Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Telejornais apresentam o mais do mesmo

Os telespectadores brasileiros têm presenciado várias mudanças nos principais telejornais das emissoras de TV abertas comerciais nos últimos meses. O Jornal da Band trouxe Joelmir Beting e Carlos Nascimento – este, recentemente transferido para o SBT; o SBT Brasil trouxe Ana Paula Padrão, que deixou seu lugar no Jornal da Globo para William Waack e Cristiane Pelajo; o Jornal da Record inaugurou nova fase com Celso Freitas e Adriana Araújo no lugar de Boris Casoy e Marcelo Rezende, foi para o Jornal da Rede TV!.

E há algo em comum nessas mudanças: todos os ‘âncoras’ envolvidos (e muitos dos jornalistas que aparecem ou não na tela) são ex-funcionários da Globo. É a primeira vez na história das TVs abertas comerciais brasileiras que os telejornais que disputam audiência com a Globo são liderados por ex-jornalistas da própria Globo.

O que teria provocado essas mudanças? Estaríamos inaugurando um novo tempo no jornalismo de TV, o mais importante do país? Será que agora os telespectadores terão – como sempre deveriam ter – pluralidade de fontes e diversidade de opiniões no telejornalismo que constitui a principal fonte de informação da maioria dos brasileiros?

O telejornalismo de TV – como de resto, o jornalismo em geral – está em crise. Há um crescente desinteresse do público pelos telejornais.

Durante anos o Jornal Nacional teve o maior Ibope da Rede Globo. Nos seus intervalos comerciais estavam os trinta segundos mais caros da televisão brasileira. O preço na tabela de publicidade continua alto, mas o índice de audiência do JN já não é mais o primeiro da emissora, embora continue solidamente o maior entre os telejornais brasileiros, com média em torno de 35 pontos.

A contratação de Ana Paula Padrão não rendeu o esperado no SBT Brasil; e o novo Jornal da Record estreou no dia 30 de janeiro com média de 13 pontos no horário mas, em seguida, parece ter se estabilizado pouco acima dos 5 pontos.

Profusão de clones

Quais seriam os motivos para esse desinteresse público pelos telejornais?

O descompromisso com a informação séria é certamente um deles. A primeira reação do JN à recente ameaça à sua audiência representada pela combinação da novela Prova de Amor e o novo Jornal da Record foi eliminar os intervalos comerciais na sua primeira meia hora e transformar o telejornal em uma ‘revista’ que prioriza o fait divers e o noticiário policial em detrimento inclusive da cobertura política.

Em sua coluna de O Globo de quinta-feira (9/3), o jornalista Jorge Bastos Moreno faz comentários que certamente se aplicam ao telejornalismo. Diz ele:

‘Será que nessa sucessão de escândalos, com dossiês, fitas e denúncias caindo nas nossas mãos, [não se estaria] perdendo um pouco da coisa mais valiosa da profissão, que é a capacidade de investigar, correr atrás das pistas? Essa avalanche de informações delivery’ que vem desde o caso PC Faria, mesmo com os enormes serviços prestados ao país, [estaria] me transformando num repórter de notícia pronta? E onde está o romantismo da profissão de seguir uma pista, investigar, apurar, ainda que demore e no final comemorar o resultado desse esforço?’

A mesmice certamente é outro motivo importante. O ‘novo’ Jornal da Record é uma tentativa óbvia de ‘clonar’ o Jornal Nacional. A impressão que se tem é que todos os telejornais seguem a mesma pauta. Eles exibem as mesmas matérias, dentro de padrões muito semelhantes de cobertura. Se você vê um é como se já tivesse visto todos.

Seriam as atuais mudanças apenas aparentes? Estariam os jornalistas, ex-funcionários da Globo, tentando reproduzir vários ‘clones’ do JN fora da Globo?

Sem diversidade

Respondendo a uma pergunta feita por uma participante do Bate-Papo UOL sobre o que seria possível fazer de novo no telejornalismo brasileiro, o também ex-Globo Carlos Nascimento, que estreava no mesmo dia no Jornal do SBT – Edição Noite, afirmou:

‘Precisa mudar a linguagem, descobrir um jeito novo de construir o texto, de ditar as matérias, o foco dos assuntos, o ritmo. Tudo o que fazemos me parece meio velho. É assim desde os anos setenta, com algumas mudanças. Temos que nos reinventar’.

O desafio do jornalismo público responsável está colocado também para o desprestigiado sistema estatal de televisão brasileiro, que não tem como competir com o sistema privado, mas que tem mostrado sua diferença nesses tempos de crise. Vide as coberturas jornalísticas da Radiobrás, das TV Câmara e Senado, da TVE Rede Brasil (Rio) e da TV Cultura (São Paulo).

Em ano eleitoral, paralelo a uma crise política que se arrasta – embora com menor intensidade – desde maio de 2005, o jornalismo da TV aberta comercial está perdendo a oportunidade de desempenhar o seu papel que é informar com seriedade a imensa maioria da população brasileira.

Na verdade, apesar das aparentes mudanças, não há indicações de que estejamos inaugurando um novo tempo no jornalismo da TV aberta comercial. Os telespectadores continuam sem pluralidade de fontes e sem diversidade de opiniões. O novo é apenas o mesmo de sempre. Já nasce velho.

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Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de Mídia: Teoria e Política (Editora Fundação Perseu Abramo, 2ª ed., 2004)