No dia 18/3/2013, no site Viomundo, a articulista Conceição Lemes entrevistou o dr. Mario Lobato – médico pediatra e auditor do Ministério da Saúde [governo federal] do grupo que investiga denúncias envolvendo profissionais de medicina no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. Nessa entrevista, Conceição pergunta, à queima-roupa: “A UTI do Evangélico se tornou ‘um campo de concentração’, onde pessoas foram exterminadas friamente, sem chance de reação?” Dr. Lobato responde: “Essa imagem de ‘campo de concentração’ que você usou, coincidentemente também apareceu em comentário de um dos peritos da área de terapia intensiva que participaram das investigações. E olha que ele coordena uma UTI. Consequentemente, em princípio, deveria estar familiarizado com esse tipo de situação. Ele ficou chocado com o que achou; comparou a campo de concentração, de extermínio, na época do nazismo da Alemanha”.
Trata-se de falta de decoro um alto funcionário do Ministério da Saúde do Brasil fazer tal declaração à imprensa, atribuindo a mesma a “um dos peritos da área de terapia intensiva que participaram das investigações?” Qual é o nome do tal perito? Em que evidências, bases científicas e estatísticas o tal declarante firma sua tese em tal disparate? Apenas essa declaração já coloca sob grave suspeição toda a investigação do caso, com suas conclusões. Para algum leitor desinformado, eis um trecho publicado na Enciclopédia do Holocausto sobre campos de concentração nazistas, durante a segunda guerra mundial:
“Os nazistas construíram câmaras de gás para tornar o processo de assassinato em massa mais eficiente, rápido e menos pessoal para os executores. Câmaras de gás eram aposentos fechados que recebiam gás letal em seu interior para matar por asfixia a quem estivesse dentro. Havia quatro câmaras de gás no campo de extermínio de Birkenau, localizado no complexo de Auschwitz. No auge das deportações para o campo, mais de 6.000 judeus eram diariamente envenenados por gás naquele campo.”
Manchetes negam jornalismo preconceituoso
Mesmo que seja comprovado haver alguma vítima de crime intencional numa das UTIs do Hospital Evangélico de Curitiba – o que duvido muito – a expressão é insidiosa, malévola e escrita em negrito na tal entrevista – com repetecos em outros sites da internet – com objetivo pernicioso de difamar uma das mais caras instituições de saúde do Paraná, que atende a cerca de um milhão de pessoas ao ano – mais de 90% do SUS.
Se alguém visitar a Biblioteca Pública do Paraná e vir os recortes do noticiário de jornais de tradição do estado do Paraná sobre o HUEC, como eu fiz (xeroquei e fotografei tudo), verá que mais de 99% dos recortes descrevem conquistas em diversas áreas do conhecimento médico, inovações técnicas, doações milionárias em equipamentos por parte de instituições evangélicas de outros países, pioneirismo em transplantes, ampliações, voluntariado, referência nacional no tratamento de queimados, sucesso no tratamento de crianças ucranianas vítimas de Chernobyl, pioneirismo em pesquisas em genética, banco de leite humano etc. Em 1999, por exemplo, o HUEC ganhou o título de “Hospital Amigo da Criança” da Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância em função de “programas na área de aleitamento e redução das mortalidades materna e infantil” – conforme a Gazeta do Povo, um dos jornais mais conceituados do Paraná.
Eis algumas manchetes, só para oxigenar a mente de milhões de brasileiros que estão sendo alvo do gás exalado nesse tipo de jornalismo ativista, parcial e preconceituoso: “Evangélico especializa o atendimento a colo e reto” (Gazeta 7/8/94); “Evangélico inaugura UTI para atender bebês recém-nascidos” (Gazeta, 1/10/1994); “HE se destaca no combate à infecção” (Indústria e Comercio, 24/5/1983); “Evangélico pode fechar por culpa do Inamps” (Estado do Paraná, 4/4/82) e “Rim portátil, Paraná é pioneiro” – sobre o Serviço de Nefrologia do HUEC (Gazeta, 27/4/1982); “Duas décadas de correção facial pelo SUS” (Gazeta, 23/4/2008); “Computador monitora pacientes em UTI” (Gazeta, 28/1/97); “HUEC: 3º Banco de Pele, no País” (Estado do Paraná, 8/10/08); “Tomógrafo faz imagem de alta definição” (Gazeta, 18/9/94); “Hospital Evangélico adquire equipamento que extrai cálculos renais sem cirurgia” (Paraná Norte, 23/10/1986); “Hospital Evangélico atende 309 mil em 95” (Gazeta, 9/9/95); “Avanços contra amputação de membros” (Gazeta, 14/9/96); “Sistema de Análise Microscópica de Busca Automática foi desenvolvido por equipe do Hospital Evangélico de Curitiba” (Folha de Londrina, 2/4/97); “A Estrela que virou Saúde para a cidade”, por ocasião dos 50 anos do Hospital (Gazeta do Povo, 5/9/99).
“Não podemos calar”
Essas são apenas algumas das reportagens que atestam a tradição de qualidade, responsabilidade e busca de excelência de médicos e enfermeiros do HUEC e sua mantenedora. Outro fato midiático que me chama a atenção, em diversas reportagens em TVs, Rádios e blogs da internet, é a afirmativa de “denúncias sobre ocorridos na UTI do Hospital Evangélico de Curitiba”. Um bom jornalista deve saber sobre o assunto que está informando: o HUEC de Curitiba tem quatro UTIs, e não apenas uma UTI! Nunca dizem ou escrevem que o Hospital é Universitário e que a Faculdade Evangélica de Medicina é fruto da mesma SEB – Sociedade Evangélica Beneficente, e uma das mais concorridas do estado.
A direção do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba divulgou (10/4) nota esclarecendo as últimas notícias envolvendo a instituição. “O Hospital Universitário Evangélico de Curitiba manifesta sua preocupação com a forma como estão sendo apresentados ao público os números relacionados a óbitos ocorridos em uma das unidades de terapia intensiva desta instituição.” Salienta que “é preciso distinguir os casos específicos desta investigação dos procedimentos adotados pelo Hospital, que conta com cerca de 400 médicos. As práticas nas UTIs do Hospital Universitário Evangélico seguem rigorosamente os protocolos médicos. Vale destacar que a instituição possui quatro UTIs distintas, sendo elas UTI I, UTI II, UTI Coronariana e UTI Neonatal, e que atenderam em 2012 um total de 18481 pacientes”. A direção do HUEC/SEB – Sociedade Evangélica Beneficente, a mantenedora, lembra que “foram abertas três sindicâncias para averiguar os fatos – uma sindicância do próprio Hospital, formada por uma equipe multidisciplinar qualificada, outra sindicância da Secretaria Municipal de Saúde e outra do Conselho Regional de Medicina (CRM)”.
O site G1 Paraná – da RPC TV – publicou, no dia 5/4, nota oficial da direção do Hospital e sua mantenedora: “Os diretores dizem ainda no texto que consideram uma injustiça a repercussão que houve em torno do caso. ‘Não podemos calar diante de injustiças de forma alguma, principalmente quando o inocente está sendo considerado culpado. Assim se sente a Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba (SEB), pois é necessária a autodefesa, como é necessário também que outros mais entrem em defesa desta instituição que mantém o Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, para que não continue sofrendo consequências que a mesma não merece’.”
Afirmativas absurdas
O site publicou a íntegra do documento:
“Levando em consideração as questões clínicas que estão sendo veiculadas pela imprensa, o Hospital Universitário Evangélico de Curitiba consultou a coordenação dos médicos intensivistas, que seguindo protocolos internacionais esclareceu algumas questões pontuais sobre os métodos de Terapia Intensiva. Quanto à dúvida dos medicamentos utilizados neste ambiente, esclarece que, a utilização de medicamentos hipnóticos (que fazem dormir), opióides (que retiram a dor ou sofrimento) e os agentes curarizantes (relaxantes musculares) são drogas comuns no arsenal de uma Unidade de Terapia Intensiva e são utilizados para adequação do paciente no respirador, realização de procedimentos cirúrgicos e principalmente poupar sofrimentos desnecessários. O tratamento seja ele medicamentoso ou por aparelhos é decisão médica. Decisões de não tratamento, de omissão ou de suspensão de suporte vital, não devem ser considerados atos de eutanásia, mas de exercício médico regular. Aliviar a dor e o sofrimento é considerado um dever médico, mesmo quando as intervenções implicam que a vida possa ser abreviada como consequência. Em outras palavras, as terapias de conforto e alívio de dor são tão ou mais importantes, que as terapias que promovem a cura, principalmente nos pacientes em que o processo de morrer é inexorável (…). Com relação ao medicamento adrenalina esclarece que, é a principal droga utilizada pelos protocolos internacionais de reanimação. Este medicamento é utilizado quando o coração já parou, e serve, juntamente com a massagem cardíaca, a oxigenação, para recuperar os batimentos cardíacos. Uma reanimação pode durar até 45 minutos, e a cada 5 minutos se repete entre uma e cinco ampolas de adrenalina dependendo do caso. Logo, em uma reanimação de 45 min., se utilizada uma ampola a cada 5 minutos, durante os 45 minutos, haveria a aplicação de dez ampolas. Para facilitar a prescrição coloca-se o número total de drogas utilizadas, isto não significa que elas foram utilizadas de uma só vez. A morte encefálica é diagnosticada clinicamente por exames neurológicos e exames complementares como: eletroencefalograma, Doppler transcraniano ou arteriografia cerebral. Segundo os médicos intensivistas, neste momento o paciente, se a morte cerebral for constatada, é considerado legalmente morto, e as medidas artificiais deverão ser mantidas, somente se o mesmo estiver em protocolo de doação de órgãos, e autorizado pelos familiares. Portanto, drogas e suporte excessivo para manter a vida, deverão ser evitados quando a doação de órgãos não for mantida, para não prolongar o sofrimento e angústia dos familiares. Diante destes fatos, a Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba está à disposição para demais esclarecimentos e aguarda a conclusão das sindicâncias para que sejam adotadas as medidas cabíveis, bem como confia na Justiça para averiguar as denúncias, e que não se baseia em opinião pessoal de membro de qualquer uma das sindicâncias. Direção SEB/HUEC.”
Um dos diretores da Fenam – Federação Nacional dos Médicos, o paranaense Mario Antonio Ferrari, questionou a investigação que acusa a médica Virginia Helena Soares de Souza por “homicídio duplamente qualificado” de sete pacientes: “O MPE (Ministério Público Estadual) merece todo o nosso crédito. Mas pode ter acontecido do trabalho que antecedeu as intervenções ter ‘apoio em pés de barro’ em aspectos técnicos. São questões que demandam uma perícia superespecializada em UTIs, em bioética. Uma auditoria apenas analítica, documental, pode gerar interpretações não fidedignas. É preciso tomar muito cuidado”, afirmou ao site da UOL, em 9/4.
Que a verdade prevaleça e que nenhuma conspiração contra o Hospital Evangélico de Curitba – a maior instituição particular de saúde do sul do Brasil e sua equipe de cerca de 400 médicos e centenas de enfermeiros. Lembra o diretor da SEB, João Jaime Nunes Ferreira: “As práticas nas UTIs do Hospital Universitário Evangélico seguem rigorosamente os protocolos médicos. Vale destacar que a instituição possui quatro UTIs distintas, sendo elas UTI I, UTI II, UTI Coronariana e UTI Neonatal, e que atenderam em 2012 um total de 18.481 pacientes. São mais de um milhão de atendimentos, anualmente.”
Não pretendo fazer proselitismo do HUEC, não sou pago para escrever artigos para entidades ou qualquer parte interessada, porém ao observar a prática jornalística de determinados setores da mídia e o envolvimento de pessoas diretamente ligadas à equipe de investigação, que envolve o MS, a polícia e o MP – Ministério Público, manifestando-se publicamente com afirmativas absurdas, comparando o HUEC a um campo de extermínio de pacientes, minha consciência se agita contra a injustiça.
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José J. Azevedo é jornalista