Riscos do crescimento
A imprensa brasileira parece surpresa com as mudanças que se anunciam no Paraguai.
A simples declaração do vice-presidente eleito, de que o Paraguai não quer mais ser súdito de seus vizinhos, bastou para levar as eleições no país vizinho a posição de destaque nos grandes jornais.
O Globo traz o assunto na primeira página, como se fosse uma surpresa o país mais pobre do Cone Sul se apresentar à festa do crescimento que começa a se consolidar no continente.
A abordagem dos jornais brasileiros aos planos do futuro presidente paraguaio lembra bastante os primeiros meses do governo de Evo Morales, quando a Bolívia começou a exigir um tratamento diferente de seus parceiros comerciais no continente.
Por outro lado, os países que formam a chamada Frente Bolivariana, sob liderança do venezuelano Hugo Chavez, anunciam a criação de um fundo para proteger a região contra os efeitos da crise mundial que se anuncia com a inflação de alimentos.
O noticiário dos últimos dias sobre os dois assuntos pode causar a impressão de que a América Latina está se dividindo em dois grupos de países: o dos desenvolvimentistas, liderado por Brasil e Argentina, e o dos alternatives, anti-capitalistas.
O risco para o Brasil, nesse cenário, é passar a representar o papel que os Estados Unidos mantiveram durante décadas – o de potência exploradora dos paises pobres.
O repetido noticiário sobre os êxitos econômicos do Brasil, a balança comercial favorável, o anúncio de novas reservas de petróleo e a perspectiva de grandes investimentos nos projetos de biocombustíveis ajudam a formar a imagem de um Brasil mais poderoso que seus vizinhos.
O Brasil já é destino preferencial de muitos cidadãos pobres dos países vizinhos, que migram para cá em busca de uma vida melhor.
Se continuar se ampliando essa diferença entre dois blocos no continente, todo esforço da diplomacia brasileira nos últimos anos pode ficar comprometido.
A imprensa não é responsável pelas relações externas do País, mas pode agravar ou ajudar a prevenir certos sentimentos de xenofobia que já se apresentam por aqui.
A dança das CPIs
A CPI dos cartões corporativos entra agora na fase do varejo, com governistas e oposicionistas dedicados a literalmente catar exemplos de gastos exóticos para alimentar a imprensa.
A busca certamente vai animar as futuras campanhas eleitorais.
Os marqueteiros, especializados em apresentar o detalhe pelo todo, vão adorar poder contar com algumas histórias de contas inadequadas para atacar os adversários de seus contratantes.
A procura de certos detalhes mais despudorados dos gastos com o dinheiro público equivale a uma verdadeira caça ao tesouro.
Por outro lado, a nova atração do Congresso Nacional promete ser a CPI da pedofilia.
Depois que a empresa Google apresentou aos senadores da comissão um pacote de informações sobre o conteúdo de 3.261 álbuns privados de fotografias virtuais, cresce a expectativa pelas identidades de seus proprietários.
Com base em informações da Polícia Federal, os membros da CPI calculam que haja pelo menos duzentos casos de pedofilia nesse material.
O conteúdo é formado por imagens e mensagens de usuários do Orkut, serviço mantido pelo Google.
Como se sabe, é possível forjar a identidade apresentada nesses albuns, o que pode provocar erros de identificação.
A falta de segurança na manipulação de documentos públicos, já comprovada em outras ocasiões, aumenta o risco de vazamentos.
Se até mesmo o caso da tapioca vazou para a imprensa, no meio de milhões de recibos da CPI dos cartões, pode-se esperar a qualquer momento a circulação de conteúdos da CPI pela internet.
A empresa Google, que já foi acusada de colaborar com autoridades chinesas na identificação de dissidentes que usam a rede mundial de computadores para fazer denúncias de desrespeito aos direitos humanos na China, está empenhada em colaborar com os senadores da CPI.
Os senadores, por outro lado, estão sempre garimpando novidades ao gosto da imprensa.
Está aí uma combinação que pode ser perigosa para o direito à privacidade.