Engraxando a motosserra
O deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) anuncia alterações no seu relatório sobre o projeto de mudanças no Código Florestal.
Ele afirma que a versão final, que deverá ter a votação iniciada na Câmara na próxima semana, vai restaurar a obrigatoriedade para os pequenos agricultores, donos de até quatro módulos fiscais, de preservar a vegetação nativa de suas propriedades.
Ele não pretende, porém, obrigar esses proprietários a recompor a mata destruída. Como o projeto também assegura uma ampla anistia a quem desobedece a lei, dizem os ambientalistas, a medida equivale a uma licença para desmatar.
Observe-se ainda, como lembra a Folha de S.Paulo, que na Amazônia um módulo fiscal pode ter mais de 100 hectares.
Ao mesmo tempo em que anuncia concessões, o deputado relator publica artigo no jornal O Estado de S.Paulo no qual volta à tese de que as restrições ambientais são uma invenção do capitalismo internacional para impedir o desenvolvimento dos paises pobres.
Numa enxurrada de silogismos, o parlamentar afirma que, se persistir a legislação de proteção florestal, o brasileiro terá que esperar, no futuro, que a comida caia do céu.
Baseado em um texto distribuído por entidade representativa do agronegócio dos Estados Unidos e já devidamente desmontado por especialistas, o artigo argumenta que o movimento em defesa do patrimônio ambiental tem inspiração e financiamento do exterior.
O deputado passa longe do fato de que, com a mesma legislação que ele tenta derrubar, o Brasil vem avançando como um dos maiores produtores mundiais de alimentos, produzindo recordes sobre recordes em sua safras.
Ao anunciar um suposto recuo em suas intenções, ele claramente busca aproveitar a distração geral com a Copa do Mundo para fazer passar a proposta de transferir aos Estados a atribuição de legislar sobre o patrimônio ambiental nacional – o verdadeiro cavalo de Tróia do seu relatório.
Os jornais cumprem seu papel ao abrigar artigos do deputado Aldo Rebelo e seus aliados da bancada ruralista, porque é do bom jornalismo apresentar todos os lados das questões controversas.
Mas observa-se certa simpatia pelo relatório, principalmente nas páginas do Estado de S.Paulo.
O assunto está longe de ter sido esclarecido.
Honestidade intelectual anda em falta nesse debate.
Para começo de conversa
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Está marcada para a próxima quarta-feira, daqui a uma semana, uma audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados para discutir a presença do capital estrangeiro em empresas de comunicação.
A audiência foi motivada por um movimento das entidades patronais brasileiras, que vem tomando corpo desde o ano passado, no sentido de limitar a atuação de corporações estrangeiras na produção de conteúdo jornalístico, sobretudo na internet.
A legislação que regula o tema é regida pelo artigo 222 da Constituição de 1988, que então vedava a participação de controladores estrangeiros em empresas jornalísticas nacionais. O texto do artigo foi modificado em maio de 2002, por meio de emenda constitucional, de modo a permitir em até 30% a participação estrangeira na propriedade de empresas jornalísticas e de radiodifusão.
À época, esta alteração foi saudada pelo empresariado brasileiro da comunicação como uma bóia de salvação diante do grave endividamento que então suportava, ainda reflexo do estouro da bolha da internet e também das aventuras patrocinadas pela irresponsabilidade cambial.
O problema é que não se percebeu, há oito anos, a dimensão do avassalador avanço da internet como plataforma de disseminação de conteúdos audiovisuais e jornalísticos.
De outra parte, a legislação que regula a radiodifusão em nosso país é um caos legiferante cuja base é a lei 4.117, de 27 de agosto de 1962, isto é, de 48 anos atrás. Junte-se a tudo isso o fato de que os artigos do Capítulo 5 da Constituição, que trata da comunicação social, ainda esperam por regulamentação 22 anos depois de promulgada a Carta Magna. Isto sem falar da forte presença de parlamentares com mandato no controle de veículos de radiodifusão.
Resumo da ópera: a audiência pública da semana que vem poderá até suscitar um bom debate, mas não deverá passar muito disso. Apenas um bom debate. E estaremos conversados.