Andando para trás
O discreto e poderoso lobby da jogatina está prestes a emplacar a volta dos bingos e abrir caminho para a legalização dos cassinos no Brasil.
Com apoio explícito de algumas figuras destacadas do Congresso, como o deputado Cândido Vaccarezza, do PT paulista, e o deputado e sindicalista Paulo Pereira da Silva, do PDT-SP, e sob os auspícios de figuras obscuras do submundo dos negócios controversos, o texto do relator Régis de Oliveira (PSC-SP) está à beira de ser votado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
Empurrado por integrantes do chamado “baixo clero”, a bancada sem rosto que empresta seus votos a todo tipo de interesses que não ousam se tornar explícitos, o projeto tenta reverter os efeitos da medida provisória de 2004 que cassou todas as licenças e autorizações para funcionamento de bingos e das máquinas caça-níqueis em território nacional.
Esse tipo de “empreendimento” sempre esteve relacionado aos controladores da contravenção e de outras atividades criminosas, inclusive traficantes de drogas, mas não falta quem levante os supostos “benefícios sociais” do negócio.
Desenvolveu-se até mesmo o esporte do “chute ao número”, que anuncia a criação de centenas de milhares de empregos diretos e indiretos e supostos benefícios sobre a indústria do turismo.
Nada se encontra na imprensa sobre os custos sociais que a jogatina produz em todos os lugares onde é liberada.
Também se usa bastante o argumento de que, legalizados, os bingos e outras casas de jogo irão produzir receita para os cofres públicos.
O relatório encaminhado à votação na Comissão de Constituição e Justiça fala que só com as taxas de regulamentação serão arrecadados 230 milhões de reais.
Como sempre, o projeto vem recheado de boas intenções, como a obrigatoriedade de investir tal receita em projetos de interesse social.
Por enquanto, os jornais ainda não se animaram a contar aos leitores o montante dos custos causados pelo estímulo ao vício do jogo, que tem levado à bancarrota muitas economias domésticas.
Quando a imprensa fecha um olho, a sociedade caminha para tras.
Missão impossível
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– A presidente Cristina Kirchner, da Argentina, tem pressa em aprovar o texto da nova Lei de Radiodifusão que enviou ao Congresso no fim de agosto. Ela quer aproveitar enquanto é possível a tíbia maioria que ainda mantém no parlamento antes da posse, em dezembro, dos novos congressistas eleitos em junho, quando o governo foi derrotado nas urnas.
O problema é que seu projeto encontrou resistências mesmo na bancada fiel ao casal Kirchner. Aliados do governo reclamaram da possibilidade, prevista no texto, de companhias de telecomunicações proverem pacotes de serviços de TV a cabo, além da telefonia e internet. Os críticos viam nisso potencial para a formação de novos monopólios. Para contornar o problema, Cristina convocou anteontem uma rara entrevista coletiva e surpreendeu a todos quando anunciou a retirada desse ponto do projeto, sugerindo que uma futura modificação na legislação das telecomunicações dará conta do assunto.
Restam, no entanto, questões que ainda atazanam os negociadores do governo. Uma delas diz respeito ao futuro órgão controlador da aplicação da lei, cuja maioria, de acordo com o projeto, é composta de representantes do Executivo. Outra se refere ao artigo que prevê a revisão do ordenamento legal do setor de radiodifusão a cada dois anos. O questionamento, aqui, é que esta é uma medida de controle estatal sobre as empresas de mídia, passível de provocar insegurança jurídica e inviabilizar investimentos de longo prazo.
Com maioria instável no Congresso, Cristina corre contra o tempo. Uma corrida repleta de obstáculos.