Meio ambiente e ideologia
Talvez por falta de talento deste observador, alguns ouvintes e leitores que tiveram acesso ao comentário postado na quinta-feira, dia 21, sobre o projeto de mudanças no Código Florestal, indicam a possibilidade de mal-entendidos na interpretação da opinião ali manifestada.
Ali está dito, essencialmente, que a associação entre um parlamentar esquerdista, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e representantes da conservadora bancada ruralista no Congresso coloca em xeque velhas noções sobre ideologia.
Também se afirma que, se a imprensa costumasse contextualizar informações esparsas sobre a questão da sustentabilidade, estaria ajudando a sociedade a tangibilizar uma idéia de país ou alguns conceitos de desenvolvimento sustentável juntando expressões difusas do que seria o interesse nacional.
Entre as frases que parecem ter irritado alguns comentaristas destaca-se a afirmação de que “o interesse nacional vai muito além do que consideram certas mentalidades conservadoras”.
O observador poderia ter dito “tacanhas” ou “retrógradas”.
Estaria apenas se referindo ao fato de que o processo de desenvolvimento de um país, como o que perseguimos, sempre se refere, como objetivo, à conquista de um lugar na contemporaneidade.
Trata-se de um conjunto de conquistas que se referem a bem-estar geral, igualdade de oportunidades, resolução de carências sociais, segurança e crescimento da economia, entre outros desejos coletivos. Alguns chamam isso de Felicidade Interna Bruta.
Aqueles que desdenham a contemporaneidade são ditos conservadores, tacanhos ou retrógrados.
Também é fato que, quando trata de assuntos relacionados a tais interesses difusos da sociedade, a imprensa costuma dar maior valor aos protagonistas mais próximos, geograficamente ou por sua especialidade ou interesse, em relação ao tema tratado em cada caso.
Acontece que, nas sociedades complexas em que vivemos, estar próximo de um problema não quer dizer, necessariamente, ser capaz de analisá-lo de maneira mais abrangente.
Portanto, não é a melhor prática dar aos representantes do agronegócio a precedência na análise do aparente conflito entre a agricultura e o patrimônio ambiental.
O morador das grandes cidades talvez tenha mais a falar sobre esse tema do que os novos parceiros do deputado Rebelo.
O luto de Misrata
Alberto Dines:
– A Guerra Civil havia começado dez meses antes. No dia 26 de Abril de 1937, há quase 74 anos, a aviação nazista a serviço do general Franco, arrasou uma pequena cidade do país Basco, no norte da Espanha que resistia ao seu avanço. Um pintor espanhol exilado em Paris chamado Pablo Picasso protestou contra a barbaridade com um painel que se tornaria célebre e ficaria conhecido através do nome da cidadezinha arrasada: Guernica. O ditador Muamar Kadafi também precisa aniquilar a cidade de Misrata, a única do leste da Líbia em poder dos rebeldes. Como está impedido de usar a aviação, mantém a cidade sob intenso bombardeio de morteiros, dia e noite. Num destes ataques morreram na quarta-feira dois grandes jornalistas americanos e ingleses e gravemente feridos outros dois. O Guernica foi pintado com duas cores apenas: o preto e o branco. Com eles Picasso fez um protesto onde predomina o cinza. As fotos do documentarista Tim Hetherington indicado para o Oscar deste ano e do fotógrafo Chris Hondros, ganhador do Pulitzer de 2004, voltaram à rede mundial. Ao vivo e em cores, Misrata junta-se à enlutada Guernica para um manifesto contra as tiranias e as guerras.