Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Crítica interna

24/02/2006

A guerra religiosa no Iraque e a decisão do STF em relação a crimes hediondos são os assuntos mais destacados pelos três jornais.

Folha – ‘Conflito religioso mata 130 no Iraque em 1 só dia’ (manchete) e ‘STF abranda pena de crime hediondo’.

‘Estado’ – ‘Supremo, dividido, abranda a lei dos crimes hediondos’ (manchete) e ‘Guerra religiosa deixa 130 mortos e Iraque decreta toque de recolher’.

‘Globo’ – ‘Decisão do STF abranda a Lei de Crimes Hediondos’. A chamada para o Iraque é pequena (‘Iraque já tem 184 mesquitas destruídas’); o segundo assunto do jornal é a guerra nas ruas do Rio, ignorada pela Folha – ‘Tráfico metralha rua do Catete’.

Escândalo do ‘mensalão’

Não há justificativa jornalística para o uso do chapéu ‘Escândalo do ‘mensalão’ na reportagem feita a partir da auditoria do Tribunal de Contas da União sobre os gastos do Planalto com cartões de crédito (‘TCU cobra Presidência por gasto com bebida no cartão’, pág. A4). As irregularidades detectadas no uso dos cartões não têm nenhuma relação, até o momento, com as denúncias de corrupção na montagem da base de apoio do governo federal no Congresso.

O uso abusivo do termo ‘escândalo do ‘mensalão’ é um erro. Primeiro, por que são dois casos distintos. Segundo, por que passa a idéia de que o jornal está forçando a barra. Terceiro, por que tira o foco do escândalo principal, o verdadeiro ‘mensalão’.

Na mesma página e sob o mesmo chapéu está outra notícia que nada tem a ver com o ‘mensalão’, ‘CNBB critica uso eleitoreiro da máquina’. Isso é eleição presidencial.

Eleições 2006

Segundo o ‘Estado’, o prefeito José Serra inaugurou ontem uma escola (tem até foto) e fez um discurso ‘recheado de críticas ao governo Lula, principalmente contra a política econômica’ (‘Prefeito afirma que fábricas podem fechar por causa da política econômica’). O ‘Globo’ também cobriu: ‘Serra: Lula garante ‘lucros fantásticos’ a bancos’. Segundo o jornal do Rio, ‘prefeito tucano faz discurso de candidato e ataca duramente as políticas econômica e social do governo petista’.

O ‘Estado’ acompanhou o governador Geraldo Alckmin na visita que faz a Washington e tem entrevista exclusiva em que fala sobre eleição presidencial, a sua candidatura e sobre o governo Lula. A Folha também não deveria ter acompanhado o governador?

As notícias sobre Serra e Alckmin não deveriam estar no bloco ‘Eleições 2006/Presidência’ da Folha de hoje que inclui textos sobre a movimentação eleitoral do presidente (‘Lula fará propaganda em redutos tucanos’) e do ex-governador do Rio (‘Garotinho busca agora o apoio de líderes do PMDB’)?

As inaugurações e viagens do prefeito de São Paulo e do governador do Estado, ambos disputando a indicação para candidato a presidente pelo PSDB, não deveriam ser cobertas com a mesma regularidade que o jornal cobre as viagens do presidente Lula que estão sendo apontadas como eleitorais?

Ao não fazê-lo, o jornal está usando dois pesos e duas medidas para a cobertura eleitoral.

Defesa do consumidor

Dois colunistas do jornal reservam espaço hoje para reclamações. Luís Nassif reclama do programa Windows Desktop Search (‘Escravo da Microsoft’, pág. B4) e Bárbara Gancia do site de compra de ingressos www.ingresso.com.br (‘Já era’). Devem ter razão e é bom para o jornal que haja espaço para reclamações como estas. Mas não deveriam seguir os mesmos procedimentos de seções de defesa dos leitores, como ‘A cidade é sua’, e publicar junto respostas das empresas questionadas?

Investigação

A Folha publicou ontem o depoimento de um empresário que revelava a remessa ilegal de dinheiro. E aí, o que aconteceu? O empresário foi chamado pela polícia ou pela Receita? Cometeu crime? Houve repercussão? O caso sumiu do jornal.



23/02/2006

O personagem dos três grandes jornais é o presidente Lula, novamente em alta nas pesquisas eleitorais. As capas remetem para a eleição presidencial. Os três trazem a foto de Lula com os braços para o alto aproveitando uma praia do Piauí. Curiosos os títulos que deram para o flagrante: ‘Oração’, segundo o ‘Estado’, o único jornal que acompanhou o banho de mar do presidente às 6 da manhã e presenciou o momento em que ele rezou; segundo o ‘Globo’, ‘Maré mansa’; segundo a Folha (A4), ‘Alma lavada’. O ‘Estado’ tem fotos e entrevista exclusivas feitas com o presidente durante o passeio pela praia.

As manchetes e principais títulos giram em torno do presidente e do seu governo.

Folha – ‘Lula afirma que faz campanha 365 dias por ano’ e ‘Governo adia mudança na telefonia’.

‘Estado’ – ‘Em 3 anos de Lula, bancos já lucram mais que nos 8 de FHC’, ‘Lula:’O PSDB parece o PT dos anos 80’, ‘Governo recua e adia por 1 ano mudança da conta telefônica’.

‘Globo’ – ‘Governo recua e cancela nova tarifa de telefones’, ‘Lucro recorde dos bancos bate indústria’, ‘Enquanto isso, Lula ataca elites…’ e ‘Governo comemora pesquisa’.

‘Erramos’

Não era só a posição da curva que mostrava a intenção espontânea de voto em José Serra que estava errada na edição de ontem, como informa a primeira nota do ‘Erramos’ de hoje. No gráfico de ontem, Lula aparecia com 31%; na correção de hoje está com 30%. Um dos dois gráficos está errado.

Eleições 2006

A Folha agiu corretamente ao dar espaço para o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, responder às provocações feitas pelo presidente Lula no Piauí: ‘Lula diz que faz campanha o tempo todo e provoca Alckmin’ e ‘Alckmin rebate crítica de petista sobre gastos de SP’ (página A4 da Edição Nacional). Deveria ter tido o mesmo procedimento na página A7 e ouvido o governo federal ou o PT em relação às críticas feitas pelo governador à política econômica (‘Alckmin se recusa a falar de prévias’).

A reportagem feita com exclusividade pela equipe do ‘Estado’ com o presidente Lula numa praia do Piauí, ontem, confirma que o velho ditado ‘Deus ajuda quem madruga’ também vale para o jornalismo.

‘Mundo’

O ‘Estado’ é mais preciso do que a Folha no noticiário sobre o enfrentamento entre sunitas e xiitas no Iraque.

Segundo o ‘Estado’, ‘Atentado destrói templo dourado xiita e mais de 90 mesquitas são atacadas’. A Folha se refere vagamente a ‘dezenas de ataques a mesquitas sunitas’ (‘Ataque a mesquita xiita cria clima de guerra’, pág A13).

Também tem problema de precisão o último parágrafo do texto ‘Com escolhas políticas, Bento 16 nomeia seu 1º grupo de cardeais’ (pág. A14). Segundo a notícia, vítimas de abuso sexual por parte de padres da Igreja Católica nos Estados Unidos ‘criticam a maneira como ele [o agora cardeal Levada] lidou com a crise [de casos de abuso sexual] nos EUA’. Como ele lidou? Que críticas são feitas a ele?

O fato de ser um texto traduzido não retira a responsabilidade do jornal com a clareza e a precisão.

Investigação

Bem oportunas a reportagem e a entrevista com o empresário que confessa operações ilegais, ‘Empresário revela esquema de remessa ilegal’ (pág. B12). O texto não tipifica, no entanto, que crimes teriam sido cometidos nem se estão prescritos. Este é um depoimento apenas ilustrativo ou ele pode servir de peça jurídica? O empresário ainda pode ser processado?

Imagino que o caso terá desdobramentos.

Livrarias

São duas, e não quatro, as livrarias americanas citadas como as melhores do mundo por Jeremy Mercer (mapa do infográfico ‘As 10 melhores livrarias do mundo’, na capa de Ilustrada).



20/02/2006

A Folha tem três manchetes fortes nos últimos dias. Elas ajudam a desenhar um retratado do país:

‘Lucro da Petrobras é o maior da história’ (sábado).

‘PF vai indiciar 18 bancos suspeitos de remessa ilegal’ (domingo).

E a de hoje, a mais forte de todas: ‘27% dos jovens não estão na escola nem trabalham’.

‘Painel do Leitor’

Está incompreensível o segundo parágrafo da carta ‘Bancos’, do leitor Carlos Rossini, publicada no ‘Painel do Leitor’ de hoje. A mensagem deveria ser republicada para ficar clara a referência ao artigo de Walter Ceneviva.

‘Painel’

O Morales, do presidente da Bolívia Evo Morales, é com ‘s’ e não com ‘z’, como saiu na nota ‘Reforço externo’, no ‘Painel’ (pág. A4) de hoje.

Pena de morte

O ‘Globo’ entrevistou o brasileiro Marco Archer Moreira, condenado à pena de morte da Indonésia por tráfico de droga. Ele informou que a Suprema Corte do país decidiu reabrir seu caso (‘Agora tenho chance de mudar a pena de morte’).

Carandiru

A Folha fez mais uma boa reportagem na seqüência da decisão do TJ paulista que absolveu o coronel Ubiratan Guimarães depois dele ter sido condenado por um júri popular pelas mortes de 102 presos. Segundo a Folha de sábado, ‘Jurados dizem que júri quis condenação de coronel’. O jornal, que na sexta-feira já havia publicado entrevista com a juíza do Tribunal do Júri que condenara Ubiratan, conseguiu os depoimentos de quatro dos sete jurados de 2001. Bom trabalho.

Há um pequeno problema no texto da capa de ‘Cotidiano’, ‘Júri diz que decidiu, sim, condenar Ubiratan’. No 9º parágrafo está escrito ‘Outro jurado, que também votou pela absolvição, …’, quando o certo é pela condenação.

Se o infográfico ‘Imbróglio jurídico’, publicado na capa de ‘Cotidiano’ de sábado, está correto – e imagino que esteja por que o jornal teve mais tempo para elaborá-lo -, estava errado, e merecia uma correção formal, o infográfico de sexta-feira, ‘Entenda a polêmica jurídica’, publicado na capa do caderno. Na sexta, o jornal entendeu que o problema estava na interpretação das perguntas 5, 6 e 7; no sábado, na interpretação das perguntas 8 e 10.

Charges e Itália

O jornal deu mal no sábado, no domingo e hoje o noticiário sobre as manifestações violentas na Líbia, que resultaram em onze mortes, no incêndio num consulado da Itália e na renúncia do ministro italiano que ajudara a provocar a ira dos manifestantes.

Violência

A reportagem ‘Tráfico expõe jovem decapitado no RJ’ (pág. C4)é pertinente, mas a foto publicada na Edição Nacional é completamente dispensável, um desrespeito à imagem do morto (até agora não identificado e, portanto, sem que se saiba o verdadeiro motivo do seu assassinato) e uma agressão ao leitor.

‘Esporte’

Acho que o texto do noticiário esportivo comporta um pouco mais de linguagem informal que outros setores do jornalismo. Mas não precisa ser um amontoado de clichês, como a abertura do caderno de hoje (‘Paulista troca pasmaceira por legião de candidatos’) – ‘caminhava a passos largos’, ‘firmes na briga pelo título’, ‘os alvinegros despacharam o Mogi Mirim’, ‘suou um pouco mais para vencer’, ‘time do litoral’, ‘clube do Parque Antarctica’, ‘balançou as redes’.

Rolling Stones

A Folha fez uma cobertura correta do show dos Stones. A edição de domingo que chegou ao Rio já trazia foto da banda no palco e o cálculo de público feito pelos Bombeiros – ‘Stones reúnem 1,3 mi em Copacabana’.

A ênfase que o jornal deu para o cálculo de público presente – ‘Show histórico dos Stones reúne 1,3 mi’ é a manchete da página A16 – exigia informações mais precisas sobre a multidão. Como foi feito o cálculo? É possível que naquele pedaço de Copacabana caibam tantas pessoas?

O jornal, que em outras épocas tinha a preocupação de convocar o Datafolha para medir grandes aglomerações e evitar os chutes da PM ou dos Bombeiros e perpetuação de exageros, poderia pelo menos ter informado até onde se estendia a multidão e a extensão da faixa da calçada dos prédios até o mar. Não tinha a obrigação de acertar o número, mas deveria ter passado para o leitor indicadores mais precisos da área ocupada pela multidão.

Bom e bem divertido o trabalho de reportagem da coluna ‘Mônica Bergamo’, ‘Os vips, os supervips e os hipervips’.

Aviso

Participarei, nos próximos dois dias, em São Paulo, de reunião dos jurados do Prêmio Folha (terça) e de reuniões preparatórias da Conferência Anual da Organization of News Ombudsmen (ONO, a organização mundial de ombudsmans de mídia), que será realizada em São Paulo entre 7 e 10 de maio pela Folha. Por esta razão não haverá Crítica Interna amanhã e quarta-feira.’