Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Com medo do capeta vermelho
>>Um assunto polêmico

Com medo do capeta vermelho


A imprensa recebeu com um pé atrás – e repassou a desconfiança ao mercado – o anúncio de que o governo brasileiro ampliou os poderes dos bancos estatais para adquirir instituições financeiras privadas e comprar empresas sob risco de quebra.


A razão não tem nada a ver com a eficácia ou conveniência da medida, mas com a desconfiança geral de que o atual governo está sempre empenhado em ampliar a presença do Estado na economia.


A imprensa brasileira está com medo de que uma revolução socialista venha tocando tambores atrás da crise financeira. 


Interessante notar que a Medida Provisória anunciada ontem foi inspirada numa conversa do presidente Lula com o primeiro-ministro da Inglaterra, Gordon Brown, que o convenceu da necessidade de ampliar o poder de intervenção do Estado, como ação preventiva contra a quebradeira do mercado.


A mesma iniciativa, quando tomada na Inglaterra, provocou elogios gerais na imprensa internacional, repetidos pela mídia brasileira.


O primeiro-ministro Gordon Brown até ganhou o apelido de ‘Flash Gordon’, pela rapidez com que ampliou os poderes do Estado para agir na crise.


A imprensa destacou sua liderança, comparando-o ao presidente George Bush, dos Estados Unidos, que se mostrou indeciso diante da emergência.



Por que, então, as edições de hoje dos jornais estão repletas de restrições à Medida Provisória que amplia a margem de negociação do Banco do Brasil e outras instituições públicas no setor?


Os jornalistas de economia sabem que, mesmo antes da crise, havia um processo de concentração no setor bancário, e que era esperada nova onda de fusões e aquisições.


Os editores também sabem que o Proer, ao reformar o sistema financeiro no Brasil, criou uma estrutura mais sólida mas não garantiu a criação de um sistema plenamente competitivo.


A sucessão de compras de pequenos bancos e o processo de oligopolização no setor compõem um retrato dessa realidade. 


A decisão do governo foi motivada pelo simples fato – noticiado pela imprensa – de que os grandes bancos, beneficiados com repasse de dinheiro pelo Banco Central, estavam retendo os recursos que deveriam ser usados para a oferta de crédito e fazendo caixa para uma nova ofensiva de aquisições.


O governo agiu rápido como ‘Flash’ Gordon, mas a imprensa brasileira ainda vive assombrada com o fantasma do comunismo.


Um assunto polêmico


Os jornais apenas noticiaram ontem, e hoje deixam de lado, a proposta da Ordem dos Advogados do Brasil para que seja abolido o RDD, Regime Disciplinar Diferenciado, vigente no sistema penitenciário brasileiro.


Segundo a ação protocolar de inconstitucionalidade encaminhada pela OAB junto ao Supremo Tribunal Federal, a lei de 2003 que criou o regime mais rigoroso para certos condenados viola a Constituição e sujeita os presos a condições desumanas. 


O regime disciplinar diferenciado tem sido aplicado a preso que comete crime doloso, que coloca em risco a segurança e a ordem do presídio ou que é membro de organização criminosa.


Foi criado justamente para manter isolados esses indivíduos, que promoviam rebeliões e usavam o sistema penitenciário para ampliar sua influência no mundo do crime.


Já passaram pelo RDD bandidos notórios, como os traficantes Fernandinho Beira-Mar e Marcola.


Eles ficam em celas individuais, têm direito a banho de sol de duas horas por dia e recebem visitas semanais de duas pessoas de cada vez, por duas horas.


Comparadas às condições reais em que vive a maioria dos detentos do País, não parece assim tão desumano, ainda mais considerando-se a periculosidade desses sentenciados.



A Ordem dos Advogados do Brasil tem suas razões, e elas estão alinhadas na ação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal.


Entre elas destaca-se o fato de que um preso pode ir para o Regime Disciplinar Diferenciado só com um pedido da administração penitenciária avalizado por um juiz competente.


Também pesa no pedido da OAB o critério de punição, baseado na simples suspeita de que um preso pertence a uma organização criminosa.


No entanto, o pedido de suspensão do regime mais rigoroso caminha contra o senso comum e contra a opinião de muitos especialistas, que consideram necessário um sistema que reduza a sensação geral de impunidade e ajude a desestimular o ingresso de novos membros nas máfias que dominam os presídios e ameaçam a sociedade aqui fora.


O tema merecia mais atenção da imprensa.