Cardápio variado
Os jornais e revistas do final de semana apresentaram a seus leitores um cardápio diversificado e consistente, passando da questão ambiental às relações internacionais, com grandes espaços para a disputa eleitoral deste ano.
Sem a presença de Aécio Neves, que prefere consolidar sua liderança em Minas Gerais a aventurar-se como candidato a vice-presidente na chapa de José Serra, a campanha obriga a imprensa a sair da rotina.
Com a falta de novidades na disputa, os jornalistas são obrigados a sair das redações para não ficarem disputando declarações de políticos, quase sempre construídas palavra por palavra por seus assessores de marketing.
Bom sinal: a Folha de S.Paulo foi analisar a questão do voto obrigatório e constatou que cresce o apoio ao sistema de voto facultativo.
A maioria dos entrevistados, 55%, afirma que continuaria votando mesmo se o voto não fosse obrigatório.
O Estadão colocou seus repórteres na estrada e, 12.980 quilômetros depois, traça um perfil interessante sobre como se forma o voto na mente do eleitor brasileiro.
O caderno especial publicado domingo traz o retrato de um país mais otimista, mais consciente de sua cidadania.
Uma constatação interessante trazida pelo jornal: o brasileiro vota com os olhos no futuro.
A questão ambiental entra nos jornais junto com o trágico vazamento de óleo no litoral dos Estados Unidos, aparece ainda em nova entrevista com o senador comunista que quer amenizar a legislação de proteção ambiental no Brasil e acaba trazendo à luz um problema criado pelo grande crescimento econômico do País: segundo a Folha de S. Paulo, a coleta seletiva de lixo diminui na capital paulista.
Parte do problema, segundo o jornal, é o fato de que falta mão de obra para essa tarefa, agora que a economia brasileira reduz o desemprego a níveis surpreendentes até para a imprensa.
O que os jornais e revistas ainda não conseguiram foi esclarecer o leitor sobre o verdadeiro papel protagonizado pelo Brasil na questão iraniana.
A fartura de artigos oferecidos aos leitores não veio acompanhada de edições cuidadosas. Lobistas de todo tipo ganharam espaço e destaque, análises de publicações comprometidas com este ou aquele lado foram reproduzidas sem que o leitor fosse alertado sobre os interesses específicos em jogo, e a semana terminou sem maiores esclarecimentos sobre aquele que pode ter sido um episódio histórico nas mudanças que marcam este início de século.
Detalhes que faltam
Alberto Dines:
– A Turquia já ocupou as manchetes internacionais inúmeras vezes e por inúmeras razões. Nem sempre as melhores. Sua imagem melhorou quando apostou na parceria com o Brasil para obter o acordo nuclear com o Irã. Nossa mídia fala com muita naturalidade do premiê turco Recyp Erdogan. Mas nossa mídia não fala nem lembra que Erdogan não suporta o Nobel de Literatura, Orhan Pamuk, rigoroso crítico da re-islamização do país promovida por Erdogan.
O Brasil empenhou-se no acordo nuclear porque está comprometido com a solução pacífica das controvérsias a partir do preâmbulo da sua Constituição. Mas o Brasil também está comprometido com a defesa dos direitos humanos.
A Turquia, porém, não ostenta os mesmos atributos pacifistas do Brasil, pois até hoje não devolveu aos gregos o pedaço de Chipre que lhes tirou em 1974 e em matéria de direitos humanos tem uma ficha ainda pior porque mantém como cidadãos de segunda categoria a minoria de 20 milhões de curdos.
O líder Abdullah Öcalan, considerado o Nelson Mandela dos curdos, está preso incomunicável numa ilha desde 1999. A tragédia dos curdos chega à Síria, Iraque e Irã mas o único país onde gozam de total liberdade e enorme autonomia é o Iraque pós-Saddam. Erdogan e Ahmadinejad têm, portanto, outras razões para se aproximarem além do enriquecimento do urânio. Este mosaico sutil não alcança nossa imprensa. Nem este nem os outros. A contextualização das informações ainda não foi contemplada pelas reformas e mudanças dos nossos jornais.