Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Anos de Chumbo, chumbados

Quatro décadas nos séculos 20-21, em plena Era da Informação, são suficientes para oferecer uma perspectiva crítica sobre qualquer evento. Sobretudo quando se trata de um episódio marcante – talvez o mais marcante da história da República –, estendido ao longo de 21 anos e objeto de uma vasta bibliografia.

Os 40 anos do golpe militar de 1964, que começam a ser lembrados nestes dias, deveriam constituir para a mídia brasileira uma oportunidade para avaliações e reavaliações mais consistentes. O leitor de 40 anos com um conhecimento superficial sobre os ‘Anos de Chumbo’, e sobre os quais tanto ouve falar, deveria encontrar agora na mídia as referências básicas para situar-se num processo que ainda não terminou.

A Folha de S.Paulo começou no sábado (13/3) a refazer a contagem regressiva que culminou com a derrubada do presidente João Goulart, em 31 de março de 1964. E a matéria sobre o primeiro evento, o famoso comício da Central do Brasil, no Rio (em 13 de março), está longe de ser auspiciosa. Fato novo, apenas a informação a respeito de uma filme com a íntegra do discurso do então presidente da UNE, José Serra.

O resto, banal e errado. Para começar: Maria Tereza Goulart não tinha cabelos negros, eram castanhos, compondo com a pele morena e os olhos verdes a figura da mais bela primeira-dama da historia do Brasil. Petite histoire, pequena história.

Grave é a informação de que o Plano Trienal (de autoria de Celso Furtado) foi considerado na época como ‘esquerdista’ e constituído de uma série de ‘reformas de base’.

Ao contrário, o projeto de Furtado, então superintendente da Sudene (antes, ministro do Planejamento) previa um processo de desenvolvimento sustentado e confrontava as reformas ditas ‘revolucionárias’, na marra, proclamadas por Leonel Brizola e muito ao gosto do chefe da Casa Civil, Darcy Ribeiro.

Este conflito entre os ‘radicais’ e os moderados-competentes (representados por Celso Furtado) é essencial para entender as crises internas que emperraram ainda mais o indeciso Jango e levaram muitos liberais a seduzir-se pela ilusão do ‘golpe cirúrgico’.

O jornalista que pretende resgatar ou reavivar a história recente não precisa ser necessariamente uma testemunha ocular, mas facilitaria muito que tivesse ao lado alguém mais maduro. Para evitar o que em Portugal se designa por ‘ser chumbado’ – reprovado.