É cada vez mais notável a diluição das fronteiras entre informação jornalística e entretenimento. Desde que as empresas de comunicação tornaram-se complexos conglomerados (de mídia, de produtos eletrônicos etc.) e as tecnologias digitais foram sendo apropriadas pela coletividade, ou melhor, desde que a comunicação mediatizada passou a fazer parte de nossas vidas, as mídias tornaram-se palco central das ações humanas. Neste contexto, o jornalismo de outrora, que tinha sua razão de ser voltada para o bem comum, para o interesse público e principalmente para a proteção da cidadania, vê-se cada vez mais contaminado pela cascata, pela retórica, pelas fofocas sobre celebridades e pseudocelebridades, enfim, pelo entretenimento. Não que o entretenimento seja algo ruim, não é essa a discussão apresentada aqui, a grande questão está no problema de se misturar informação jornalística com entretenimento, já que cada um cumpre funções diferentes.
Crimes, sexo, ciúmes, mortes, violência, celebridades, entre outros, são assuntos centrais noticiados pelas mídias cotidianamente; são a verdadeira quintessência dos meios de comunicação. Sem dúvida, podemos constatar três grandes características que formam o tripé das narrativas midiáticas contemporâneas: entretenimento, sensações e espetáculo. O espetáculo está intimamente ligado às sensações midiáticas que têm o objetivo de sensibilizar, através de histórias e narrativas, o maior número possível de pessoas. Essas histórias que emocionam devem ser estruturadas de modo que estimulem os sentidos e transformem suas experiências subjetivas e perceptivas. Essa eficácia simbólica não tem precedentes. A catarse causada por tais histórias pode ser um dos motivos de seu enorme sucesso.
Informação contaminada
O infotenimento é hoje a grande sacada empresarial dos meios de comunicação para alavancar suas vendas e não perder seu público. Mas até que ponto misturar informação e entretenimento pode prejudicar a real função do jornalismo? Que hoje a informação jornalística é considerada uma mercadoria, não há dúvida, mas como é possível, em meio a esse turbilhão de informações, separar o joio do trigo, ou seja, aquilo que realmente é informação daquilo que é apenas distração, fruição?
De fato, seria muito ousado tentar responder a essas perguntas, somente através de um artigo. Não pretendo aqui, demonstrar algum ideal iluminista, de que seria possível separar a imprensa “séria”, ética da imprensa “alienante”, degradante ou sensacionalista – este não é o caso. O fato é que toda uma cultura midiática se transformou, desde o advento da revolução digital (ou até mesmo antes um pouco). Em primeiro lugar, não resta dúvida de que a informação transformou-se em mercadoria, como já mencionado. Em segundo, ela tornou-se mais veloz, mais instantânea, mais fluida, até mesmo os textos encurtaram! E em terceiro, misturou-se com a publicidade – apesar de grande parte ser gratuita, a informação necessita da publicidade para sobreviver, e vice-versa.
Em um artigo publicado no livro Por uma outra comunicação, organizado pelo professor Dênis de Morares, Ignacio Ramonet constata tal situação defendendo a possibilidade de se criar uma “ecologia da informação”. Colocando sua citação em lupa, temos que:
“É preciso defender a ideia de que, assim como o meio ambiente está contaminado pelo uso de metais pesados e porque existe uma espécie de hiperindustrialização que produziu o desastre ambiental que conhecemos neste ou naquele aspecto, assim a informação está contaminada. A informação está contaminada essencialmente por uma série de mentiras que podem ser factualmente demonstradas. É preciso descontaminá-la dessas mentiras, é preciso descontaminá-la de uma certa ideologia: podem-se defender ideias, todas as ideias podem ser defendidas; anunciadas, porém como ideias, e não como coisa natural. Mas é preciso igualmente descontaminar de publicidade, do ponto de vista ideológico, o meio que nos cerca. E isso é obvio” (Vide RAMONET, Ignacio. “O poder midiático”. In: MORAES, Dênis (org.). Por uma outra comunicação. 5ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2010).
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Paula Roberta Santana Rocha é jornalista e mestranda em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás (UFG)