Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Vamos aos fatos
>>Mania de imitar

Vamos aos fatos

Parte da imprensa diária começa a penetrar no labirinto das investigações que levaram à prisão de executivos da empresa Camargo Corrêa e comerciantes informais de moeda estrangeira, os chamados doleiros.

Um detalhe importante para seguir daqui para a frente as declarações a respeito do escândalo está registrado na abertura da reportagem principal de O Estado de S.Paulo, edição de sexta-feira: “Escutas telefônicas feitas com autorização judicial indicam a participação de executivos da Construtora Camargo Corrêa em suposto esquema de doações ilegais para políticos”.

Portanto, afasta-se liminarmente a hipótese de que a Polícia Federal tenha cometido abusos durante a Operação Castelo de Areia, como gravações ilegais.

Outros detalhes apontam por que a Federação das Indústrias no Estado de São Paulo foi envolvida: Fernando Botelho, sócio da empreiteira, é também vice-presidente da Fiesp e amigo do presidente da entidade, Paulo Skaf.

Pelo menos um trecho das conversas gravadas faz referência a Skaf, que é candidato a candidato ao governo do Estado de São Paulo.

Se quiser, a imprensa poderá acrescentar outros fatos à investigação, esclarecendo a sociedade sobre como a política é financiada pelo dinheiro público, através do chamado “por fora”.

De resto, a Polícia Federal agiu com discrição, não expondo os acusados a vexame durante as detenções.

A reação de dirigentes dos sete partidos citados pela Procuradoria da República é apenas normal: apanhados em flagrante ou simplesmente apontados como suspeitos, os políticos sempre vão dizer que se trata de perseguição com fins eleitorais.

E é claro que haverá uso eleitoral dos fatos, como sempre.

Mas isso não elimina nem diminui a importância dos fatos.

Essa é uma fala que não pode faltar no enredo de todo escândalo.

Portanto, embora os jornais continuem repetindo tais declarações, o leitor pode deixá-las em segundo plano, pois tudo, de fato, se relaciona com os fins eleitorais. Até mesmo o que não é dito ou revelado.

Por exemplo, a Folha de S.Paulo apresenta a seus leitores a figura do lobista Guilherme Cunha Costa, funcionário da Camargo Corrêa e porta-voz do presidente da Fiesp em Brasília.

Costa é apontado como influente a ponto de emplacar indicações de ministros no Tribunal de Contas da União.

Para completar o quadro, o jornal acrescenta que pelo menos dois dos ministros do TCU estão sendo investigados.

O direito de espernear

Portanto, menos de vinte e quatro horas depois de anunciadas as prisões, já existem elementos para a imprensa conduzir o noticiário com mais fatos e menos declarações.

O que foi revelado até aqui indica que as contribuições legais de empresas são apenas uma fachada para os acertos que, mais adiante, vão aumentar o custo das obras e serviços públicos.

A imprensa tem em mãos um farto material para seguir em frente.

O resto é o direito de espernear de todos que são apanhados com a boca na botija.

Mania de imitar

Alberto Dines:

– Quando quer, o presidente Lula comporta-se como autêntico observador da imprensa. Na entrevista que ontem concedeu ao lado do primeiro-ministro inglês Gordon Brown, referindo-se à decisão do governo americano de fazer um aporte de um trilhão de dólares para a compra de “ativos tóxicos” o presidente gozou sutilmente os jornalistas brasileiros que, de repente, passaram a designar os velhos “ativos podres” como “ativos tóxicos” só porque esta é a terminologia adotada pela imprensa americana.

Não é a primeira vez que isso acontece. Ao longo de 30 anos nossa imprensa designou como “álcool” o combustível extraído da cana. Quando o presidente Bush veio ao Brasil da primeira vez, em 2005, empregou o termo em inglês, etanol. Imediatamente aposentamos o álcool e o Pró-Álcool e aderimos ao etanol. Talvez para fingir que falamos inglês.

Ativos tóxicos ou ativos podres significam a mesma coisa, o que importa é lembrar que este tipo de saneamento de empresas falidas através do mercado é uma invenção brasileira adotada pela primeira vez pelo Proer, em 1995. É preciso reconhecer porém, que lembrar as proezas do Proer não é de bom-tom.