Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Crise no Judiciário
>>Um oceano de escândalos

Crise no Judiciário

A imprensa ainda não se havia refeito da surpresa pelo habeas-corpus concedido pelo presidente do STF, Gilmar Mendes, ao banqueiro Daniel Dantas, quando a ousada articulação da Polícia Federal com o juiz Fausto Martin de Sanctis o conduziu de volta à cadeia.

Nas edições de hoje, os jornais não poupam o ministro Gilmar Mendes e escancaram a crise que se criou entre o Supremo Tribunal Federal e a 6a. Vara da Justiça Federal em São Paulo.

A manchete do Globo não poderia ser mais explícita: ‘Juiz desafia STF e manda prender Dantas de novo’.

Os jornais reproduzem a justificativa de De Sanctis para prender novamente o banqueiro, observando que a Justiça Criminal correria o risco de descrédito e ainda seria acusada de preconceito social se as novas provas não fossem consideradas.

O relatório da Polícia Federal afirma que Dantas corrompe, faz espionagem empresarial, manipula a mídia e se prevalece de bom relacionamento com autoridades para manter protegida sua organização criminosa.

Segundo os jornais, o inquérito não investiga apenas os negócios do Banco Opportunity, mas também ‘a aproximação com autoridades públicas, lobistas, jornalistas, grandes empresários e pessoas muito bem articuladas’.

A notícia de que o Banco Opportunity já havia perdido, ontem, cerca de 1 bilhão de reais em saques, foi apurada antes da nova prisão de Daniel Dantas.

Diretores do banco se esforçavam no final da tarde para convencer investidores a manter lá seus capitais, mas o boato de que o Serviço de Inteligência da Receita Federal estaria investigando a carteira de clientes do Opportunity pode acelerar as perdas do seu patrimônio.

Parece ser o fim do império do controverso banqueiro, que mantém relações suspeitas com autoridades desde o governo Collor e já teve entre seus sócios  um ex-presidente do BNDES e do Banco Central durante o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.

O diligente empenho do presidente do STF em libertar Daniel Dantas e seu pedido para que o Conselho Nacional de Justiça investique a conduta do juiz De Sanctis expôe a Suprema Corte a um julgamento público que não ajuda a reputação do Judiciário.

Os jornais também começam a alinhar nomes de parlamentares e outras autoridades que andaram de mãos dadas com o banqueiro.

Os próximos dias vão contar se Dantas vai naufragar sozinho ou se vai levar junto algumas figuras importantes da República.

Um oceano de escândalos

A queda de Daniel Dantas pode ser um divisor-de-águas na história da relação entre a imprensa brasileira e o poder.

Esta é a oportunidade para o jornalismo expor os vícios da nossa República.

Desde que saiba se colocar acima de suas próprias preferências e idiossincrasias.

Alberto Dines:

– O que está sendo publicado pela imprensa a respeito da telenovela Daniel Dantas é apenas uma parte do que efetivamente aconteceu e está acontecendo. As ações da Polícia Federal divulgadas com destaque pela imprensa além de surpreender o próprio governo, constituem apenas a ponta de um imenso iceberg submerso.

Parte deste iceberg apareceu ontem numa dramática matéria do jornalista Bob Fernandes divulgada no portal Terra Magazine com o sugestivo título ‘Os Intestinos do Brasil’. O texto é na verdade uma audaciosa colonoscopia, isto é, uma radiografia do aparelho digestivo do Estado brasileiro.

Como nos tempos da ditadura em que as forças armadas estavam divididas entre a ‘linha dura’ e a turma da distensão, temos agora duas alas nos órgãos de repressão à corrupção. Não se trata de uma dissensão ideológica ou mesmo política. É um confronto operacional e, obviamente moral. Por isso, intenso.

Um grupo é mais prudente,  o outro, apoiado inclusive pelo Ministério Público, é intransigente, não admite contemplação no combate à corrupção.

A imprensa não tem condições de esmiuçar estes lances travados na sombra. Mesmo porque, como ensina a medicina, movimentos intestinais produzem matéria repugnante.

O texto de Bob Fernandes está reproduzido no site www.observatoriodaimprensa.com.br.