Tragédia para todos
Praticamente todos os meios de comunicação brasileiros se dedicaram, em alguma medida, a cobrir a tragédia provocada pelas chuvas no Rio de Janeiro.
Emissoras de rádio e televisão passaram toda a tarde de segunda-feira e o dia inteiro da terça informando quase ininterruptamente sobre os casos de deslizamentos e enchentes que se sucediam.
Os efeitos do temporal invadiram também a internet, e as redes sociais logo se integraram na ampla malha de informações e comentários de todos os tipos.
Não faltaram os insensatos de sempre, que aproveitaram o acontecimento para fazer humor de mau gosto e misturar a tragédia com a política.
Na manhã desta quarta-feira, outra observação: a imprensa de papel já não consegue se aproximar da dinâmica dos fatos.
Ainda assim, os profissionais destacados para pisar na lama e molhar as pernas extrapolam suas possibilidades.
A despeito da grande qualidade técnica e jornalística das fotografias, não há como competir com imagens em movimento, feitas ao vivo no fragor dos acontecimentos, e que podem ser arquivadas e revistas a qualquer instante.
Mesmo com essas desvantagens, os fotógrafos dos principais jornais brasileiros conseguem apresentar a seus leitores, nas edições de papel, registros dramáticos do sofrimento que se abateu sobre o Rio de Janeiro.
Segundo as contagens mais atualizadas que chegaram às redações, são 103 mortos, mais de 1700 pessoas estão fora de suas casas, sendo que grande parte delas não terá casa para voltar.
Não foi a maior tragédia do tipo a atingir a antiga capital federal: em 1966, segundo registram os jornais, houve 250 mortes e 50 mil ficaram desabrigados após 24 horas de chuva.
Em 1988, 15 dias de chuvas fortes e contínuas deixaram 570 mortos.
Mas a tragédia do século XXI é mostrada ao vivo, através de câmaras digitais que logo inserem as imagens na internet, e os dramas de cada um se transportam para toda a população.
O risco é o de que o excesso de imagens produza a banalização da tragédia.
E que a ocupação de áreas de risco recomece na primeira estiagem.
Quem tem medo do debate?
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Os feriados de Páscoa e as fortes chuvas no Rio deixaram para trás um assunto que voltou a ferver na semana passada. Outra vez, mais uma vez, a polêmica em torno da terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, anunciado em dezembro passado e mal digerido pela mídia nos meses seguintes.
A pendenga avivou-se em meados de março, numa reunião ocorrida na Federação do Comércio, em São Paulo, com a presença de dirigentes de entidades empresariais da indústria da comunicação, quando o programa apanhou sem dó nem piedade de todos os palestrantes. Foi ali que a presidente da Associação Nacional de Jornais, Judith Brito, afirmou que os meios de comunicação no Brasil “estão fazendo, de fato, a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada”.
A frase infeliz repercutiu a torto e a direito e recebeu tradução livre do ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, que na terça-feira da semana passada afirmou, segundo a Folha de S.Paulo, que a presidente da ANJ “fala exatamente o que eu vinha dizendo como crítica. (…) `Na situação atual, em que os partidos de oposição estão muito fracos, cabe a nós dos jornais exercer o papel dos partidos´”.
No mesmo dia a dirigente patronal rebateu o ministro, sublinhando que é papel da ANJ “defender a liberdade de expressão, frente às seguidas tentativas do governo de criar regras para controlar os veículos de imprensa e os jornalistas”. E deu como exemplos o projeto do Conselho Nacional de Jornalismo, as recomendações da Conferência Nacional de Comunicação e os pontos polêmicos do próprio Programa Nacional de Direitos Humanos.
Visto de longe, parece que estamos no limiar de atos institucionais ou da promulgação de decretos-lei. Visto de perto, são todas medidas – por mais polêmicas que sejam – que dependem de discussão e aprovação pelo Congresso Nacional. Quem, afinal de contas, tem medo desse debate?