As denúncias irrespondíveis
Luciano:
Estados Unidos e Europa socorrem os mercados. No Brasil, Renan Calheiros cria uma armadilha para si mesmo.
Dines:
– O senador Renan Calheiros acreditava que a melhor defesa é o ataque e ontem resolveu acusar a Editora Abril por eventuais irregularidades na venda da TV-A à operadora Telefônica. Errou feio. Os negócios da Editora Abril nada têm a ver com as denúncias de Veja. Ao confundir as duas coisas, o senador assumiu publicamente que não tem resposta para as últimas denúncias do semanário. Difícil imaginar que empresas do porte da Telefônica e da Abril façam um negócio irregular, o mercado de capitais hoje passa por múltiplas fiscalizações. O presidente do Senado entendeu o recado do presidente Lula que em meio à viagem ao Caribe disse com todas as letras que gostaria muito que este caso chegasse ao fim. Era tudo o que o senador Renan não gostaria de ouvir porque a sua tática tem sido a de procrastinar, enrolar, vencer pelo cansaço. Veja pode ter errado lá no início quando simplesmente reproduziu as acusações da ex-namorada Mônica Veloso ao invés de esperar alguns dias e comprová-las. As denúncias de Veja no último fim de semana sobre a concessão de canais de radiodifusão para o seu filho são irrespondíveis. O ato não é ilegal, mas contraria frontalmente o decoro, portanto é imoral: um parlamentar não pode beneficiar-se indiretamente de uma concessão que, por obrigação, deve fiscalizar. O bom da história é que grande parte dos parlamentares tem usado do mesmo expediente de conceder canais de radio e TV a seus parentes. Renan está encalacrado: se o caso das concessões continuar em pauta, mesmo os senadores amigos serão obrigados a ficar contra ele.
Luciano:
Os mercados estremecem
Não apenas os jornais brasileiros, mas praticamente toda a imprensa mundial abre hoje manchetes para a crise provocada pelos fundos imobiliários americanos.
A imprensa destaca a intervenção dos bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa, injetando 154 bilhões de dólares no mercado.
De modo geral, os jornais brasileiros fizeram uma cobertura equilibrada, evitando expressões relacionadas a pânico.
Com as reservas de moeda estrangeira elevadas, o Brasil se torna menos vulnerável. Ao contrário da crise de 1998, quando o risco-país atingiu 2 mil pontos, desta vez a medida de risco do Brasil não passou de 200 pontos.
Os principais diários nacionais apresentaram desenhos para ajudar o leitor a entender os acontecimentos.
O Estado de S.Paulo investiu num infográfico de quase uma página inteira. Pena que as expressões, em economês castiço, torne o trabalho útil apenas para quem já entende o que está acontecendo.
Deputados assustados
Os jornais relatam o susto por que passaram os passageiros do vôo 1205 da Gol, que chegava ontem às 15 horas em São Paulo.
Um alerta no sistema automatico de freios levou o piloto a transferir o pouso de Congonhas para Cumbica.
Somente o Globo informou que se tratava de um Boeing 737.
Entre os passageiros havia quinze deputados embarcados em Brasília.
O sistema de emergência de Cumbica foi acionado e o avião pousou com uma hora de atraso, sem maiores incidentes.
Os freios funcionaram.
O episódio, segundo os jornais, revela como os pilotos estão receosos de arriscar operações no limite da segurança em Congonhas.
Renan cai na rede
Os jornais seguem descrevendo a patética agonia política do senador Renan Calheiros.
A história que começou com um caso extraconjugal era apenas a ponta de um novelo.
Seguindo a linha, a imprensa vem revelando que o presidente do Congresso tem aumentado seu patrimônio com apartamentos, fazendas, emissoras de rádio e outras propriedades. Sempre com o tal Tito Uchôa, seu primo, como testa-de-ferro.
A Folha informa hoje que obteve documentos e entrevistou ex-proprietários de terras em
Alagoas, que afirmam ter vendido duas fazendas para Renan Calheiros e seu irmão, o deputado Olavo Calheiros.
Os negócios foram feitos em nome de Tito Uchoa.
Renan voltou à tribuna do Senado para se defender das acusações. Mas, em vez de apresentar argumentos a seu favor, apenas atacou a imprensa.
Para alívio de muitos parlamentares, ele não cumpriu a ameaça de revelar o que sabe sobre alguns colegas do Congresso.
A situação de Renan Calheiros é muito parecida com a que antecedeu a queda do ex-presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, em 2005: depois das primeias denúncias, a imprensa começa a investigar, e a sucessão de novas acusações torna a defesa impossível.
No caso do presidente do Senado, a cada tentativa de argumentar ele se afunda em mais contradições.
Depois das suspeitas de que Renan apresentou comprovantes fraudados para justificar a pensão paga à ex-amante Mônica Veloso e sua filha, já se amontoaram sobre ele pelo menos quatro outras acusações.
E o presidente do Senado ainda nem conseguiu explicar a primeira história.
Nas mãos de Fidel
A imprensa finalmente se deu conta do condimentado entrevero que deixou escapar com o caso dos boxeadores cubanos.
Depois de frangar o melhor da história, os jornais e as revistas semanais se ocupam agora de reconstituir os fatos e cobrar das autoridades alguma responsabilidade.
Os lutadores Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara estavam bem ao alcance dos repórteres quando foram detidos no Rio. Um interesse maior da imprensa poderia ter inibido a Polícia Federal em sua pressa de mandá-los de volta para Cuba.
Quase uma semana depois dos acontecimentos, os jornais trazem hoje relatos detalhados da fuga dos atletas. Porta-vozes da Polícia Federal afirmam que os embarcaram imediatamente para Havana a pedido dos próprios boxeadores.
Mas o Itamaraty afirma que não foi sequer informado da operação.
O secretário nacional de Justiça, Antonio Carlos Biscaia, entrevistado pela Folha, diz que o delegado responsável pelo caso errou ao preencheer os documentos para a viagem.
Em vez de ‘termo de deportação’, ele deveria ter escolhido ‘termo de repatriação’.
Como deixou escapar a história entre as pernas, resta à imprensa a discussão semântica.