Ao vivo de Roma, com a estrela vaticanista John Allen nos comentários, a CNN se perdeu ao ouvir o anúncio. “Nós acreditamos que o nome é Bergoglio”, balbuciou afinal um apresentador, após torturante silêncio.
Allen, que há semanas especulava outros nomes, garantiu então ter mencionado o cardeal argentino uma vez -quando teria comentado que “ninguém está falando dele porque é muito velho”.
A barafunda prosseguiu, com a CNN saudando Bergoglio como “o primeiro papa de fora do Ocidente”, entre muitos ineditismos, inclusive ser “o primeiro Francisco”, o que creditou integralmente a são Francisco de Assis, não ao jesuíta Xavier.
E da CNN ecoou por todo lado nos EUA, a começar das manchetes on-line do New York Times, dizendo ser ele “o primeiro” em muitas coisas e anotando o vínculo com são Francisco de Assis.
O britânico Guardian admitiu sem rodeios sua surpresa, destacando ter sido uma “decisão chocante”. Também os italianos La Repubblica e Corriere della Sera, que manchetaram a declaração do novo papa se autodescrevendo como alguém que veio do “fim do mundo”.
Versões conflitantes
A surpresa não se restringiu à cobertura. O próprio porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, teria declarado ao canal France 24 que havia cumprimentado Bergoglio poucos dias antes, “mas não esperava vê-lo vestido de branco”, como papa.
Na Argentina foi diferente: Francisco integrou-se imediatamente à cobertura.
O primeiro enunciado on-line do La Nación já saudava, com familiaridade, “Jorge Bergoglio é o novo papa”. Sob o enunciado “A mão de Deus”, o esportivo Olé ironizou a “especulação” que dava “o brasileiro Scherer como um dos máximos candidatos” e festejou o papa “torcedor do San Lorenzo”.
E o oposicionista Clarín, em minutos, já trazia na home chamadas sobre “a áspera relação dos Kirchner com Bergoglio” -e sobre como a presidente, Cristina, “enquanto se anunciava Bergoglio como papa, tuitava sobre suas obras” e criticava os jornais por não noticiá-las.
As breves biografias do novo papa distribuídas pelas agências Reuters, britânica, e Associated Press, americana, introduziram na cobertura um tom mais negativo.
Destacaram acusações de que Bergoglio não só foi omisso na ditadura argentina, nos anos 70, como abriu caminho para a prisão de dois padres. As agências cuidaram de registrar que há versões conflitantes, em dois livros argentinos -um dos quais diz que ele teria até obtido da ditadura a libertação dos padres.
Mas a Foreign Policy já pergunta: “O papel de Francisco na ‘guerra suja” voltará para assombrá-lo?”.
******
Nelson de Sá, da Folha de S.Paulo