Síndrome de abstinência
A imprensa brasileira não consegue viver sem o personagem Luiz Inácio Lula da Silva.
Desde que deixou a Presidência da República, Lula foi seguido diariamente em suas férias, durante todo o mês de janeiro, como uma dessas celebridades do mundo dos espetáculos.
Chegou fevereiro, e após uns dias sem notícias, o ex-presidente reaparece nesta terça-feira nas primeiras páginas, como um dos participantes do 11o. Forum Social Mundial que ocorre em Dacar, no Senegal.
O Estado de S.Paulo até contou o tempo de ausência: foram 37 dias sem manifestações de Lula sobre a política brasileira. Abordado em Dacar, criticou as centrais sindicais por descumprirem o acordo feito com ele sobre o processo de reajuste do salário mínimo.
Lula é um mestre intuitivo em comunicação.
Sabe como ninguém o que dizer e como se expressar para ganhar as atenções.
E a imprensa brasileira, que há anos vem perdendo o hábito de produzir reportagens, necessita vitalmente de declarações para cumprir suas pautas.
Então fica assim: Lula fala, os jornais se regozijam.
A presença de Lula no Forum Social Mundial foi notícia também na imprensa internacional, que destacou suas manifestações sobre a crise do capitalismo e sua proposta para o desenvolvimento da agricultura na África.
A coluna “Toda mídia”, da Folha de S.Paulo, faz repercussão de reportagem do New York Times, que chama o ex-presidente brasileiro de “ícone dos oprimidos”.
Com exceção do Estadão, que também descreve as reações da platéia ao discurso que proferiu Lula no Senegal, o principal destaque na imprensa nacional vai para a questão interna do salário mínimo
Claro que a vida após o poder é assunto interessante e todos os ex-presidentes tiveram um ou outro aspecto de suas vidas civis exposto nos jornais após o período no governo.
Mas nenhum deles provocou tamanha obsessão.
Enquanto presidente, os jornais preferiam falar de sua figura e reproduzir suas declarações do que noticiar os atos de seu governo.
O retrato que foi pintado dele não corresponde aos níveis de popularidade que alcançou entre os brasileiros e que também se manifestam no exterior.
Com Lula fora do poder, alguns editores e colunistas de política devem ser atacados por tremores nas mãos, todas as manhãs.
Parce que sofrem de síndrome de abstinência.
Observatório na TV
A ânsia pelo imediatismo, o avanço do jornalismo online, o alto custo do jornalismo de qualidade e a falta de jornalistas experientes nas redações são alguns dos desafios comuns a toda imprensa mundial.
Esses foram também alguns dos temas tratados por Alberto Dines na conversa com Milagros Pérez Oliva, defensora – ou Ombudsman – do jornal espanhol El País.
O resultado dessa entrevista compõe o programa inédito do Observatório da Imprensa na TV, que vai ao ar nesta terça-feira.
No segundo programa da série de três realizada em Madri, Dines e Milagros Pérez discutem como fazer um jornal de qualidade e que satisfaça a seu público final: o leitor.
A defensora do principal jornal espanhol, considerado um dos melhores do mundo, fala das dificuldades de interpretar e passar para a redação os anseios dos leitores.
Além disso, ela também é responsável por criticar cada edição do jornal, seguindo o que deve ser o interesse do público.
Com admirável poder de análise, Milagros Pérez conversou com Alberto Dines sobre outros temas que afligem o jornalismo contemporâneo, como a concorrência diluida nos meios online, os custos de uma redação qualificada e a independência editorial.
Os dilemas de El País também se manifestam, com igual intensidade, na imprensa brasileira.
No momento em que as empresas de comunicação buscam saídas para um futuro ainda incerto, e quando os debates sobre a regulação da mídia entram em fase de definição, a entrevista de Milagros Pérez pode acrescentar alguns pontos ao debate.
O Observatório da Imprensa vai ao ar nesta terça, a partir das dez da noite, na TV-Brasil, em rede nacional.
Em São Paulo, pelo canal 4 da Net e 181 da TVA.