Um dia de muitas manchetes
Os jornais exploram bastante hoje a condenação do banqueiro Daniel Dantas a dez anos de prisão.
Apenas O Estado de S.Paulo preferiu como manchete a queda de produção da indústria brasileira, supostamente atingida pela crise financeira mundial.
Também chamou a atenção dos jornais a volta das chuvas em Santa Catarina, desta vez afetando a capital, Florianópolis.
No cardápio diversificado da imprensa, ainda cabe o rescaldo dos atentados na Índia.
O enviado especial da Folha de S.Paulo refez parte do trajeto dos terroristas e mostra a fragilidade do sistema de defesa indiano.
Qualquer um desses fatos vale manchete e o mosaico de notícias pode produzir calafrios no leitor.
Se a sentença que condenou Dantas está correta, o cidadão é levado a refletir sobre como as instituições andaram tão vulneráveis ao ponto de permitir que um empresário com tamanha desqualificação tenha se tornado protagonista fundamental no processo de modernização da infra-estrutura de telecomunicações do País.
Um detalhe do noticiário assombra o leitor, por revelar como a entidade maior da Justiça brasileira pode ser passível de influência externa.
Segundo o Globo, citando a sentença condenatória de Dantas, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, chegou a nomear para cargo de confiança na secretaria de segurança do tribunal um militar reformado supostamente ligado ao banqueiro.
O noticiário sobre a queda da produção industrial contém um fato concreto, mas sua causa pode não ser exatamente a crise financeira internacional.
O próprio noticiário alarmista da imprensa brasileira, antecipando efeitos da economia americana no Brasil, pode ter induzido empresários a adotar uma cautela excessiva para evitar prejuízos.
Como se sabe, em economia os profetas do pessimismo nunca erram, pois sempre há uma crise no meio do caminho.
A volta das chuvas no Sul do Brasil mostra nosso despreparo para lidar com calamidades naturais.
Mas o noticiário também pode ser lido de outra maneira.
Santa Catarina pode estar nos ensinando o valor da solidariedade.
O terrorismo na Índia está lembrando que o crescimento econômico do país está longe de ser sustentável, o que traz lições importantes para o futuro.
E a condenação do banqueiro, embora possa ser reformada, revela que a Justiça tropeça, mas tenta seguir adiante.
Quem manda na mídia
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Na quinta-feira passada (27/11), a Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados convocou uma audiência pública para debater as renovações das concessões de radiodifusão vencidas em 2007 e, de quebra, o atual sistema de outorga de concessões para emissoras de rádio e TV.
Como se sabe, os canais de radiodifusão não são propriedade privada de seus operadores, mas concessões públicas outorgadas a título precário, isto é, passíveis de renovações periódicas. A Constituição de 1988 prevê, nesse quesito, a existência de três sistemas complementares – o privado, o público e o estatal. E deixa muito claro, no Artigo 221, que a programação desses canais deve atender a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; promover a cultura nacional e regional e estimular a produção independente, além do respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. São concessões, em suma, que têm obrigações a cumprir com o interesse público.
Contudo, nem todos pensam assim. Afora a omissão do Estado no trato da questão, com sua falta de apetite em encaminhar a necessária discussão de uma regulação democrática para o setor, o representante da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) na audiência proferiu a seguinte pérola: ‘Os concessionários comerciais não precisam atender todo o público, uma vez que pertencem ao sistema privado’. Isto equivale a dizer, como observou o professor Venício Lima em artigo publicado na edição online deste Observatório, que aqueles que têm responsabilidades com o atendimento do chamado ‘interesse público’ são os sistemas público e estatal; enquanto o sistema privado, operando uma concessão pública, atenderia apenas aos seus próprios interesses, ou seja, aos interesses do mercado.
Durma-se com um barulho desses.