezembro de 2012, mostrando uma queda de 21% nos homicídios.

Trata-se de uma artimanha que a própria imprensa aplica de vez em quando para ressaltar dados estatísticos, mas que não faz sentido em termos reais, uma vez que o próprio Manual de Interpretação da Estatística de Criminalidade da Secretaria de Segurança diz que “os índices criminais estão sujeitos às variações climáticas, sazonais e irregulares”, por exemplo, com as ocorrências aumentando sempre no verão, quando há mais gente nas ruas das grandes cidades.

As relações de autoridades e da imprensa com estatísticas são sempre um caso de amor e ódio: quando favoráveis, os números são embalados em tipologia mais visível e polidos por textos explicativos; se contrariam as expectativas, se transformam em dados resumidos, quando não são simplesmente distorcidos.

No caso abordado pelos jornais na terça-feira (26), a persistência de um viés de aumento na criminalidade mais violenta em território paulista exige ir além dos indicadores. O fato de que, em 2012, o número de homicídios superou pela primeira vez em cinco anos o limite de 11 casos por cem habitantes, ultrapassando a meta de dez por cem habitantes estabelecida pelo governo do estado, deveria levar a imprensa a questionar mais as autoridades sobre a validade da estratégia para o setor.

Ânimos exaltados

Em geral, o noticiário policial induz o leitor de jornais a relacionar a violência à prática de crimes de forma mais ou menos organizada. Felizmente, têm sido mais raros, no último ano, conflitos violentos entre torcidas de futebol e de escolas de samba, que costumavam influenciar as estatísticas. Por outro lado, a troca do secretário da Segurança, ocorrida no final de novembro do ano passado, parece ter produzido uma redução nas mortes praticadas por policiais militares.

No caso dos números agora apresentados pelos jornais, convém observar que seguem aumentando os crimes de estupro, que apresentaram uma elevação de 20% na região metropolitana de São Paulo.

Um olhar de jornalista induz a desconfiar de que os paulistas não estão apenas enfrentando uma atividade maior dos criminosos: aumentou também a gravidade da ação dos assaltantes e diminuiu o limite entre a expropriação de um bem e a agressão com intenção de matar.

No caso de crimes cometidos por delinquentes contumazes, o agravamento das ações contra as vítimas pode estar relacionado à maior presença e assertividade da própria polícia – diante da possibilidade de ter que enfrentar os agentes, o criminoso prefere balear a vítima de um assalto, para ter mais chance de escapar e diminuir a possibilidade de vir a ser reconhecido.

Outro aspecto a ser considerado pela imprensa e discutido com autoridades em todos os escalões é a questão do esgarçamento dos vínculos sociais, um risco aumentado por uma certa polarização presente nas relações individuais. O assunto foi abordado superficialmente pelo editor executivo do Globo, Pedro Doria, em debate realizado em São Paulo no último dia 21/2.

Doria se referia à polarização política, perceptível nas mídias sociais digitais, com a formação de grupos de opinião que se enfrentam com palavras e posições fortes em torno de temas variados. A mesma característica se pode perceber no que se refere aos embates verbais sobre futebol e outros assuntos, e ficou demonstrada na recente visita da jornalista cubana Yoani Sánchez.

É preciso ter coragem de examinar se a imprensa não estaria contribuindo para aumentar essa radicalidade.