Ocultando a informação
O governo dos Estados Unidos anunciou que vai aderir às metas de redução na emissão de gases do efeito estufa, acertadas em Copenhague durante a cúpula de dezembro passado.
Qual é o peso relativo dessa informação no noticiário geral que ocupa os jornais desta sexta-feira?
Na opinião da maioria dos editores da imprensa brasileira de assuntos genéricos, praticamente nenhum interesse.
O Globo publica um texto curto na página de Ciência e a Folha de S.Paulo traz uma nota menor ainda em sua seção correspondente.
A informação já estava disponível nos sites de agências noticiosas internacionais na tarde de quinta-feira, por volta das 16 horas, ou seja, houve tempo mais do que suficiente para produzir um material mais consistente e, principalmente, mais de acordo com a relevância do tema.
O texto do Globo, um pouco mais alentado que o da Folha, acrescenta que o governo dos Estados Unidos vai aumentar em US$ 5 bilhões a verba de incentivo às empresas que fabriquem produtos livres de emissões de carbono.
O Globo também é o único dos chamados jornais de circulação nacional a citar a consulta do Centro de Pesquisas Pew, na qual se revela que apenas 28% dos americanos entrevistados consideram o aquecimento global como a prioridade a ser tratada em 2010 pelas autoridades dos Estados Unidos.
Em 2007, ano em que foi amplamente divulgado o resultado de estudos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas demonstrando o efeito de atividades humanas no clima, 38% dos cidadãos americanos afirmavam que essa era a questão que mais os preocupava.
Por mais que se diga que a imprensa tradicional anda perdendo credibilidade, a frequência com que os jornais e emissoras de rádio e televisão abordam determinados assuntos ainda influencia o grau de repercussão que tal assunto terá na sociedade.
O fato de os jornais brasileiros, majoritariamente, não acompanharem as decisões derivadas da reunião de chefes de Estado ocorrida em Copenhague, fala muito a respeito das verdadeiras convicções da imprensa sobre o tema.
Revela que, na verdade, a maioria dos editores apenas se preocupa com a questão climática como evento midiático.
Uma crise importada
Alberto Dines:
– Hugo Chávez está radicalizando, este é o mote que percorre os editoriais dos nossos jornais, as análises dos comentaristas políticos e a blogosfera palpiteira. É fato: o caudilho venezuelano apostou no confronto e agora está colhendo a safra de ressentimentos que plantou ao longo de quase uma década.
Autoritário, desperdiçou alianças, fechou as portas para a formação de blocos democráticos, perdeu fieis companheiros, cada vez mais solitário. Sua obsessiva cruzada anti-mídia trabalha contra os seus próprios interesses porque, ao apertar as roscas da repressão, torna quase impossível lembrar que a conspiração para derrubá-lo em 2002 nasceu num poderoso grupo midiático, hoje convertido em aliado (link para os programas de TV).
Porém, este quadro delirante não deve servir de pretexto para que a corporação midiática brasileira transfira para aqui as tensões do país vizinho. Cada caso é um caso: o furor “bolivariano” contra a imprensa não é uniforme. O casal Kirchner conviveu muito bem – bem demais – com a mesma estrutura midiática que resolveu pulverizar quando percebeu o seu desgaste político.
Forçar semelhanças na base de etiquetas generalistas é um recurso anti-jornalístico, culturalmente reacionário, porque converte o cidadão num escravo das simplificações. A vitória de Sebastián Piñera no Chile não significa o nascimento de uma “nova direita” no continente. O poderoso empresário dificilmente derrubará a sólida estrutura estabelecida ao longo das duas décadas de social-democracia. Nem está interessado nisso.
Chávez não está conseguindo acabar com os últimos resquícios de liberdade de expressão em seu país, o chavismo está desabando como acontece mais cedo ou mais tarde com todos os regimes discricionários Mas estes são dados circunscritos à Venezuela não podem ser extrapolados nem exportados para outros ambientes. Pode parecer provocação.
Também é visivelmente artificial a impressão construída na mídia brasileira de que a administração Obama está sendo um fracasso. O presidente americano está na Casa Branca há cerca de 370 dias, tem no mínimo outros 1460 para completar as mudanças que iniciou. Na ultima terça-feira teve a coragem de afirmar numa entrevista à rede ABC que prefere ser um presidente muito bom de apenas um mandato do que ser um medíocre de dois mandatos. Sua cruzada contra o capitalismo selvagem praticado pelos conglomerados financeiros já o coloca no grupo dos chefes de estado excepcionais.