As políticas de livro e leitura do país deixarão de ser atribuição da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) e voltarão à estrutura do Ministério da Cultura, em Brasília.
A decisão da ministra Marta Suplicy foi consolidada na segunda-feira (8/4), quando José Castilho Marques Neto, presidente da Editora Unesp, aceitou o convite para voltar ao cargo de secretário-executivo do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), com mais responsabilidades do que tinha de 2006 a 2011.
A transferência de todas as políticas de livro e leitura do país para a FBN, oficializada em junho de 2012, na gestão de Ana de Hollanda como ministra da Cultura, originou as principais críticas a Galeno Amorim em seu período como presidente da biblioteca, de 2011 até o mês passado.
Na avaliação de especialistas, o acúmulo de funções sobrecarregou a Biblioteca Nacional num momento crítico da instituição, responsável pela preservação da memória nacional –em maio, a bicentenária biblioteca deve completar um ano sem ar condicionado, uma ameaça ao maior acervo do país.
No último dia 27, Marta demitiu Galeno Amorim, substituindo-o pelo cientista político Renato Lessa. Não comentou o que faria com as políticas de livro e leitura, mas poucos dias depois convidou Castilho para assumi-las.
Com a decisão, Marta retoma um posicionamento de Juca Ferreira como ministro da Cultura, até 2010. Na ocasião, o MinC buscava centralizar em Brasília as políticas da área, historicamente divididas entre a capital e o Rio.
Instituto do Livro
Esse poderá ser o primeiro passo para a criação de um novo Instituto Nacional do Livro (INL), órgão instituído em 1937 tendo Monteiro Lobato como defensor e esvaziado em 1990, no governo Collor, que o transformou em um departamento da FBN.
Desde então, essas ações eram divididas entre o MinC, em Brasília, e a FBN, no Rio, com mais ou menos atribuições para cada lado conforme as mudanças de governo.
Esses trabalhos incluem formação de bibliotecários, modernização de bibliotecas, estímulo à cadeia produtiva do livro, circulação de autores pelo país e divulgação da nossa literatura no exterior.
Quando Galeno Amorim assumiu a FBN a convite de Ana de Hollanda, em 2011, ficou claro que assumiria todas essas atribuições.
“A ida para a FBN nunca foi um projeto definitivo, mas o possível naquele momento. O Instituto Nacional do Livro seria o ideal. Meu pai [o historiador Sérgio Buarque de Holanda] inclusive trabalhou lá nos anos 1940”, disse Ana de Hollanda à Folha.
José Castilho Marques Neto sempre foi um dos maiores críticos da migração para o Rio. Quando percebeu que isso ocorreria, pediu demissão, em abril de 2011.
Mesmo especialistas que trabalharam com Galeno e que o defendem, como Lucília Garcez, secretária-executiva do PNLL durante 2012, acreditam que a biblioteca não é a instância mais adequada para essas políticas.
“A estrutura não é suficiente. É necessário um apoio direto do ministério, mais ágil e bem equipado.”
Uma exceção é Maria Antonieta Cunha, que, em apoio a Galeno Amorim, pediu dias atrás demissão da Diretoria de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (DLLLB) –sem saber que Marta já tinha decidido levar a unidade de volta para Brasília.
“A passagem pelo Rio antes da criação do instituto não afetou as ações de estímulo à leitura, ao contrário do que tantos dizem.”
Sem casa própria
A mudança, no entanto, prejudicou os trabalhos. A DLLLB nunca teve sua prometida sede no Edifício Capanema, no centro do Rio. Ficou espalhada por unidades. O andar prometido para os cerca de 80 funcionários, entre servidores e terceirizados, seria entregue neste mês.
Com a mudança proposta por Marta, unidades historicamente ligadas à FBN, como o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas e o Proler, também irão para Brasília.
Renato Lessa comandará, em nome da Biblioteca Nacional, a participação do Brasil como país convidado da Feira de Frankfurt, o maior evento editorial do mundo, em outubro. Mas a internacionalização da literatura futuramente deve ficar sob responsabilidade de José Castilho.
O novo secretário executivo tem a prioridade de transformar o Plano Nacional do Livro e da Leitura em lei –ele está instituído por decreto.
E promete retomar tema polêmico entre editores: o Fundo Setorial Pró-Leitura, que receberia 1% da receita de editores, distribuidores e livreiros para financiar programas de incentivo à leitura. Isso equivaleria a R$ 50 milhões por ano.
O assunto está em aberto desde 2004, quando a cadeia do livro foi desonerado de impostos que chegavam a 9% de sua arrecadação.
******
Raquel Cozer, da Folha de S.Paulo