Caneladas em Brasília
O governo pegou pesado nos debates sobre a proposta de prorrogação da CPMF.
A responder às críticas da Fiesp, que na quarta-feira entregou um abaixo-assinado com 1 milhão e 300 mil assinaturas contra o tributo, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, incluiu as federações das indústrias e do comércio na conturbada discussão.
A resposta do governo para compensar a perda de receita com a CPMF foi propor a redução da alíquota de contribuição ao chamado Sistema S, que engloba treze entidades, como o Sesi, o Sesc, o Senai, o Senac e o Sebrae.
A Fiesp, a Confederação Nacional das Indústrias e as entidades do comércio não gostaram nem um pouco.
Comentário do ministro, nos jornais de hoje: ‘pimenta nos olhos dos outros é refresco’.
O Estado de S.Paulo havia publicado, dois meses atrás, uma reportagem curta sobre a falta de fiscalização no uso do dinheiro que vai para as entidades.
Ontem, representantes da indústria e do comércio correram a explicar aquilo que o governo já começava a chamar de ‘caixa-preta’ do sistema S.
O dinheiro que sustenta o sistema é arrecadado pela Previdência Social e repassado para as entidades sob fiscalização da Receita Federal.
A contribuição varia de 1% a 3% sobre a folha de salários das empresas.
Como o tema mexe não apenas com a CPMF mas também com o chamado ‘custo Brasil’, os empresários trataram de baixar a poeira, para evitar que o assunto vire conversa de botequim.
No final, o ministro Paulo Bernardo e seu colega da Fazenda, Guido Mantega, retiraram a proposta de incluir a contribuição para as entidades no debate sobre a CPMF, mas deixaram claro que vão voltar ao assunto no futuro.
Na verdade, o que o governo pretende é manter a Fiesp, que tem sido especialmente crítica em relação à política tritubária, mais distante das negociações no Congresso.
Entidades como Senai e Senac são fundamentais para a indústria e o comércio porque garantem a formação de mão-de-obra qualificada para as empresas.
O Sebrae é importante também para o País, porque é o grande instrumento de qualificação de micro-empresários.
O Sesi e o Sesc são as principais, e, em alguns casos, as únicas opções de educação e lazer cultural para milhões de jovens brasileiros.
Colocar as entidades sob risco na queda de braço entre governo e oposição não é boa política.
Por outro lado, o uso dos 13 bilhões de reais arrecadados todos os anos das empresas precisa ser mais transparente.
É isso que os jornais de hoje deixam no ar.
Guerra santa na TV
O caso que tem o padre Júlio Lancelotti como peça central tem exigido dos jornais cuidados extremos.
Afinal, ninguém quer ver repetido o erro da Escola Base.
Mas nem toda a imprensa age com a cautela necessária.
Dines:
– Foi uma sábia decisão das autoridades manter sob sigilo as investigações sobre o caso do padre Lancelotti. Mas é preciso lembrar que as irresponsabilidades na cobertura do caso não se limitam ao vazamento de informações por parte da polícia; alguns veículos da mídia estão procurando confundir o andamento das investigações com pistas falsas e testemunhas suspeitas. A rede Record ganha de longe neste tipo de manipulação do noticiário. Exemplo é a testemunha-bomba, ex-funcionária da Casa Vida, que teria visto o padre em situações embaraçosas. A personagem e suas revelações estão envoltas em suspeições. Mas sua aparição serviu para mostrar como informações capciosas marteladas por um poderoso veículo de comunicação podem tumultuar a busca da verdade. Está parecendo que o conglomerado Record pretende reeditar a Guerra Santa dos anos 90 quando um dos seus pastores chutou diante das câmeras uma imagem católica. Se esta é a tática que o conglomerado do bispo Edir Macedo pretende adotar para acabar com o que chamou de ‘monopólio da informação’, fez a opção errada. O telespectador pode ser enganado algumas vezes mas não pode ser enganado sempre.
Luciano:
Lula-lá outra vez?
As especulações sobre a suposta intenção do presidente Lula da Silva de mudar as regras eleitorais para tentar um terceiro mandato estão atrapalhando os trabalhos no Congresso Nacional.
Há um mês, os jornais trazem diariamente notícias e comentários sobre essa possibilidade.
O desmentido oficial feito pelo presidente da República, em meados de outubro, tinha acalmado os ânimos, mas o tema voltou a agitar os políticos, com a revelação de que a Câmara dos Deputados havia desarquivado, em fevereiro, uma proposta de emenda constitucional que permite a reeleição sem limites para quem ocupa cargos executivos.
Diante do diz-que-diz, e com a suspeita de que Lula estaria planejando ficar no poder até 2015, a oposição voltou a travar as votações no Congresso.
Hoje, os jornais contam que o presidente da República criou um grupo de convencimento, formado por três ministros e dois parlamentares, para tirar o assunto da pauta de uma vez.
Acontece que pelo menos dois deputados da base governista, um deles amigo de Lula desde os tempos do sindicato dos metalúrgicos, afirmaram que vão apresentar ao Congresso um projeto que permite um terceiro mandato para o atual presidente.
A convicção dos oposicionistas, segundo os jornais, é de que Lula não quer, mas o PT adoraria continuar no poder.
O tema reeleição afeta diretamente a disposição dos oposicionistas no Senado de continuar negociando com o governo uma forma de aprovar a prorrogação da CPMF.
Especialmente para o PSDB, que tem candidatos com melhores chances de suceder o presidente Lula nas eleições de 2010, a manutenção do tributo é um recurso que não pode ser dispensado.
O caso muda completamente se Lula, com a popularidade mantida, chegar a 2010 com possibilidade de ganhar mais cinco anos de mandato.
Um passo importante para o entendimeno foi dado ontem: o governo admite que a CPMF pode virar, de fato, um tributo permanente, mas com alíquotas progressivamente menores.
Para entender melhor: se tiver chances de chegar à Presidência, a oposição prefere manter a CPMF. Se houver a chance de Lula continuar, a oposição acha melhor aparar suas asas desde já.
O que os jornais dizem, claramente, é que existem muito mais razões por trás das discussões sobre receita do que podem ser demonstradas numa calculadora.