Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Um ano de crise
>>Os senhores da moral

Um ano de crise


A imprensa internacional começa a fazer o balanço dos doze meses da eclosão da crise financeira global, que, segundo se convenciona, se tornou explícita no dia 15 de setembro de 2008.


Os jornais brasileiros ainda não haviam produzido, até esta sexta-feira, algum trabalho de fôlego sobre o período, e certamente não perderiam a oportunidade em suas edições de fim de semana.


Ao contrário, o que se lê  por toda parte, desde os sites de análises econômicas até as edições de papel dos jornais de circulação nacional, é o entusiasmo com o desempenho do Índice Ibovespa, o mais importante indicador da Bolsa de Valores do Brasil, que apresentou ganhos de quase 100% em relação ao pior momento da crise, ocorrido em outubro do ano passado.


Praticamente nenhuma referência digna de nota ao fato de que a recuperação das economias nacionais, principalmente a brasileira, se deve em grande parte à tutela do Estado, que produziu políticas de estímulo e tomou a iniciativa de investimentos estratégicos que aquecem os negócios em muitos setores.


A imprensa dá repercussão aos prognósticos otimistas, anunciando que o Brasil poderá emergir do cenário da crise internacional ocupando a quinta colocação entre as maiores economias do mundo.


No entanto, pouco se lê  sobre a qualidade desse desenvolvimento.


Para a imprensa nacional, sustentabilidade ainda é um palavrão.


Nesta sexta-feira, os jornais destacam a informação, já antecipada no domingo anterior pelo Globo, de que o cerrado brasileiro está sofrendo uma devastação em ritmo duas vezes maior do que o da destruição da floresta amazônica.


A principal causa da perda desses biomas, que dominam a região central do Brasil, é o avanço descontrolado do agronegócio, que conta com uma forte bancada no Congresso, muito influente nos dois lados do espectro político em que se divide Brasília.


A imprensa brasileira presta ultimamente muita atenção aos problemas ambientais, mas ainda isola o tema meio ambiente da questão econômica.


Ao destacar o noticiário positivo dos números brutos da economia sem alertar para o desafio do desenvolvimento sustentável, a imprensa brasileira deixa seu público alienado em relação ao debate essencial que se trava hoje no mundo.


Enquanto isso, o governo da França anuncia a criação de um imposto para combater as emissões de carbono no país.


Em dezembro deve ocorrer a conferência da ONU sobre mudanças climáticas, em Copenhague, quando se espera a formalização de um novo acordo em substituição ao Protocolo de Kyoto, firmado em 1997.


O Brasil pode chegar à  conferência como o novo rico deslumbrado, que gasta o que tem sem pensar no futuro.


Os senhores da moral


Os relatores da proposta de reforma eleitoral, senadores Marco Maciel, do Democratas, e Eduardo Azeredo, do PSDB, incluíram no texto do projeto de lei um artigo que concede à Justiça Eleitoral o poder de decidir quais candidatos têm “idoneidade moral e reputação ilibada” para terem assegurada sua inscrição nas eleições.


Para alguns parlamentares, essa brecha de subjetividade torna todas as candidaturas vulneráveis ao arbítrio de cada juiz dos 27 Tribunais Regionais Eleitorais.


Por outro lado, essa medida coloca nas mãos da imprensa um poder quase absoluto, pois basta investir em uma ou duas acusações para atingir a reputação de qualquer candidato, e mantê-lo fora do páreo.


O projeto contém outras propostas controversas, como a tentativa de regulamentar a propaganda eleitoral gratuita, e um excesso de proibições, como se eleição fosse, em si, uma atividade ilegal.


Ao limitar, por exemplo, o tamanho dos anúncios pagos em jornais ao máximo de dez inserções de 1/8 de página, o projeto está normatizando a desigualdade do poder econômico, pois apenas dois ou três grandes partidos poderiam arcar com o custo dessa veiculação, o que pode fazer grande diferença na reta final da disputa.


A história recente tem mostrado que os jornais podem cometer equívocos, que a Justiça demora a corrigir, o que pode indicar o risco de injustiças se a lei for mantida como está.


Mas o centro da questão, que a imprensa ainda não havia abordado com firmeza até esta sexta-feira, é a falta de uma orientação geral da legislação.


A pouca objetividade no conceito de integridade deixa margem para que os senhores da moral pública decidam quem merece disputar o voto do eleitor.