Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Com boa estrutura, TVs católicas lutam por maior audiência

Durante sete anos, o padre César Moreira foi comentarista do TJ Aparecida, telejornal exibido de segunda a sexta-feira, às 19h. Mesmo com tanta exposição, ele levou um susto recentemente, ao ser reconhecido enquanto andava pela avenida Angélica, região central de São Paulo.

“Somos nanicos”, diz Moreira, que por 25 anos dirigiu a rádio Aparecida e, desde 2005, a TV Aparecida, uma das quatro redes de televisão católicas que disputam a atenção do espectador entre si e com emissoras seculares.

Depois de décadas priorizando o rádio, os católicos se voltaram à TV principalmente a partir dos anos 1990, época em que as igrejas pentecostais se tornaram mais visíveis por meio de uma presença agressiva na telinha.

Passados 18 anos desde que a Rede Vida entrou no ar como a primeira emissora católica de abrangência nacional, as emissoras já contam com boa infraestrutura e empregam centenas de profissionais, mas lutam para ampliar uma audiência estagnada em baixos índices.

A insatisfação com os resultados tem levado a igreja a discutir outra estratégia para a TV e também para outros meios, incluindo as redes sociais. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) deve aprovar neste ano um Diretório da Comunicação com parâmetros para o setor em discussão já há três anos. Hoje, só a igreja na Itália tem documento semelhante.

“Não somos profissionais na arte de comunicar”, afirma dom Dimas Barbosa, responsável pela comunicação social da CNBB. “Em todos os níveis: começa já no som da igreja. Criar a cultura da comunicação talvez seja o nosso maior desafio.”

“Questão de conteúdo”

Os principais canais de televisão católicos se preparam para oficializar em julho, durante a Jornada Mundial da Juventude, a Rede Católica de TV, a fim de aumentar a colaboração entre si.

Para a especialista em comunicação e religião Magali Cunha, da Universidade Metodista, o maior problema das TVs católicas é sua incapacidade de criar uma programação atraente.

“Há uma transposição para a TV da linguagem da igreja. Já as pentecostais nasceram midiáticas”, compara.

Ela diz que o canal mais bem-sucedido é a Canção Nova. Ligado à Renovação Carismática, adota linguagem parecida à dos evangélicos.

Ela lembra que os “padres cantores”, também carismáticos, atraem mais audiência.

Um deles, Reginaldo Manzotti, acaba de adotar uma estratégia comum entre pastores evangélicos: com ajuda de patrocinadores, passou, há quatro semanas, a transmitir seu programa “Evangeliza Show” aos domingos, na Rede TV!, ao meio-dia.

“A ideia é tentar atingir um público que ainda não fez experiência com Deus, um público diversificado. Eu uso o termo pescar em águas mais profundas'. Ir adiante. Acho perigoso a gente pescar no aquário, falar pro mesmo público, pra quem já tem feito a experiência de Deus”, afirmou Manzotti, por telefone.

O padre, que mantém a TV Evangelizar, em Curitiba, e ganhou três discos de ouro, ressalva que é “muito positivo dar sustentação à fé” via meios católicos, mas se trata de um “público restrito”.

Por outro lado, ele discorda de que os programas evangélicos sirvam de exemplo.

“A linguagem não é tanto o modo de falar, é questão de conteúdo. Eu poderia muito bem cair numa teologia da prosperidade, mas a Igreja Católica não pode ir nesse caminho em que, se você der um Fusca pra Deus, ele vai restituir com uma Mercedes.”

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TV Século 21 tem ex-jogador e diretor global

Em 1980, o padre jesuíta americano Eduardo Douherty começou a gravar catequeses na garagem de uma paróquia de Campinas.

Era o embrião da Século 21, rede de TV que hoje ocupa um complexo de 24 mil metros quadrados, emprega 240 funcionários e acaba de investir R$ 4 milhões para digitalizar a produção.

Ligado à Renovação Carismática, Douherty, 72, é ainda o idealizador do “Anunciamos Jesus”, programa de retransmissão da palavra bíblica e estudos de documentos da igreja que completará 30 anos no ar em junho –um recorde entre os católicos.

Pouco conhecida fora do circuito católico, a infraestrutura e a movimentação da Século 21 impressionam.

Na segunda-feira, quando a Folha visitou o complexo em Valinhos (85 km de São Paulo), um estúdio transmitia ao vivo um programa diário de futebol, que tem os ex-jogadores Careca e Zenon como comentaristas fixos.

Ao lado, um grupo de 18 atores gravava uma cena bíblica dirigida por Lucas Bueno, 57, que já trabalhou em novelas globais, como “Sassaricando”.

A teledramaturgia tem sido o grande diferencial da Século 21, que ganhou a concessão em 1999 e é financiada, segundo Douherty, por meio de doações.

O próximo projeto da emissora é ambicioso: gravar os quatro Evangelhos, “palavra por palavra”.

Recentemente, o americano propôs um banco coletivo de programas de TV católicos, que poderiam ser aproveitados por outras emissoras. Mas a ideia é vista com ressalvas por outros meios católicos, um reflexo das divisões internas da igreja.

A TV Aparecida, por exemplo, não transmitiria um programa de viés carismático –está sob o comando da Congregação Redentorista.

O sacerdote americano, que chegou ao Brasil em 1970, diz que está satisfeito com o nível técnico, mas acredita que a audiência ainda “pode aumentar violentamente”.

Douherty reconhece que os programas de TV pentecostais “conseguem mais pontos [no Ibope] que nós”.

Por que essa diferença? “Eu também quero saber. Me ensina”, brincou.

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Fabiano Maisonnave, da Folha de S.Paulo