Partidos políticos do México estão se unindo para enfrentar os três empresários mais poderosos do país, incluindo o homem mais rico do mundo, Carlos Slim, ao negociar um amplo conjunto de reformas constitucionais para ampliar a concorrência nos mercados de telefonia e TV do país.
Articuladores dos três maiores partidos políticos do país estão negociando detalhes de mudanças que irão fortalecer reguladores governamentais, leiloar duas novas redes nacionais de televisão e suspender as restrições de investimento estrangeiro em telefonia fixa, além de outras medidas.
Duas pessoas a par das negociações disseram que ainda existem questões a serem resolvidas, mas pareceram otimistas com relação à possibilidade do fechamento de um acordo e de um projeto de lei ser apresentado ao Congresso no início desta semana.
“Estamos perto. Acho que resolveremos isso de forma positiva”, disse Jesús Zambrano, presidente do Partido da Revolução Democrática, de esquerda, em entrevista ao The Wall Street Journal. Dois membros do partido do presidente Enrique Peña Nieto, o Partido Institucional Revolucionário (PRI), se recusaram a discutir os detalhes, mas também disseram que o acordo está próximo de ser fechado, assim como um integrante do Partido de Ação Nacional, ou PAN, de direita.
As mudanças políticas têm a meta de aumentar a concorrência em dois mercados críticos do México, paralisado por monopólios por anos. A América Móvil SAB, de Slim, controla 75% da telefonia fixa no país e 70% da telefonia móvel e da banda larga. Duas empresas de televisão, o Grupo Televisa SAB e a TV Azteca SAB, formam um duopólio no setor.
A “telebancada”
Um amplo acordo ainda pode desandar sob a pressão de Slim ou dos donos da Televisa, Emilio Azcárraga, e da TV Azteca, Ricardo Salinas Pliego. Algumas mudanças podem levar anos para serem implementadas. E mesmo em um cenário de concorrentes em pé de igualdade, as empresas que dominam o mercado terão vantagens consolidadas que tornam custosa a entrada de novas companhias.
A concorrência limitada, que resulta em preços mais altos e piores serviços, custa à economia mexicana a perda de 1,8% de crescimento do PIB por ano, de acordo com a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. A OCDE tem recomendado ao México a adoção de muitas das mudanças que hoje estão sendo consideradas.
“Se Slim pode competir na Europa, por que não fazer com que ele também concorra aqui no México”, pergunta Ruben Camarillo, parlamentar do PAN.
Entre as mudanças que estão sendo estudadas, diz Zambrano, está a criação de uma nova agência para regular as telecomunicações que teria o poder de dividir companhias consideradas poderosas demais – incluindo a America Móvil. Mas ele disse que não há ainda acordo nesse ponto.
Mesmo medidas modestas para desafiar os mais poderosos líderes empresariais do México podem criar um divisor de águas num país em que o governo tem por muito tempo lutado para regular as grandes empresas. Centenas de regras criadas pela agência do setor de telecomunicação, a Comissão Federal de Telecomunicações, ou Cofetel, contra as empresas de Slim, por exemplo, têm sido impedidas de entrar em vigor por anos nos tribunais. Slim disse que ele tem o direito de usar meios legais de defender suas empresas.
Procurada, a America Móvil não retornou as ligações.
Entre as mudanças propostas está uma reforma constitucional que pode impedir as empresas de ignorar regulamentos enquanto elas os questionam na Justiça. As mudanças também estabeleceriam cortes especializadas para resolver disputas do setor de telecomunicações.
A Televisa e a TV Azteca detêm juntas 95% da audiência e resistiram no passado em ampliar a concorrência.
Cada companhia exerce influência não apenas por meio de suas transmissões, mas também por meio de um pequeno grupo de parlamentares mexicanos – congressistas que trabalharam em empresas de mídia antes de entrar na política. Eles são popularmente conhecidos como “Telebancada”. Ninfa Salinas, filha do presidente do conselho da TV Azteca, Ricardo Salinas, é senadora, por exemplo.
Terceira rede
As mudanças ocorreram em meio a um amplo esforço do presidente Enrique Peña Nieto de reafirmar o poder do Estado mexicano contra poderosos interesses específicos. A prisão, na semana passada, de Elba Esther Gordillo, a poderosa líder do sindicato dos professores, sob acusação de desviar até US$ 160 milhões da entidade marca uma dramática ação nesse sentido, disse Zambrano, presidente do PRD. A líder sindical impediu mudanças no sistema educacional do México por anos.
No domingo (3/3), em outro indício da seriedade do desejo de mudança, o PRI aprovou numa convenção nacional uma modificação em sua plataforma política que abre caminho para que Peña Nieto apresente as aguardadas reformas fiscais e de setores cruciais da economia, como o petrolífero.
“Eu acho que há uma percepção de que a paralisia dos últimos 12 anos permitiu que esses outros poderes – incluindo grandes empresas e sindicatos – tomassem o poder para si, e o governo está tentando se reafirmar”, disse Damian Fraser, chefe da área de ações do banco de investimento UBS.
A Televisa disse que considera bem-vinda a competição e que considera o leilão de novas redes “saudável” para o país. O vice-presidente executivo da Televisa, Alfonso de Angoitia, disse em recente teleconferência com analistas que a empresa sempre saiu mais forte cada vez que teve de enfrentar nova competição em áreas que vão de TV a cabo a TV via satélite.
O projeto de lei pode também acabar com o limite de 49% de investimento estrangeiro em telefonia fixa e mapear a criação de uma rede de telecomunicações alternativa, que permitiria a companhias rivais ignorar a atual rede de telefonia já existente de Slim, que por anos tem cobrado de concorrentes altas taxas de acesso, de acordo com a OCDE e reguladores mexicanos.
Para abrir o mercado de televisão no México, o governo poderia leiloar duas redes nacionais de TV para o setor privado e criar uma terceira rede para um sistema público de TV, criando um organismo de radiodifusão semelhante ao da britânica BBC. (Colaborou Anthony Harrup)
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[David Luhnow e Juan Montes, do Wall Street Journal, na Cidade do México]