Notícia envelhecida
A solução mágica encontrada pelo governo americano para salvar as instituições financeiras sob risco já não é unanimidade nos jornais.
Depois de saudar o anúncio de que o Tesouro iria depositar 700 bilhões de dólares no colo dos especuladores, a imprensa começa a olhar a possibilidade de saídas menos controversas.
Uma delas seria deixar ao próprio mercado o ônus da crise, o que abriria espaço para a responsabilização de alguns dos especuladores que passaram dos limites.
Uma das conseqüências da freada na precipitada solução imaginada pelo governo Bush foi a decisão, praticamente certa, de suspender o pagamento de bônus para os executivos das instituições financeiras responsáveis pela crise.
Outro fato a se registrar é que o FBI, a polícia federal americana, está investigando a possibilidade de ter havido fraudes na avaliação de hipotecas.
Alguns dos executivos que receberam bônus bilionários ao produzir resultados recordes em suas empresas estão entre os suspeitos.
O Estadão foi o único dos grandes jornais a tratar das conseqüências da crise financeira sobre outras questões que preocupam a sociedade, como o problema do aquecimento global.
Em reportagem na seção de meio ambiente, o jornal paulista informa que a crise deve prejudicar a adoção de novas regras que estavam sendo preparadas para a redução das emissões de gás carbônico pelas indústrias da Europa, em 20% até 2020.
O cuidado do jornal mostra certa evolução na abordagem da questão ambiental, mas o fato de a notícia ser publicada longe do caderno sobre a crise mostra que os editores ainda tratam o tema fora do contexto geral da economia.
Com o novo cenário, muito do que foi publicado nos últimos dias precisa ser revisado.
A edição atual da revista Veja, que anuncia as medidas do governo Bush como a salvação dos sistema financeiro internacional, não chegou ao meio da semana: virou notícia velha. Pior: equivocada do começo ao fim.
O episódio serve como exemplo de como a falta de reflexão nas escolhas editoriais pode comprometer o serviço prestado ao leitor, e também indica que a pressa na formulação de opiniões misturadas ao noticiário pode induzir a erros de interpretação.
A edição de Veja virou revista velha antes da hora.
Batendo na imprensa
O presidente da República puxou a orelha da Folha de S.Paulo por causa da notícia sobre o uso do Fundo de Garantia no financiamento da Petrobrás.
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– O presidente Lula desferiu anteontem, em Nova York, mais uma canelada na imprensa brasileira por conta da manchete da Folha de S.Paulo de domingo (21/9), que cravou que o governo reabriria as compras de ações da Petrobras com recursos do FGTS, como forma de ajudar no financiamento da exploração do pré-sal.
O presidente disse o seguinte: “Eu acho abominável alguém fazer uma manchete irresponsável daquele jeito sem nunca ter conversado comigo […]. Eu acho irresponsável porque isso mexe com o mercado, mexe com ações, por uma coisa que eu nunca falei”.
Num ponto o presidente tem razão: o enunciado da manchete – ‘Lula reabre compras de Petrobras com FGTS’ – atribui diretamente a ele, presidente, a decisão. Daí a sua cobrança com base no ‘sem nunca ter conversado comigo’. Mas a informação apurada pela Folha foi confirmada por um ministro do seu governo – Carlos Lupi, do Trabalho – para o jornal Valor Econômico; e também confirmou, para o início de outubro, uma reunião para decidir o desenho da operação.
A pedido de Lula, o ministro da Fazenda Guido Mantega desmentiu seu colega do Trabalho. Carlos Lupi ficou na encolha, mas seu fiel escudeiro, o deputado Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical, saiu em defesa da idéia e criticou Mantega.
E por que, nesse episódio, o presidente Lula não repreendeu publicamente o ministro do Trabalho? Porque a esta altura do campeonato é muito mais confortável bater na imprensa – e a arquibancada gosta.