Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Estado de S. Paulo


‘Dizia-se ontem neste espaço, a propósito da mais do que presumível intenção do presidente Lula de manter o seu ministro da Fazenda, mas não a política econômica – ‘Palocci sem o paloccismo’ -, que faltava combinar com ele. E que o cenho franzido do ministro numa solenidade palaciana, segunda-feira, ‘proclamava eloqüentemente o fracasso da esperteza do chefe’. Na tarde seguinte, reconhecendo o fracasso e dando razão a todos quantos dizem que ele pode ser qualquer coisa, menos parvo e menos ainda suicida, Lula jogou publicamente a toalha. ‘Ele está mais firme do que nunca’, respondeu aos jornalistas que, ao final de outro evento, dessa vez em Goiás, queriam saber do futuro do ministro – o qual, horas antes, afirmara numa comissão da Câmara dos Deputados que só o presidente poderia dizer se ele permaneceria no cargo.


Àquela altura, porém, um e outro sabiam que o jogo estava feito, e o que parecia impossível tinha acontecido. Não apenas Palocci ficaria, como ficou mantida a política econômica que, na sua primeira ida ao Congresso, a uma comissão do Senado, uma semana antes, ele dissera ser a única que teria força para cumprir. ‘Não outra’, sublinhou, apostando todo o seu cacife, o que a muitos soou como uma temeridade. Palocci pagou para ver – e acabou levando as fichas em disputa, menos as que simbolizam uma concessão nominal aos seus adversários, notadamente a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Pelo que vazou do acordo entre ele e o presidente, ao cabo de uma tensa conversa na noite daquela segunda, o superávit primário do governo deverá cair do recorde de 6,1% do PIB registrado em outubro, mas não a ponto de voltar à meta nominal de 4,25%.


Decidiu-se fechar o ano poupando entre 4,6% e 4,7% do PIB para pagar os juros da dívida, o mesmo resultado de 2004. De todo modo, esses números não dão conta do essencial. E o essencial é que Palocci – desmentindo a suspeita de que o seu apego ao poder seria tanto que aceitaria, afinal, gerir a política que Lula fizera questão de definir como sendo, não do ministro, mas do governo – manteve intactos os fundamentos e os objetivos da orientação inextricavelmente associada ao seu nome. E essa, ‘não outra’, é o caso de parafrasear, foi a condição que apresentou para ficar. O seu triunfo foi nada menos do que fantástico, embora isso não signifique que tenha sido um jogo de soma zero, em que ao êxito de um corresponde o fracasso do outro. Ao ceder a Palocci, também Lula saiu ganhando – e decerto foi por antever isso que ele desistiu de fritá-lo, como tudo indicava que vinha fazendo.


As últimas dúvidas que o presidente pudesse ter sobre a conveniência política de conservar o companheiro no time ele próprio se incumbiu de pulverizar, com um desempenho digno de aplausos em cena aberta na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara – de onde, assim como acontecera quando de seu depoimento à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, saiu melhor do que entrou, apesar do que talvez tenha deixado de dizer sobre os seus tempos de prefeito de Ribeirão Preto. Combinando elegância na forma com unhas e dentes no conteúdo, sustentou de modo cabal, sem um único escorregão, o imperativo de garantir a estabilidade das finanças públicas, defendendo tudo que a ministra Dilma condenara na entrevista a este jornal, há duas semanas, desencadeando o confronto aberto entre ambos.


‘Vamos deixar para os nossos filhos e netos uma dívida de 50% do PIB?’, provocou, em dado momento. O respeito quase reverencial com que foi ouvido, salvo por um ou outro parlamentar cabeça-quente, numa casa do Congresso que não costuma tratar os seus interrogados com punhos de renda, há de ter aberto os olhos de Lula, se é disso que se tratava, para o que representa contar com um ministro da sua estatura e credibilidade. Nenhum outro conseguiu nem conseguirá ser o arrimo sem o qual o governo não pode passar, fustigado por uma crise política que caminha para o seu sétimo mês e que não cessa de derrubar os índices de popularidade do presidente. (Pela pesquisa divulgada ontem, já são 44% os brasileiros que o reprovam, 43% os que acham que ele tem parte com a corrupção e 47% os que não pretendem votar nele de forma alguma.)


E embora 53% considerem a política econômica ‘inadequada’, a economia, sob a batuta de Palocci, poderá ser a paradoxal tábua de salvação de Lula – o contrapeso ao fator corrupção.’



Folha de S. Paulo


‘Ministro Básico’, Editorial, copyright Folha de S. Paulo, 24/11/05


‘Depois de seu bom desempenho na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, deu nova demonstração de habilidade diplomática, equilíbrio e paciência em seu depoimento à Comissão de Finanças da Câmara. O ministro precisará ainda comparecer à CPI dos Bingos, mas diante de sua eficaz oratória e das simpatias que desperta entre oposicionistas, são grandes as chances de que se saia bem.


Embora sua permanência no cargo não estivesse diretamente condicionada às sabatinas do Senado e da Câmara, o saldo foi bastante positivo e contribuiu para reforçar a posição de Palocci. Ontem, após dias de ambigüidades e ‘fritura’ pública, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece ter se decidido a encerrar o ‘ataque especulativo’ ao titular da Fazenda, que partiu da Casa Civil. Depois de conversas e negociações em torno da meta de superávit primário, Lula assegurou que o ministro fica.


Menos mal. Não que a política econômica do governo possa ser considerada brilhante. Palocci, na realidade, comporta-se como uma espécie de neófito que trocou o dogma marxista pelo mercadista -segue o livro e nada mais. É óbvio que há um ‘nó’ a ser desfeito na equação juros, câmbio e metas de inflação e que a política monetária do Banco Central tem onerado o esforço fiscal e levado a equipe econômica a ‘enxugar gelo’ na tentativa de reduzir a relação entre a dívida pública e o PIB.


Isso dito pela ministra Dilma Rousseff torna-se certamente menos palatável do que na voz do secretário do Tesouro, Joaquim Levy, cujas divergências com a atuação do BC são igualmente conhecidas. A diferença é que Levy já deu mostras de ser um aplicado e rígido defensor da responsabilidade fiscal, enquanto a ministra assusta os mercados ao vocalizar, de maneira inoportuna, o interesse de setores do PT e do governo de dispor de mais recursos para gastos públicos no ano eleitoral.


No atual cenário, o mais sensato é assegurar o básico -e o básico chama-se Antonio Palocci.’



CONCESSÕES ILEGAIS


Andrea Vianna


‘De antena ligada’, copyright Congresso em Foco (http://www.congressoemfoco.com.br/), 24/11/05


‘Documento em poder da Procuradoria Geral da República (PGR) põe em xeque uma prática comum entre os parlamentares, ainda que proibida pela Constituição: a exploração de concessões de rádio e televisão por parte de deputados e senadores. Pela primeira vez, os congressistas que são donos de emissoras de rádio e TV têm a chance de ser punidos legalmente por descumprirem a legislação.


A representação, movida pelo ProJor, instituição jornalística mantenedora do site Observatório da Imprensa, pode em tese resultar na abertura de ações penal e civil contra 10% dos integrantes da Câmara dos Deputados. Por lei, segundo o especialista em Direito Constitucional Márcio Coimbra, esses parlamentares estão sujeitos até à perda de mandato. No mundo real da política, questionamentos como o agora feito pelo Projor jamais tiveram acolhida no Congresso. Daí a decisão da entidade de bater em outra porta.


O destinatário da representação foi o Ministério Público Federal, que a recebeu no final de outubro. Com ela, vem à tona uma lista inédita, fruto de pesquisa conduzida pelo professor Venício de Lima, do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília (UnB), publicada, com exclusividade, pelo Congresso em Foco (leia mais).


A relação aponta os nomes dos 49 deputados que são concessionários diretos de emissoras de rádio e TV, conforme dados oficiais do Ministério das Comunicações. Inclui ainda outros dois deputados – Carlos (ex-Bispo) Rodrigues e José Borba – que renunciaram recentemente ao mandato após acusações de envolvimento com o mensalão. O levantamento se concentra nos deputados, deixando de fora os senadores.


Há um mês, os jornalistas Alberto Dines, Mauro Malin, José Carlos Marão e Luiz Egypto, que coordenam o ProJor, entregaram ao subprocurador-geral da República, Roberto Monteiro Gurgel Santos, os resultados da pesquisa, apontando indícios de ilegalidade nas outorgas e nas renovações de concessões públicas de emissoras de rádio e TV.


‘A questão fundamental quanto a deputados serem proprietários de emissoras de rádio e TV é que, primeiro, é uma ilegalidade, porque contraria a Constituição. Depois, a situação cria um conflito entre os interesses privados dos deputados empresários e o interesse público, as questões de cidadania’, observa o professor Venício.


O documento destaca o caso dos deputados Corauci Sobrinho (PFL-SP) e Nelson Proença (PPS-RS), titulares da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), que teriam votado em causa própria, isto é, a favor das renovações das concessões de suas próprias emissoras de rádio. Corauci chegou a presidir a comissão em 2003. O levantamento feito por Venício ainda revela que pelo menos 11 dos 40 integrantes do colegiado são concessionários na área das comunicações.


O processo


A representação em poder da Procuradoria da República parte de duas premissas para motivar a investigação. Primeiro, aponta que um em cada dez deputados é concessionário direto de veículos de radiodifusão, contrariando o artigo 54 da Constituição Federal. Em seguida, ressalta que deputados empresários das comunicações integram a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI). Como a comissão delibera sobre projetos de lei ligados ao setor e referenda outorgas e renovações das concessões públicas para exploração dos veículos de radiodifusão, eles poderiam votar a favor de interesses próprios.


Na última terça-feira, um despacho do subprocurador Roberto Gurgel Santos determinou o encaminhamento da documentação fosse encaminhada à Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF). Em análise preliminar, Gurgel entendeu que não há indícios da ocorrência de crime. Por isso, o inquérito, mesmo aberto contra parlamentares – autoridades que têm foro privilegiado – poderá correr na instância inferior.


O processo está com o procurador-geral da República, Antônio Fernando Sousa, que deve fazer a remessa à PR-DF. Os autores da representação esperam que os procuradores que assumirem o inquérito aprofundem as investigações e revejam o entendimento de Gurgel.


A lei


O constitucionalista Márcio Coimbra não tem dúvidas sobre a restrição imposta aos parlamentares e ressalta que o descumprimento à Constituição pode levar à perda do mandato. ‘Segundo o artigo 54 da Constituição, eles não podem ser concessionários públicos. E não se justifica o argumento de que eles se afastam do controle ou da administração das empresas ao tomarem posse, para conciliar o empresariado com o mandato. A lei fala em ‘ser proprietário ou diretor’. Nem sócio eles podem continuar sendo. Afinal, como sócios, continuam tendo lucros’, explica o advogado.


O artigo 54 enumera as condutas proibitivas aos parlamentares. Dispõe, expressamente, que deputados e senadores não podem, desde a diplomação, firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público. A concessão é um dos tipos de contratos celebrados com a administração pública. Também não podem, desde a posse, ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público. Coimbra ressalta que o artigo 55 da Constituição dispõe que o parlamentar que descumprir as regras do dispositivo anterior pode incorrer na perda do mandato.


Até a Constituição Federal de 1988, promulgada em outubro daquele ano, outorgar e renovar concessões de rádio e televisão era atribuição exclusiva do Poder Executivo. Era mais fácil, portanto, utilizá-las como moeda de troca para favorecer interessados em controlar veículos de comunicação, instrumentos eficazes de controle da opinião pública e, via de conseqüência, de conquista de votos e manutenção do poder.


Uma das inovações da nova Constituição foi justamente repartir esse poder entre o Executivo e o Legislativo. O artigo 223, parágrafo 1º, da Constituição, conferiu ao Congresso Nacional a atribuição de referendar as decisões de outorga e renovação de concessões proferidas pelo Executivo.


A alteração foi saudada como o primeiro grande passo para a democratização das comunicações, um setor dominado no país pelos grandes grupos empresariais, pelos políticos e pelas igrejas. Mas acabou mudando muito pouca coisa, segundo o professor Venício de Lima.


‘Imaginou-se que fosse um avanço delegar aos deputados o referendo das concessões cedidas pelo Executivo, mas tem soado mais como um retrocesso. Donos de rádios e TVs, eles se comprometem para analisar os projetos de lei da área de comunicações, sobretudo os integrantes da CCTCI (Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática). Como se sentirão à vontade para elaborar políticas públicas para a área, por exemplo?’, questiona o pesquisador.


Porta aberta às concessões


O contrato de concessão para exploração de emissora de rádio ou TV é firmado diretamente com o Poder Executivo, por meio do Ministério das Comunicações. É permitido aos parlamentares vetar o pedido de outorga ou renovação, mas o veto depende da aprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso, em votação nominal. Nunca, na história das duas Casas, um pedido de outorga ou renovação de concessão de rádio ou TV foi vetado.


Provavelmente no intuito de diluir o poder de alcance dos veículos de radiodifusão ligados a políticos, o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62), já na década de 60, determinou que aquele que estiver em gozo de imunidade parlamentar não poderia exercer função de diretor ou gerente de empresa concessionária de rádio ou televisão.


A Constituição de 1988 incorporou o espírito do Código. O artigo 54, que enumera as condutas proibitivas aos parlamentares, dispõe que deputados e senadores não podem, desde a diplomação, ‘firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público’. Também não podem, desde a posse, ‘ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público’.


O novo velho coronelismo


Da lei à sua aplicação, no entanto, vai uma grande distância. Somos um país marcado pela prática do coronelismo eletrônico. Numa ponta, concessões de rádio e TV há muito são usadas como moeda para compra de apoio no Parlamento. Na outra, perpetuam o poder econômico e a influência social de seus beneficiários, que são ainda brindados com um instrumento de fantástico potencial eleitoral. Um virtual palanque eletrônico.


Um dos traços determinantes do poder oligárquico nacional é a propriedade de estações de rádio e televisão por grupos familiares e pelas elites políticas locais ou regionais. A ciência política trata como ‘coronelismo’ a relação entre os coronéis locais, líderes das oligarquias regionais, que buscavam tirar proveito do poder público, no século XIX e no início do século XX. Hoje, não há como deixar de se associar esse termo aos atuais impérios de comunicação mantidos por chefes políticos oligárquicos, que, por isso mesmo, acabam exercendo forte influência nacional. O compadrio e o patrimonialismo modernizaram-se com o recurso dos meios de extensão do poder da fala: o rádio e a televisão.


Entre 1985 e 1988, o então presidente José Sarney concedeu mais de mil concessões de emissoras de rádio e TV. Pelo menos 168 foram entregues a parlamentares que o ajudaram a aprovar a emenda que lhe deu cinco anos de mandato.


O governo Fernando Henrique Cardoso encontrou uma brecha legal para distribuir palanques eletrônicos, por meio da outorga – feita por portaria do Ministério das Comunicações – das chamadas RTVs, estações retransmissoras de televisão que podiam ser entregues a aliados sem necessidade de aprovação do Congresso. Até setembro de 1996, outorgou 1.848 licenças de RTVs, das quais pelo menos 268 beneficiaram entidades ou empresas controladas por 87 políticos. A generosidade de FHC coincidiu com a aprovação da emenda constitucional que permitiu a sua própria reeleição.


Em março deste ano, o então ministro das Comunicações, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e o ex-secretário da pasta, Paulo Lustosa, tiveram de dar explicações públicas porque o cadastro do próprio ministério os apontava como proprietários de emissoras de rádio no Ceará. Na época, os dois alegaram que haviam se desfeito das emissoras cerca de cinco anos antes e que o negócio não fora atualizado no cadastro oficial do ministério.


O próprio ex-presidente e atual senador pelo Amapá José Sarney (PMDB) não tem o nome incluído no cadastro de concessionários de emissoras de rádio e televisão do Minicom. Mas a família Sarney é representada no cadastro oficial pelos filhos do senador: o deputado Sarney Filho (PV-MA), a senadora Roseana Sarney (PFL-MA) e o empresário Fernando José Sarney. O clã é proprietário do Sistema Mirante de Comunicações, que engloba 10 veículos de comunicação e alcança 80% do território maranhense. São três canais de televisão, retransmissores locais da Rede Globo, quatro emissoras de rádio FM, duas emissoras de rádio AM e o jornal O Estado do Maranhão. A família Sarney domina a política no Maranhão há 40 anos, alternando o exercício do poder entre descendentes (como a ex-governadora Roseana Sarney) e aliados do senador.


No Rio Grande do Norte, o domínio dos meios de comunicações concentra-se na família Alves, do senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), relator da CPI dos Bingos, e do deputado Henrique Alves (PMDB-RN), primo do senador. Campeão em mandatos consecutivos (está na Câmara desde 1971), o deputado é suplente da CCTCI. A família Alves é proprietária do Sistema Cabugi de Comunicação, formado por um canal de TV aberta, retransmissor da TV Globo em Natal, um canal de televisão UHF, quatro rádios AM, uma FM e um jornal.


Rastreamento difícil


Rastrear o coronelismo eletrônico é sempre uma tarefa difícil. Venício reconhece que o número de parlamentares que controlam emissoras de rádio e TV é maior do que aquele que ele próprio identificou. Só muito recentemente, o Ministério das Comunicações passou a publicar em sua página oficial na internet, o arquivo com o nome dos concessionários.


Além do mais, para proteger sua identidade e se esquivar das normas de incompatibilidade, alguns congressistas tendem a recorrer a vários expedientes, como transferir a concessão para o nome de parentes e laranjas.


Reportagem publicada pela revista Época, na edição de 6 de junho de 2005, atribuiu ao deputado cassado Roberto Jefferson (PTB-RJ) o real controle de duas emissoras de rádio no interior do Rio de Janeiro. Mas, no cadastro oficial do Ministério das Comunicações, elas aparecem em nome de outros dois concessionários, que, segundo a revista, seriam laranjas do petebista. Um deles declarou à revista que sequer tinha conhecimento de que era sócio do grupo de comunicação.’



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‘A bancada dos empresários da comunicação’, copyright Congresso em Foco (www.congressoemfoco.com.br/), 24/11/05


‘Veja a relação dos deputados que detêm concessão de emissoras de radiodifusão, segundo o Ministério das Comunicações


A representação em poder do Ministério Público Federal estima que 51 deputados da atual legislatura sejam concessionários diretos de emissoras de rádio e TV. O número foi obtido por meio de pesquisa conduzida pelo professor Venício de Lima, do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB.


Dois parlamentares incluídos na lista – José Borba (PMDB-PR) e Carlos Rodrigues (PL-RJ) – não são mais deputados. Renunciaram ao mandato depois de serem acusados de envolvimento com o mensalão. Outros dois – Wanderval Santos (PL-SP) e Romeu Queiroz (PTB-MG) – respondem a processos de cassação pelo mesmo motivo.


O levantamento, por ora restrito aos deputados federais, tem por base o cadastro oficial de concessionários mantido pelo Ministério das Comunicações. A lista, até agora inédita, é divulgada com exclusividade pelo Congresso em Foco. Dos 51, 14 são do PMDB, 8 do PFL, 7 do PP e 6 do PL. PSDB, PSB e PTB empatam: cada um desses partidos tem quatro deputados concessionários de rádio ou TV. Finalmente, há dois nomes do PPS, um do PV e um do PDT.


Confira, a seguir, os deputados proprietários de emissoras de rádio e televisão:


ALBERICO FILHO (PMDB-MA)


RÁDIO FM CIDADE DE PRESIDENTE DUTRA LTDA


RÁDIO SANTA MAURA LTDA


SISTEMA JANAÍNA DE RADIODIFUSÃO LTDA


ALEXANDRE SANTOS (PMDB-RJ)


RÁDIO MUSICAL DE CANTAGALO LTDA


ANÍBAL GOMES (PMDB-CE)


RÁDIO DIFUSORA DO VALE ACARAÚ LTDA


ÁTILA LIRA (PSDB-PI)


RÁDIO CHAPADA DO CORISCO LTDA


B. SÁ (PSB-PI)


RÁDIO VALE DO CANINDÉ LTDA


BONIFÁCIO DE ANDRADA (PSDB-MG)


RÁDIO CORREIO DA SERRA LTDA


BOSCO COSTA (PSDB-SE)


RÁDIO A VOZ DO SERIDÓ LTDA


CARLOS ALBERTO LERÉIA (PSDB-GO)


RÁDIO SERRA DA MESA LTDA


RÁDIO DIFUSORA DE IMBITUBA S/A


CARLOS RODRIGUES (PL-RJ)*


TV VALE DO ITAJAÍ LTDA


RÁDIO UIRAPURU DE FORTALEZA LTDA


TELEVISÃO XANXERÊ LTDA


RÁDIO EDUCACIONAL E CULTURAL DE UBERLÂNDIA LTDA


RÁDIO ANTENA NOVE LTDA


RÁDIO JORNAL DA CIDADE LTDA


CLEONÂNCIO FONSECA (PP-SE)


EMPRESA BOQUINHENSE DE COMUNICAÇÕES LTDA


CLEUBER CARNEIRO (PTB-MG)


RÁDIO PROGRESSO DE JANUÁRIA LTDA


RÁDIO VOZ DO SÃO FRANCISCO LTDA


CORAUCI SOBRINHO (PFL-SP)


RÁDIO RENASCENÇA LTDA.


DILCEU SPERAFICO (PP-PR)


RÁDIO DIFUSORA DO PARANÁ LTDA


RÁDIO DIFUSORA DO PARANÁ LTDA


DIMAS RAMALHO (PPS-SP)


RÁDIO TAQUARA BRANCA LTDA


FÁBIO SOUTO (PFL-BA)


EMPRESA CAMACAENSE DE RADIODIFUSÃO LTDA


FRANCISCO GARCIA (PP-AM)


RÁDIO E TELEVISÃO RIO NEGRO LTDA


GONZAGA PATRIOTA (PSB-PE)


REDE BRASIL DE COMUNICAÇÕES LTDA


HUMBERTO MICHILES (PL-AM)


REDE AMAZONENSE DE COMUNICAÇÃO LTDA


INOCÊNCIO OLIVEIRA (PMDB-PE)


RÁDIO A VOZ DO SERTÃO LTDA (OM)


RÁDIO A VOZ DO SERTÃO LTDA (FM)


REDE NORDESTE DE COMUNICAÇÃO LTDA (TV)


RADIO A VOZ DO SERTÃO LTDA


IVAN RANZOLIN (PP-SC)


RÁDIO ARAUCÁRIA LTDA


JADER BARBALHO (PMDB-PA)


RBA REDE BRASIL AMAZÔNIA DE TELEVISÃO LTDA


BELÉM RADIODIFUSÃO LTDA


JAIME MARTINS (PL-MG)


RÁDIO DIFUSORA INDUSTRIAL DE NOVA SERRANA LTDA


JOÃO BATISTA (PP-SP)


RÁDIO 99 FM STEREO LTDA


TV CABRÁLIA LTDA


RÁDIO ANTENA NOVE LTDA


RÁDIO ATALAIA DE LONDRINA LTDA


JOÃO MAGALHÃES (PMDB-MG)


COMCEL-COMUNICAÇÕES CULTURAIS E EVANGÉLICAS LTDA


JOÃO MENDES DE JESUS (PSB-RJ)


RÁDIO CULTURA DE GRAVATAÍ LTDA


ALAGOAS RÁDIO E TELEVISÃO LTDA


JOSÉ BORBA (PMDB-PR)*


RÁDIO CIDADE JANDAIA LTDA (FM)


RÁDIO CIDADE JANDAIA LTDA (OM)


JOSÉ CARLOS MACHADO (PFL-SE)


FUNDAÇÃO DE SERVIÇOS DE RADIODIFUSÃO EDUCATIVA SHALOM


JOSÉ ROCHA (PFL-BA)


RIO ALEGRE RADIODIFUSÃO LTDA


RÁDIO RIO CORRENTE LTDA


JULIO CESAR (PFL-PI)


RÁDIO FM ESPERANÇA DE GUADALUPE LTDA


LEODEGAR TISCOSKI (PP-SC)


MAMPITUBA FM STEREO LTDA


LUCIANO CASTRO (PL-RR)


REDE TROPICAL DE COMUNICAÇÃO LTDA


REDE TROPICAL DE COMUNICAÇÃO LTDA


MARCONDES GADELHA (PTB-PB)


RÁDIO JORNAL DE SOUSA LTDA


SISTEMA REGIONAL DE COMUNICAÇÃO LTDA


MAURO BENEVIDES (PMDB-CE)


RÁDIO CLUB S A


MOACIR MICHELETTO (PMDB-PR)


RÁDIO JORNAL DE ASSIS CHATEAUBRIAND LTDA


RÁDIO PITIGUARA LTDA


MORAES SOUZA (PMDB-PI)


RÁDIO IGARAÇU LTDA


RÁDIO EDUCADORA DE PARNAÍBA S/A


MUSSA DEMES (PFL-PI)


RÁDIO CHAPADA DO CORISCO LTDA


RÁDIO VALE DO PAJEÚ LTDA


NELSON PROENÇA (PPS-RS)


EMISSORAS REUNIDAS LTDA


EMISSORAS REUNIDAS LTDA


ODÍLIO BALBINOTTI (PMDB-PR)


RÁDIO EDUCADORA LTDA


OLIVEIRA FILHO (PL-PR)


SAFIRA RADIODIFUSÃO LTDA


OSVALDO COELHO (PFL-PE)


RÁDIO E TELEVISÃO GRANDE RIO FM STEREO LTDA


RÁDIO DA GRANDE SERRA LTDA


RÁDIO FM VOLUNTÁRIOS DA PÁTRIA LTDA


RÁDIO E TELEVISÃO GRANDE RIO FM STEREO LTDA


RÁDIO E TELEVISÃO GRANDE RIO FM STEREO LTDA


PAULO LIMA (PMDB-SP)


RÁDIO DIÁRIO DE PRESIDENTE PRUDENTE LTDA


TV FRONTEIRA PAULISTA LTDA


PEDRO FERNANDES (PTB-MA)


RADIO DIFUSORA DE MOSSORÓ SA


SISTEMA MARANHENSE DE RADIODIFUSÃO LTDA


PEDRO IRUJO (PMDB-BA)


RADIO SERRANA FM LTDA


RADIO SERRANA FM LTDA


RADIO SERRANA FM LTDA


RADIO CLUBE RIO DO OURO LTDA


RICARDO BARROS (PP-PR)


FREQUENCIAL EMPREENDIMENTOS DE COMUNICAÇÃO LTDA


ROBÉRIO NUNES (PFL-BA)


RÁDIO FM MACAUBENSE LTDA


ROMEU QUEIROZ (PTB-MG)


RÁDIO PRINCESA DO VALE LTDA


SANDRA ROSADO (PSB-RN)


RÁDIO RESISTÊNCIA DE MOSSORÓ LTDA


SARNEY FILHO (PV-MA)


TELEVISÃO MIRANTE LTDA


RÁDIO MIRANTE LTDA


SEVERIANO ALVES (PDT-BA)


PAIAIA COMUNICAÇÃO LTDA


WANDERVAL SANTOS (PL-SP)


RÁDIO ARATU LTDA


REDE RIJOMAR DE RADIODIFUSÃO LTDA


RÁDIO CULTURA DE GRAVATAÍ LTDA


RÁDIO LIBERDADE FM DE SANTA RITA LTDA


RÁDIO DIFUSÃO E CULTURA LTDA


RÁDIO CONTINENTAL FM LTDA


ZÉ GERARDO (PMDB-CE)


RÁDIO METROPOLITANA DE FORTALEZA LTDA


* Carlos Rodrigues (PL-RJ) e José Borba (PR), ex-líder do PMDB na Câmara, renunciaram ao mandato de deputado, suspeitos de envolvimento no esquema de mensalão.


Fonte: Levantamento feito pelo professor Venício A. de Lima com base em dados da Câmara dos Deputados (18/08/2005) e do Ministério das Comunicações (05/08/2005).’



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‘Em causa própria’, copyright Congresso em Foco (www.congressoemfoco.com.br/), 24/11/05


‘A representação entregue à Procuradoria Geral da República pelo Projor acusa os deputados Corauci Sobrinho (PFL-SP) e Nelson Proença (PPS-RS) de descumprirem o Regimento Interno da Câmara ao votar, na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), pela renovação de suas próprias concessões de emissoras de rádio.


‘Se esses fatos forem confirmados, podem gerar a abertura de processo disciplinar no Conselho de Ética da Câmara e eventual perda do mandato dos deputados, por quebra de decoro parlamentar’, esclarece o advogado Márcio Coimbra. ‘Se o deputado não se deu por impedido e votou em causa na qual tem interesse próprio, cabe processo disciplinar no Conselho de Ética’, confirma o professor da Universidade de Brasília (UnB) Márcio Iorio, também especialista em Direito Constitucional.


O artigo 180 do Regimento Interno da Câmara dispõe que, diante de uma situação que possa configurar legislação em causa própria, o deputado é obrigado a declarar-se impedido de votar e avisar à Mesa Diretora. Para efeito de quorum, o voto deve ser considerado em branco.


‘Nem sabemos o que votamos’


Segundo a representação em poder do Ministério Público Federal, Corauci teria votado, no dia 11 de junho de 2003, pela renovação da concessão da Rádio Renascença Ltda. de Ribeirão Preto (SP), da qual é sócio-proprietário, de acordo com os dados do Ministério das Comunicações. Na época, ele era presidente da CCTCI.


Procurado pela reportagem, o deputado contestou a informação. Demonstrando irritação, o pefelista disse ao Congresso em Foco que se declarou impedido de votar naquele dia. ‘Está na ata’, afirmou. A reportagem não teve acesso ao documento. Segundo Corauci, aquela reunião foi presidida pelo então vice-presidente, Vieira Reis (PMR-RJ).


Ainda em 2003, no dia 30 de abril, Proença votou pela renovação da concessão da Rádio Emissoras Reunidas Ltda., de Alegrete (RS) da qual, segundo o ministério, é sócio-proprietário. O deputado possui outra emissora de rádio, ligada às mesmas Emissoras Reunidas, em Santa Cruz do Sul, também no Rio Grande do Sul.


A justificativa de Proença é curiosa. O deputado contou ao Congresso em Foco que votou pela renovação da concessão de sua rádio sem sequer perceber. ‘Votamos muitas coisas, são muitos assuntos na pauta. O presidente organiza os pedidos de outorga e renovação blocos e faz uma votação simbólica. Basta o deputado estar presente no dia, que consta da ata que ele tenha votado a favor. Nem sabemos direito o que estamos votando’, justifica-se.


Proença acrescentou que as rádios pertencem a sua família há anos e que ele chegou a se afastar da administração delas quando tomou posse como deputado. ‘Trabalhei por 15 anos na IBM. Minha área de interesse na comissão são os projetos de lei sobre informática’, acrescenta.’



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‘Sintonia fina’, copyright Congresso em Foco (www.congressoemfoco.com.br/), 24/11/05


‘A pesquisa elaborada pelo professor Venício de Lima também cruzou dados para identificar os deputados donos de rádios e emissoras de televisão que integram a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), à qual cabe examinar os projetos de lei de interesse do setor, bem como as outorgas e renovações concedidas pelo Executivo, que precisam ser referendadas pelo Legislativo.


Em 2003, 16 integrantes da CCTCI apareciam no cadastro do Ministério das Comunicações (MiniCom) como sócios ou diretores de 31 emissoras de rádio e seis de televisão. O próprio presidente da comissão naquele ano, Corauci Sobrinho (PFL-SP), é sócio da Rádio Renascença Ltda. em Ribeirão Preto (SP). A comissão tinha 51 membros, com quorum mínimo de 26 deputados. Em tese, os 16 deputados concessionários poderiam, em situações de quorum mínimo, formar a maioria dos votantes, aprovando ou rejeitando qualquer proposição.


Em 2004, a comissão perdeu um de seus mais influentes integrantes, com a morte, em outubro do ano anterior, do deputado José Carlos Martinez (PR), ex-presidente do PTB e cuja família é proprietária de um dos principais grupos de comunicação do Paraná, a rede CNT de televisão.


No ano passado, o número de titulares do colegiado caiu para 33. Mas a representatividade dos empresários das comunicações continuou em alta: 15 deles figuravam na lista do Ministério das Comunicações como concessionários de 26 emissoras de rádio e três canais de televisão.


Neste ano, a CCTCI passou a ser composta por 40 deputados. Levantamento preliminar indica que pelo menos 11 deles são concessionários diretos de emissoras de rádio e televisão. Todos integraram a comissão em 2004 e muitos estão lá desde 2003, como os deputados Carlos Nader (PL-RJ), João Batista Ramos da Silva (PP-SP), Nelson Proença (PPS-RS), Corauci Sobrinho (PFL-SP) e Pedro Irujo (PMDB-BA).


O atual presidente da comissão, empossado em março deste ano, é o ex-presidente do Senado, deputado Jader Barbalho (PMDB-PA), que figura no cadastro oficial do Ministério das Comunicações como sócio-proprietário de emissoras de rádio e televisão do grupo Rede Brasil Amazônia de Televisão, retransmissora da Rede Bandeirantes no Pará. Jader é sócio do grupo, ao lado da ex-mulher, a ex-deputada Elcione Barbalho, e do filho, Jader Fontenelle Barbalho Filho.


O deputado João Batista Ramos da Silva (PP-SP) consta do cadastro do Minicom como sócio de emissoras de rádio e televisão. Diretor da Igreja Universal do Reino de Deus do bispo Edir Macedo, proprietária da Rede Record de Televisão, o deputado é um dos sócios-diretores da TV Record em São Paulo, da Rádio Record em São Paulo, da retransmissora da Record em Itabuna (BA) e de uma rádio FM em Brasília. No total, ele possui cinco rádios distribuídas entre Brasília, São Paulo e Paraná e duas emissoras de TV.


O deputado foi expulso do PFL em 11 de julho passado, depois de ter sido flagrado pela Polícia Federal tentando transportar sete malas contendo quase R$ 10 milhões em dinheiro vivo. A Igreja Universal atribuiu a origem do dinheiro a doações de fiéis.’



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‘Jeitinho para mudar a regra’, copyright Congresso em Foco (www.congressoemfoco.com.br/), 24/11/05


‘O deputado Alceste Almeida (PMDB-RR) tomou uma iniciativa para tentar sanar a irregularidade que recai sobre os colegas concessionários diretos de emissoras de rádio e TV. Reuniu 189 assinaturas e apresentou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 453/2005 no último dia 30 de agosto.


O texto da PEC é tão singelo que suas intenções passam despercebidas a quem não conhece, minimamente, a Constituição. Apenas sugere o acréscimo de um parágrafo 6º ao artigo 222 com a seguinte redação: ‘Não se aplica a este artigo o disposto no artigo 54 da Constituição Federal’.


O artigo 222 dispõe justamente sobre a propriedade das empresas jornalísticas e de radiodifusão. O artigo 54 trata das restrições impostas aos parlamentares para o exercício do mandato. A ementa (resumo explicativo) atribuída à PEC acaba esclarecendo a questão aos leigos: ‘Autoriza deputados e senadores a serem proprietários de empresas jornalísticas, emissoras de rádio e televisão. Alterando a nova Constituição Federal.’ O deputado Nelson Proença, um dos 189 signatários da PEC – que diz ter votado sem saber na renovação da concessão de sua rádio -, garante que também assinou sem ler o documento que lhe foi apresentado por Alceste. ‘Os colegas pedem, e a gente assina para ele protocolar o projeto. Nem sabia do que se tratava’, disse ao Congresso em Foco.


A PEC já foi encaminhada para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), na qual serão analisadas a legalidade e compatibilidade constitucional da proposta. O último andamento data de 14 de setembro, quando foi sorteado como relator o deputado Almir Moura (PMDB-RJ). Se a proposta for considerada constitucional, será encaminhada a uma comissão especial constituída apenas para analisar o seu mérito.


Na justificativa da proposta, o deputado Alceste Almeida argumenta: ‘Nosso entendimento é que não se faz necessário tal impedimento, visto que todo o processo hoje – não só nesses casos, mas também naqueles em que as atividades de cunho público se apresentam – é totalmente transparente e acessível a qualquer cidadão e as normas que regem o acesso impedem qualquer possibilidade de existir algum tipo de dúvida ou privilégio que possibilite àqueles que preencham os requisitos constitucionais necessários para se estabelecerem’.


Indignado, o professor Venício de Lima critica a apresentação da PEC. Para ele, ‘omite-se deliberadamente a relação cada vez mais direta e decisiva que existe hoje entre o controle da radiodifusão e o controle do processo político, em particular do processo eleitoral’.


Dos 189 deputados que assinaram a PEC, 32 são membros da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI). Entre signatários, estão o deputado e ex-ministro das Comunicações Eunício Oliveira (PMDB-CE); o presidente do Conselho de Ética, deputado Ricardo Izar (PTB-SP); e o primeiro vice-presidente da Câmara, deputado José Thomaz Nonô (PFL-AL). Pelo menos cinco subscritores da PEC são, ao mesmo tempo, concessionários de radiodifusão e membros da CCTCI: Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), João Mendes de Jesus (PSB-RJ), Leodegar Ticoski (PP-SC), Nelson Proença (PPS-RS) e Ricardo Barros (PP-PR).’



ENTREVISTA / MÁRIO JAKOBSKIND


Nestor Cozetti


‘América que não está na mídia’, copyright Brasil de Fato, 25/11/05


‘Brasil de Fato – Você está lançando o livro ‘América que não está na mídia’. Por que América que não está mídia?


Mário Augusto Jakobskind – Exato. A partir de um curso livre – ‘América Latina que não está na mídia’- que tive a oportunidade de ministrar na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), veio a idéia de desenvolver este trabalho que reúne uma série de artigos e comentários relativos a fatos que a mídia conservadora omite ou noticia de uma forma manipulada com o claro objetivo de levar os leitores, ou seja, a opinião pública a formar juízo sobre problemas relevantes partindo de premissas falsas. Quer um exemplo? O bloqueio informativo que são alvo a Venezuela e Cuba. Tem mais: qualquer força política latino-americana que não se dobra ao esquema da manipulação da informação ou se insurja contra a política econômica neoliberal é automaticamente colocado nas páginas e nos noticiários de tevê como grandes vilões. Ou seja, a mídia conservadora, que posa de imparcial, adota como prática a filosofia do pensamento único. Os defensores da política econômica que levou a América Latina para uma situação de pobreza e miserabilidade têm tratamento diferenciado. Já os opositores… É a forma que as classes dominantes encontraram para fazer cabeças, arquivando a anterior estratégia de desgastantes e caros golpes militares. E tudo isso em nome de uma pretensa democracia.


A nossa América, a América que o movimento social almeja, não está na mídia, mas precisamos furar estes bloqueios, exigindo pelo menos um tratamento midiático em pé de igualdade. Sem isso, não há democracia na verdadeira acepção da palavra. O ‘América que não está na mídia’, que reúne uma série de artigos e comentários de fatos contemporâneos pretende, modestamente, dar a contribuição no sentido de ampliar o debate e levar informação sonegada pela mídia conservadora. O leitor agora vai julgar se a proposta atingiu esse objetivo.


BF – O seu livro trata de questões recentes referentes à Venezuela?


Jakobskind – Correto. A República Bolivariana da Venezuela está presente, inclusive em um capítulo sobre a frustrada tentativa de golpe em abril de 2002 contra o Presidente constitucional Hugo Chávez, capítulo intitulado ‘O papel da mídia, um papelão’. Trata-se de uma lembrança sobre os fatos ocorridos durante a ação que teve o apoio direto do Departamento de Estado norte-americano e como a mídia latino-americana noticiou o acontecimento. Aqui mesmo no Brasil, âncoras dos grandes canais de TV chegaram a saudar o golpe, silenciando posteriormente quando Chávez voltou ao governo nos braços do povo. As revistas semanais saíram com chamadas de capa contra o ‘ditador’. A Veja, por exemplo, vinculada ao grupo do magnata das comunicações e golpista venezuelano Gustavo Cisneros, não escondeu o contentamento em relação ao golpe. Só que a Veja, Época e outras publicações saíram no fim de semana e como correm atrás do lucro fácil foram para as bancas com as manchetes sensacionalistas que envelheceram em poucas horas. Como se diz em termos jornalísticos, foi uma das maiores ‘barrigas’ (erro) dos últimos tempos. Estas revistas e canais de TV são os mesmos que hoje manipulam a informação contra a Venezuela, onde, por sinal, a mídia conservadora deixou cair à máscara de substituta dos partidos políticos que mandaram no país, via revezamento no governo de cinco em cinco anos. Ou seja, jornais e canais de TV vinculados a Cisneros, apoiadores do golpe que durou 47 horas, são os mesmos que hoje desancam sobre Chávez e a Revolução Bolivariana. ‘América que não está na mídia’, portanto, mostra o lado que foi e vem sendo boicotado pela mídia conservadora que ainda tenta enganar posando de imparcial e ultimamente dizendo que ouve os dois lados.


BF – No seu livro você aposta na América Latina em transformação, ‘apesar dos traidores’, Quem são os traidores?


Jakobskind – Há um capítulo com o título ‘América Latina, apesar dos traidores continua apostando nas mudanças’. É isso aí. Neste continente houve presidentes que se elegeram, inclusive com o apoio do movimento social, e passaram a governar seguindo exatamente o oposto das promessas de palanque. O caso mais gritante dos últimos tempos foi o do Equador, onde o ex-presidente Lucio Gutierrez, contando com o apoio do movimento indígena, passou para o outro lado. Tornou-se um aliado incondicional do governo George W. Bush. Acabou tendo de abandonar o poder, por pressão do movimento popular, apesar da intromissão grosseira da Embaixada estadunidense que tentou até o último momento a permanência de Gutierrez. No Peru, sem grande ilusões, o Presidente Alejandro Toledo, que teve destacada atuação nas mobilizações contra o ex-presidente, ditador-civil, Alberto Fujimori, elegeu-se com certa tranqüilidade. O seu governo é um desastre em matéria econômica. Como ex-funcionário do Banco Mundial, Toledo presidente parece até que continua no antigo emprego.


No final dos anos 80, mais precisamente em 1989, o então presidente da Venezuela, Carlos Andrés Peres, tinha feito campanha prometendo caminhos diferentes das propostas do FMI. Em menos de um mês fez exatamente o contrário, adotando um tarifaço energético, como exigia o FMI. O povo rebelou-se e Peres ordenou uma violenta repressão que resultou em mais de 300 mortos. Peres hoje é um opositor ferrenho de Chávez e em uma de suas entrevistas chegou mesmo a propor o assassinato do atual presidente. O ex-presidente vive hoje entre Miami e São Domingos, a capital da República Dominicana, pois se voltar para a Venezuela vai ficar atrás das grades cumprindo pena decretada pela Justiça por desvio de verbas públicas.


Tem outros líderes por aí que estão custeando o alambrado, mas como ainda têm oportunidade de voltar às origens, ou seja, cumprir as promessas de campanha, não estão sendo citados, mas, quem sabe, se houver nova edição poderão ser catalogados como traidores…


Você diz no seu livro que os meios de comunicação são usados até para ajudar golpes de estado, como no caso da Venezuela. Você aponta alternativa para se contrapor a essa mídia golpista?


Jakobskind – É necessário fortalecer os veículos alternativos à grande mídia, como, por exemplo, o Brasil de Fato. É fundamental que o Poder Público destine suas verbas publicitárias para esse setor. Por que os governos que se pretendem populares continuam a seguir nesse terreno o esquema de sempre, ou seja, só contemplando a mídia conservadora? Nesse sentido, seguindo o raciocínio do pensador italiano Umberto Eco, não somos uma democracia, pois, segundo ele, democracia só existe de fato quando todos os setores sociais têm vez e voz em pé de igualdade. E hoje no Brasil, o que acontece? A resposta, lamentavelmente, não é tão de difícil de ser dada. O movimento social, por exemplo, é tratado pela grande mídia conservadora de forma preconceituosa e com o claro objetivo de levar a opinião púbica e encará-lo de forma marginal. Isso é democracia?


BF – Está acontecendo o II Fórum de Debates Mídia e Violência. Mas a mídia não é ela mesma violenta quando criminaliza os favelados, negros e pobres em geral?


Jakobskind – Sem dúvida. Inclusive agora nós temos exemplos mais recentes de grandes jornais aqui do Rio de Janeiro, como o Globo, que faz uma campanha sórdida pela remoção das favelas. Algo que no Rio se falava há 40 anos atrás, na época do Carlos Lacerda, que foi governador, e agora eles acharam por bem voltar ao espírito elitista da velha UDN, o negócio da classe média da década de 50/60, que dava ênfase à moralidade.


O jornal O Globo, agora resolveu bancar essa campanha pela remoção das favelas, porquê? Porque uma meia dúzia, sabe-se lá quantos, de favelados, por questão de necessidade construíu barracos em áreas chamadas ‘verdes’. Mas quem conhece o Rio de Janeiro, a Ladeira do Sacopã, por exemplo, que se vê na Lagoa Rodrigo de Freitas, um ponto nobre da cidade, construiu-se em áreas verdes prédios e mais prédios, e a especulação imobiliária tomou conta.


BF – E ninguém falou nada?


Jakobskind – Nada. Porque os ricos tudo podem. Claro que se deve preservar as áreas verdes, agora, remoção, uma jogada que os cariocas imaginavam já definitivamente arquivada e que agora a mídia conservadora retoma? Só mesmo na cabeça dos elitistas e defensores de poderosos interesses econômicos.


Quem é:


Mário Augusto Jakobskind é jornalista e escritor, está lançando na próxima sexta-feira, 25, na abertura do I Encontro Latino-americano Raízes da América – Cultura de Resistência, a partir das 19 horas, na Associação Brasileira da Imprensa, o seu nono livro, ‘América que não está na mídia’, da Editora Adia (Associação para o Desenvolvimento da Imprensa Alternativa) com prefácio de João Pedro Stédile. Membro do Conselho Editorial do Brasil de Fato, Mário Augusto tem pesquisado e analisado a cobertura da mídia sobre as mais variadas questões, sobretudo em relação à América Latina e o fenômeno do pensamento único tão em voga na grande mídia conservadora.’