Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>As boas-vindas ao ministro
>>Os riscos ambientais

As boas-vindas ao ministro

A imprensa recebeu bem o novo ministro do Meio Ambiente.

Recebeu tão bem, que deixa desconfiados os defensores do meio ambiente.

Os jornais elogiam Carlos Minc por ter concedido mais de duas mil licenças ambientais em dezessete meses, quando foi o secretário do Meio Ambiente do Estado do Rio.

Uma dessas licenças, de alta complexidade, se referia à construção de um projeto petroquímico que será erguido numa área de 47 milhões de metros quadrados.

Representantes do movimento ambientalista desconfiam de tanta agilidade.

Representantes do desenvolvimentismo elogiam tamanha agilidade.

E, afinal, foi essa agilidade que lhe garantiu o convite para ser ministro.

É inevitável comparar Carlos Minc com sua antecessora, Marina Silva.

Minc sempre foi um desses ecologistas ruidosos, sempre presentes em manifestações na orla do Rio.

Como secretário do Meio Ambiente, gostava de participar de ações espalhafatosas, com potencial para criar factóides na imprensa.

O Globo rememora na edição de hoje algumas dessas ações, mostrando o então secretário ajudando pessoalmente a retirar lixo do rio Irajá e laçando porcos que eram criados às margens da Lagoa da Tijuca.

Marina Silva sempre agiu de forma mais discreta.

Participou, ainda muito jovem, das lutas do líder seringueiro Chico Mendes, foi contaminada com mercúrio ao combater garimpos ilegais e conquistou reputação internacional como estudiosa da questão ambiental.

Os jornais de hoje destacam, em unanimidade, a primeira polêmica do novo ministro: ele declarou que, se deixarem, o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, planta soja até nos Andes.

O governador não gostou da declaração.

Ele é um dos maiores plantadores de soja do mundo e seu Estado é o recordista histórico do desmatamento da Amazônia, como observa a Folha de S.Paulo.

A imprensa já percebe que, com Minc no Ministério, não vão faltar notícias.

Sabe também que as licenças ambientais vão sair muito mais depressa.

Mas precisa atentar para os riscos que um ministro ruidoso e festivo pode provocar num tema complexo e essencial para o desenvolvimento do País.

Os riscos ambientais

Um dos primeiros desafios do novo ministro do Meio Ambiente é um projeto do senador Flexa Ribeiro, do PSDB do Pará, que reduz a exigência de manutenção da floresta nativa em fazendas instaladas na Amazônia.

Atualmente, a legislação obriga os fazendeiros a manter florestas com espécies nativas em 80% de suas propriedades.

O projeto permite que, desse total, 30% sejam preenchidos com espécies exóticas, o que abriria espaço, por exemplo, para o eucalipto, considerado altamente danoso para os ambientes amazônicos.

Esse projeto é conhecido pelos ambientalistas como ‘Projeto Floresta Zero’ e era desaprovado pela ex-ministra Marina Silva, que recomendaria o veto do presidente Lula caso viesse a ser aprovado.

A posição de Carlos Minc sobre o tema será considerada, segundo o Globo, como a encruzilhada para a avaliação do novo ministro.

Medidas como essa, que tramitam aceleradamente no Congresso Nacional com a força de tração da bancada ruralista, representam o campo principal de batalha que travava Marina Silva no governo.

A ação dos órgãos oficiais e da Polícia Federal contra desmatadores e garimpeiros ilegais sempre foi o tema predileto da imprensa na questão ambiental, mas o tema mais importante é a permanente tentativa dos produtores rurais de ‘flexibilizar’, como eles gostam de dizer, as restrições para a atividade agropecuária na Amazônia.

Se a imprensa nacional prefere os embates porque geram notícias com mais ação, a imprensa internacional costuma ser mais atenta aos sinais que apontam o quanto o governo brasileiro estaria determinado a manter uma estratégia sustentável para o nosso patrimônio ambiental.

Os jornais brasileiros citam hoje editoriais e reportagens da imprensa internacional, entre os quais se destaca o texto do jornal britânico The Independent, no qual se afirma que a Amazônia ‘é importante demais para ser deixada aos brasileiros’.

A imprensa daqui e do exterior destaca que a saída da ministra Marina Silva acendeu um sinal de alerta em entidades européias que concedem o chamado ‘selo verde’ para produtos de exportação.

Os jornais afirmam claramente que, se o Brasil não comprovar que cuida de temas como defesa ambiental, combate ao trabalho escravo e condições de higiene satisfatória, poderá perder espaço em mercados importantes como o da carne e o da soja.

A questão ambiental envolve interesses estratégicos do Brasil e exige muito mais do que manifestações festivas na orla de Ipanema.

A produção agrícola é importante demais para ser deixada só nas mãos dos fazendeiros.

A imprensa deve levar isso em conta ao acompanhar os passos do novo ministro.