Na edição de domingo (9/4), considerada o pudim do jornalismo, O Liberal, o periódico de maior circulação do Pará, premiou seus leitores com duas pérolas. A luta pela terra é o enfoque central.
A primeira, com espaço generoso, é dedicada à uma entrevista com o fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, vulgo ‘Taradão’, acusado pela encomenda do assassinato da missionária americana Dorothy Stang, em fevereiro do ano passado. O fazendeiro é apontado como integrante de um consórcio especializado na organização de execuções de seus adversários, com destaque para dirigentes da luta pela reforma agrária, na região de Altamira, oeste do Pará. Região marcada pela acirrada disputa pela terra e seus recursos naturais, em particular, o mogno.
Na entrevista, o pecuarista se empenha em desqualificar todas as acusações que pesam sobre ele. Nega vínculos comerciais ou de amizade com os demais envolvidos na morte da missionária. Jura de pé junto fé em Deus, na Justiça em todas as esferas. Confessa que crê na imparcialidade da imprensa, e, queixa-se que teve a vida destruída e a família humilhada.
Já a segunda, com menor espaço, tem o MST como ameixa do bolo. Seguindo a linha dos considerados jornalões, o diapasão do periódico paraoara, apregoa a criminalização do movimento. A ação do movimento é tratada como ‘ira’ e ‘fúria’. A mesma argumenta como equivocada a ação do MST contra as decisões da Justiça do Pará, e pondera ser uma ofensa ao Estado, a organização de ocupações das áreas reintegradas. Por fim, advoga que o alvo reside em Brasília.
O raciocínio, segue a mesma linha do discurso do governo local, regido pelo PSDB. O mesmo responsável pela ordem do massacre de Eldorado dos Carajás.
Lei de Ricupero
Lembremos que o sudeste do Pará, região reiteradamente tratada como o barril de pólvora da reforma agrária, passa por ação de reintegração de posse de 10 áreas. A tese de divisão do movimento, tem com âncora, a recusa de algumas pessoas em retornarem às áreas alvos do arrastão da PM.
Cumpre recordar ainda que se deparar com um efetivo de choque, armado com armas de grosso calibre, cães, cavalaria, helicóptero, não é nada animador a quem deseja apenas cultivar a terra. Não seria mais que prudente que pessoas recuem ante tal aparato? E mesmo o massacre midiático, onde o sem-terra ecoa com conotação pejorativa, não tenderia a desanimar o ânimo de uns militantes?
Lembremos ainda que as referidas matérias são publicadas numa edição dominical, próximo do aniversário da primeira década de impunidade dos responsáveis pelo massacre de Eldorado dos Carajás.
Na matéria sobre as reintegrações de posse não se fala de trabalho de escravo e crimes ambientais como os registrados em várias fazendas. Estranho? Então, ocorre interrogar, não interesse pautar como vivem as viúvas e órfãos dos infinitos massacres, como vivem os seqüelados, entrevistar o representante do Judiciário, ou mesmo os defensores dos direitos humanos?
Uma interrogação a mais: o que teria motivado a retirada da cena do massacre, exibida na abertura do telejornal da TV Liberal, do grupo de comunicação que se arvora como o maior do Norte/Nordeste?
Sob o slogan ‘Você lê. Você confia’ o periódico paraora, que por excelência tem o maior número de leitores na capital, foi flagrado pelo Instituto de Verificação de Circulação (IVC), responsável pela aferição da edição dos jornais, com um superdimensionamento em 129% de sua circulação paga. Até o instante o silêncio tem sido a ordem na casa. O que muito lembra a Lei de Ricupero: o que é bom a gente mostra, que nos constrange a gente silencia.
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Colaborador da Rede Fórum Carajás