Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Por que aceitar a censura?
>>Unanimidades da Folha

Por que aceitar a censura?


O arquivamento das denúncias contra o presidente do Senado, José Sarney, por iniciativa do presidente do Conselho de Ética, deixou a imprensa brasileira momentaneamente desorientada.


Sem um fato concreto para dar sequência ao processo de desmanche público de Sarney, jornais e revistas deste final de semana preferiram fazer um balanço geral, evitando especular sobre os próximos movimentos das forças em antagonismo no Congresso.


O Globo apostou num debate entre especialistas sobre a existência do Senado Federal.


A Folha de S.Paulo simplesmente abandonou o assunto.


O Estado de S.Paulo desviou-se um pouco do caso Sarney para avaliar como esses escândalos paralisam os trabalhos legislativos, e apresentou um levantamento da sucessão de denúncias que envolvem o Senado desde 2001, quando o então presidente da Casa, Jader Barbalho, foi obrigado a renunciar.


Nesta segunda-feira, os jornais voltam a acreditar que o Senado vai mudar a decisão do presidente do Conselho de Ética e levar Sarney a julgamento.


Mas a Folha cria um fato novo, ao noticiar que também o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, andou cometendo irregularidade, ao mandar para as contas públicas as despesas de viagem da filha a Nova York.


Com isso,  a tropa de choque de Sarney ganha munição para seguir mantendo sua tática de intimidação.


O Estadão coloca todo o noticiário sobre o Senado na série “Estado sob censura”, procurando amplificar a repercussão da decisão do juiz Dacio Vieira, do Distrito Federal, que proíbe o jornal de publicar informações sobre as investigações que atingem o empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney.


Talvez fosse o caso de refletir se a atitude do jornal, de se apresentar como vítima de censura, seja a melhor para seus leitores e para a sociedade.


Imagine-se o que aconteceria se o mais do que centenário Estadão, veterano de outras porfias e tentativas de intimidação muito mais severas, decidisse enfrentar a censura e publicasse uma ampla reportagem sobre os negócios de Fernando Sarney?


Que tal se o jornal, em vez de ficar se lamentando, exercesse o legítimo direito da desobediência civil contra essa medida que considera abusiva, pagando a multa imposta pelo juiz Dacio Vieira com apoio de seus anunciantes e leitores? 


Unanimidades da Folha


Alberto Dines:


– A Folha de S. Paulo tinha um enorme abacaxi e não sabia como descascá-lo. Agora tem dois abacaxis e continua sem saber como livrar-se deles.


O nome de José Sarney assinando uma coluna na nobilíssima Página Dois deixou o jornal numa posição constrangedora a partir da reeleição para presidir o Senado. Ficou ainda mais constrangedora quando o senador-colunista tornou-se alvo de uma formidável sucessão de denúncias veiculadas por toda a mídia, inclusive a própria Folha.


O problema agravou-se há duas semanas, quando o articulista passou a usar o espaço do jornal em sua defesa, o que é eticamente incorreto. E como se não bastassem os desconfortos, eis que uma colunista do mesmo jornal, da mesma página, a também senadora Marina Silva, começa a ser ostensivamente cogitada como candidata à sucessão de Lula pelo partido Verde.


Ao contrário do colega, Marina separa a sua atividade política da sua função jornalística: suas manifestações a respeito da eventual candidatura foram veiculadas em outros veículos.


Considerando seus compromissos éticos é possível que Marina consiga evitar a superposição das duas carreiras, a de colunista e a política.


Mas no final de março, quando os candidatos deverão desincompatibilizar-se das funções públicas, a senadora Marina Silva terá que assumir-se como candidata dos Verdes. Então a Folha exigirá que deixe a coluna se não exigiu o mesmo de Sarney quando se candidatou à reeleição no Senado? Candidatura confirmada, será então a oportunidade para o jornal livrar-se do outro colunista, pivô de tanta celeuma?


Uma coisa está clara: nenhum jornal deste país jamais ostentou em seu corpo de articulistas duas unanimidades nacionais: Marina Silva, exemplo de simpatia, dignidade e idealismo. José Sarney é… José Sarney, dispensa qualificativos.


A Folha está bem servida.