Relato histórico sobre corrupção
Nem Lula, nem o programa do PT, nem Fernando Henrique Cardoso. Quem colocou a questão da corrupção no tom certo ontem foi o ex-governador Orestes Quércia, sabatinado na Folha de S. Paulo. Ele disse que praticou caixa dois em todas as eleições de que participou. A primeira foi antes do golpe de 1964. A ditadura se apresentou como “redentora” e só piorou as coisas, porque gradualmente impôs a censura à imprensa e deixou poucas brechas para denúncias. Na redemocratização, quem não tinha participado da festa teve sua oportunidade. Com as honrosas exceções de sempre.
Quércia deu uma sintética e preciosa aula de História na primeira pessoa. [*]
Democratização necessária
O editor do Observatório da Imprensa Online, Luiz Egypto, defende aspectos de documento preliminar do PT sobre democratização das comunicações.
Egypto:
– A revelação feita anteontem pela Folha de S. Paulo, sobre as propostas de democratização das comunicações contidas num esboço de programa de governo do PT, merece nossa atenção muito embora ainda se trate de um documento preliminar.
No Brasil são impressionantes os exemplos da concentração de controle sobre veículos de informação. Além do mais, não há regulação alguma face a propriedade cruzada de meios de comunicação. O resultado é que o direito à informação democrática não é exercido pelo conjunto da cidadania, em razão da inexistência de normas que assegurem a comunicação plural e diversificada.
Regulação e regulamentação neste caso nada têm a ver com censura ou controle estatal sobre a informação. Têm a ver, isto sim, com o fortalecimento da organização social, pois a informação não se resume a um direito individual, mas sim a um poder social real. Por isso não há como prescindir de políticas públicas para a comunicação, desde que socialmente legitimadas. Este é o debate da hora.
Ameaças à imprensa
Rosângela Bittar, chefe da redação do jornal Valor em Brasília, preocupa-se hoje em sua coluna com o teor das propostas relativas à mídia contidas no documento preliminar do PT. Ela as relaciona a uma entrevista concedida ao Washington Post de domingo passado (27/8) por um assessor do presidente Lula, Giancarlo Summa. Segundo Summa, Lula teve tanto sucesso nas áreas econômica e social que pode prescindir dos canais tradicionais de obtenção de consenso político. Entre esses canais o assessor cita a mídia impressa, com a qual Lula estaria insatisfeito por ter ela, na visão do presidente, publicado ataques injustos contra ele e mostrado preconceito.
A coluna de Rosângela termina com uma reflexão serena do professor Octaciano Nogueira, de Brasília. Ele diz que é difícil ocorrer instabilidade institucional porque a população está mobilizada e a imprensa, atenta.
Lula, o PT e adjacências, em vez de ameaçar e tentar criar novos constrangimentos, deveriam agradecer o tanto de independência que existe na mídia brasileira. A mídia tem muitos defeitos, incessantemente apontados neste Observatório da Imprensa há mais de dez anos. Mas sem ela pode-se imaginar até onde teria chegado a corrupção num governo Lula de mãos dadas, em alegre passeio pelo pântano, com aliados do calibre de Roberto Jefferson. Sem imprensa crítica, Lula será, caso reeleito, mais tributário de aliados como José Sarney, Renan Calheiros, Newton Cardoso ou Jáder Barbalho.
Jornalismo com torcida
O ônibus do Jornal Nacional, embora aborde em estilo televisivo problemas sérios, gasta parte do seu tempo com a exibição de patéticas torcidas organizadas, como anteontem em Petrolina e ontem em Juazeiro do Norte. Difícil classificar o espetáculo como jornalismo. Não é só o presidente Lula que busca canais especiais com as massas.
Jornalismo para aprofundar
O Globo anuncia para o próximo sábado um caderno especial sobre segurança pública. Se mantiver o padrão dos dois anteriores, que abordaram educação e programas de assistência social, prestará mais uma vez bom serviço.
PCC subestimado
Entre os jornais mais importantes de São Paulo, só o Estadão dá hoje destaque a novos ataques do PCC. A Polícia detectou um comunicado distribuído por presos no domingo passado. A Folha nem noticia atentados ocorridos ontem em várias cidades. É muito forte a tentação de varrer a realidade para debaixo do tapete.
[*] O leitor José de Souza Castro forneceu (comentário enviado em 28/8) informações interessantes sobre outro ex-governador, Newton Cardoso, política e fortuna:
‘A fortuna de Newton Cardoso foi criada em dois momentos principais: quando ele foi prefeito de Contagem por dois mandatos, nas décadas de 70 e 90, e quando foi governador de Minas entre 1987 e 1990. O atual candidato ao senado pelo PMDB mineiro apoiado por Lula começou a ficar rico quando se elegeu prefeito de Contagem pelo MDB e se tornou nacionalmente conhecido, em 1975, quando tentou fechar a fábrica de cimentos Itaú, para cortar uma das fontes de poluição do município, sendo impedido por Geisel. Em 1977, depois de deixar o cargo, Newton foi nomeado presidente da Cuco, uma empresa urbanizadora municipal criada por ele para vender terrenos industriais. Ele enviou declaração de bens à Câmara Municipal. Tinha 306 hectares de terras. Em 1986, quando se elegeu governador, já era dono de 9.024 hectares. Três anos depois, em junho de 1989, o jornal Estado de Minas, que lhe fazia oposição, publicou uma série de reportagens vencedora do Prêmio Esso regional mostrando a evolução da fortuna do governador. Ele já possuía 25 mil hectares de terras, entre outros bens e empresas. Só as terras eram avaliadas pelo jornal em 30 milhões de dólares. A revista Veja desta semana avalia as fazendas em R$ 17 milhões. Na declaração de bens apresentada ao TRE, o candidato ao senado as avalia em R$ 60 mil. ‘O nebuloso Newtão’ é o título da reportagem. A Veja foi até modesta…‘
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