Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Varrendo a pobreza
>>O jornalismo robótico

Varrendo a pobreza

Os três mais destacados jornais brasileiros de circulação nacional abordam de maneiras diversas a questão das intervenções do poder público no caso de cidadãos em situação vulnerável.


Um dos pontos cruciais é, evidentemente, a necessidade de retirar moradores de áreas com risco de desabamento, como nas encostas do Rio de Janeiro e Niterói.


A Folha de S.Paulo registra o cuidado do prefeito do Rio, Eduardo Paes, em consultar juizes e promotores para mostrar a necessidade de retirar pessoas de suas casas, para evitar que interpretações “tecnicistas” da Justiça venham a interromper o trabalho da prefeitura.


O Globo preferiu destacar a decisão das autoridades fluminenses de construir dez mil casas para os moradores de favelas sob risco.


O Estadão avança em relação aos concorrentes, adiantando que o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio não vai obstruir as ações da prefeitura, e que poderá aceitar as demolições de casas mesmo sem laudo técnico, apenas com a opinião de peritos emitida em caso de urgência.


É nesse ponto que a imprensa pode fazer diferença na análise dos acontecimentos.


O que está em jogo, além da segurança de quem vive em situação vulnerável, é o direito fundamental da inviolabilidade da moradia.


Além disso, discute-se o limite da ação do Estado diante das escolhas pessoais do cidadão.


A sociedade merece saber como as coisas são feitas. 


Também no Estadão, chama atenção reportagem sobre a decisão do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que decidiu afastar agentes de proteção social do trato com moradores de rua e colocar a polícia para lidar com a questão.


Segundo o jornal, desde o dia 1o. de abril a Guarda Civil Metropolitana está encarregada de retirar pessoas que dormem nas calçadas do centro da cidade.


Desde então, tem aumentado o número de denúncias de violência contra os sem-teto.


As ocorrências de agressões, roubo de documentos e uso de meios violentos como spray de gás pimenta e bombas de efeito moral se acumulam, segundo o jornal.


Tudo indica que está em andamento um processo de criminalização da pobreza e de higienização social.


Menos mal que pelo menos um jornal esteja de olhos abertos.
 
O jornalismo robótico

Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:

– Muita coisa mudou no jornalismo desde a popularização da internet e da banalização das mídias digitais. E como historicamente toda grande transformação traz em si uma crise, com o jornalismo não tem sido diferente, sobretudo na mídia impressa. A desestruturação de um modelo de negócios secular desarvorou a indústria jornalística, que tem feito das tripas coração para reencontrar o caminho da sustentabilidade.


É preciso admitir que já houve avanços, algumas soluções – embora pontuais – mostraram-se bem sucedidas, mas ainda há um mundo inteiro a ser construído. E para incômodo dos estrategistas dos jornais, a tecnologia não lhes dá sossego, muito menos refresco. Veja, por exemplo, no que andam trabalhando os pesquisadores do Laboratório de Informação Inteligente da Universidade Northwestern, no estado americano de Illinois.


Eles estão desenvolvendo dois softwares capazes de articular relatos, digamos, jornalísticos a partir de um fluxo de dados externos.


Um dos programas, o StatsMonkey, trabalha com informações sobre jogos de beisebol e de basquete para montar textos com cara de notícia a respeito das partidas. O outro, News @ Seven, é mais sofisticado porque pretende compilar as informações brutas que recebe sobre determinado assunto com os dados que pode encontrar na internet sobre o tema. A partir daí, não apenas tenta construir um relato jornalístico como também indica alternativas para a edição final do material.


Tudo isso pode não passar de um delirante exercício acadêmico, mas é impossível não comparar o que a máquina pode fazer com os exemplos gritantes de jornalismo pasteurizado que pululam por aí. Lemos matérias que parecem mesmo ter sido escritas por um robô. Nada mais urgente, portanto, que investir no jornalismo de verdade antes que haja o risco de o público se acostumar com o pastiche.