O vice-rei do Amapá
O jornal O Estado de S.Paulo fez a lição de casa e demonstra, na edição de hoje, que o maior responsável pelo inchaço na diretoria do Senado é o atual presidente da casa, José Sarney.
Segundo o jornal paulista, na segunda gestão de Sarney, entre 2003 e 2005, foram criadas 70 das atuais 181 diretorias do Senado Federal.
Só na antiga Secretaria de Comunicação Social, transformada por ele em Secretaria Especial, brotaram vinte cargos de direção.
Até agora não se ouviu nenhum jornalista, através do sindicato, associação ou federação, se queixar do presente.
A revelação do Estadão oferece aos leitores e, principalmente aos telespectadores, um novo ponto de vista para analisar o comportamento recente do presidente do Senado.
Em todas as entrevistas que concedeu após a revelação do número exagerado de diretorias, ele se apresentou à opinião pública com ares de surpresa e indignação, prometendo sanar as distorções na estrutura administrativa do Legislativo.
Sarney chegou a sacar do bolso do colete um convênio com a Fundação Getúlio Vargas para a realização de uma auditoria, que deveria empurrar o problema para seis meses à frente.
Hoje, a imprensa já informa que tal auditoria não pode ser feita sem licitação, o que exige dos jornalistas que voltem a assediar o presidente do Senado até que ele ofereça uma resposta aceitável.
Uma questão adicional: Sarney anunciou que fecharia imediatamente metade das diretorias, mas hoje os jornais noticiam que o primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes, determinou a extinção de apenas cinquenta.
Mas vai ser difícil falar com José Sarney nestes dias: ele foi recarregar o ego no Amapá, onde estabeleceu um vice-reinado para sua família.
Aliás, foi assim que seus correligionários o receberam em Macapá: “ei, ei, ei, Sarney é nosso rei”.
A imprensa bem que podia aproveitar o mote e mandar alguns repórteres para o Amapá e o Maranhão.
Quem sabe não se revela ao resto do Brasil o paraíso de desenvolvimento econômico e social que o estilo de governo Sarney produziu no norte do País.
Desconcertando a mídia
Um assunto que deixa a mídia desconcertada é a questão da desconcentração.
Bastou a presidente da Argentina, Cristina Kirschner, anunciar mudanças na legislação do pais para diminir a concentração da propriedade de empresas de comunicação que se desatou uma guerra midiática.
A mesma tempestade se prepara no Brasil, onde a criação do Conselho de Comunicação Social foi embargada pelo senador José Sarney em 2005 na mesma época em que ele criou as 70 diretorias de fantasia como presidente do Senado.
Alberto Dines:
– Dois dos três jornalões nacionais, Globo e Folha, saíram ontem com matérias sobre as mudanças que a presidente Cristina Kirschner quer fazer na legislação para diminuir a concentração da mídia. A idéia é positiva e democrática: quanto mais empresas de mídia atuando no mercado, mais diversidade e pluralidade.
A concentração da mídia argentina, de certa forma é pior do que a brasileira porque aqui as coisas são mais transparentes, visíveis. No país vizinho as associações são quase clandestinas.
Acontece que a ofensiva do governo argentino para oxigenar a sua mídia, embora resulte de uma antiga aspiração, só foi formalizada ontem, poucos dias depois da decisão de antecipar as eleições legislativas.
Pode ser coincidência, mas também pode ser um tipo de manha que está se tornando moda na América Latina: intimidar e enquadrar a imprensa em momentos em que ela pode ser decisiva.
É notória a má vontade do casal Kirschner com a imprensa local, porém chama a atenção o fato de que esta má-vontade tenha se materializado justamente quando começa uma corrida eleitoral que não estava prevista.
Aqui no Brasil fazemos as coisas com um jeitinho especial.
Um movimento semelhante para desconcentrar a mídia brasileira também foi divulgado pelo governo nesta semana. A desconcentração aqui também pode representar um importante avanço democrático. A manobra foi mais sutil: quem vai discutir as mudanças será uma Conferência Nacional de Comunicação Social no fim deste ano, da qual participarão três ministérios e todos os setores interessados. Note-se, porém, que no seguinte teremos eleições presidenciais. Se o Conselho de Comunicação Social não tivesse sido embargado há três anos por ordem do senador José Sarney, grande aliado do governo, parte substancial das mudanças já estaria sendo discutida e talvez até implementada.