Onde nasce a corrupção
Para entender a enxurrada de escândalos que atinge o Congresso Nacional, é bastante útil acompanhar as reportagens que vêm sendo publicadas seguidamente sobre irregularidades nas eleições e atividades de vereadores por todo o País.
Nesta quarta-feira, o destaque é dado pelo Estado de S.Paulo, que acompanha os debates entre vereadores da Câmara paulistana e o Ministério Público Federal.
Trata-se de um caso exemplar que revela como, na origem de suas carreiras, os políticos brasileiros definem o tipo de atuação que acaba desandando em castelos, notas frias e distribuição de passagens aéreas em Brasília.
A história é muito educativa: segundo o Ministério Público Federal, nada menos do que 29 vereadores, mais da metada da Câmara Municipal de São Paulo, se beneficiou de doações de uma entidade chamada Associação Imobiliária Brasileira.
Trata-se de uma instituição sem fins lucrativos que, como tal, não poderia ter feito doações desse tipo.
A entidade foi criada por empresas do setor imobiliário para defender seus interesses e funciona como uma espécie de central de lobbies.
A suspeita do Ministério Público é de que tenha sido usada pelo Secovi, o sindicado da indústria de habitação, para driblar a legislação eleitoral, que proíbe organizações sindicais de envolvimento com a política partidária.
Constatada a irregularidade, a Associação Imobiliária Brasileira assinou um termo de ajustamento de conduta, comprometendo-se a nunca mais fazer doações a candidatos e partidos.
Mas a investigação continua e revela que na Câmara paulistana foram injetados mais de 3 milhões de reais, que ajudaram a eleger a maioria dos vereadores.
Conclusão: a maior bancada de vereadores de São Paulo não pertence à oposição, nem ao grupo que apóia o prefeito.
Trata-se da alegre e bem nutrida bancada do setor imobiliário.
Eles não representam os eleitores.
Por isso estão se lixando para a opinião pública.
Os senhores da mídia
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Duas organizações dedicadas à luta pela democratização das comunicações no Brasil – a Artigo 19 e o Intervozes – protocolaram no Ministério Público Federal, semana passada, uma representação arguindo a constitucionalidade da concessão de outorgas de radiodifusão a parlamentares (ver “Organizações vão ao MP contra concessões”). O Instituto Projor, mantenedor deste Observatório da Imprensa, tomou iniciativa semelhante em outubro de 2005, quando também recorreu ao Ministério Público Federal para propor medidas judiciais contra dois procedimentos, a seu julgamento, condenáveis: um, o controle da propriedade de empresas concessionárias de rádio e TV por deputados e senadores; outro, a presença desses concessionários-parlamentares nas comissões do Legislativo que têm a incumbência de tratar da renovação e homologação dessas mesmas concessões (ver ‘Concessionários de radiodifusão no Congresso Nacional: legalidade e impedimento’).
Trata-se de um descalabro, entre tantos, há muito tolerado pelo Congresso Nacional. Um levantamento do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília sobre a participação de parlamentares-concessionários nessas comissões estratégicas mostra o tamanho do enrosco: na atual legislatura, 37% dos titulares da comissão da Câmara e 47% dos titulares da comissão no Senado são controladores de empresas de radiodifusão ou têm parentes que o são (ver aqui). Conflito de interesses maior do que este, impossível.
O artigo 54 da Constituição veda aos parlamentares manter contrato ou aceitar cargo ou função em empresa concessionária de serviço público, como é o caso da radiodifusão. O Ministério das Comunicações, a quem cabe a fiscalização das outorgas, faz vista grossa e defende uma posição favorável a esta situação. Em suma: por enquanto, não há risco de melhorar.