Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Transparência reduzida
>>O governo da Argentina observa a imprensa

Transparência reduzida

A Folha de S.Paulo anuncia hoje seu novo ombudsman. Carlos Eduardo Lins da Silva, doutor e livre-docente da USP, assume no lugar de Mario Magalhães, para um mandato de um ano, renovável por mais dois.

Magalhães ficou apenas um ano no cargo. Seu contrato não foi renovado porque ele não concordou com a decisão da direção da Folha, de não mais divulgar na internet a crítica interna diária produzida pelo ombudsman.

No anúncio do nome do novo ‘defensor dos leitores’, a direção do jornal paulista afirma que a crítica interna vinha sendo ‘utilizada pela concorrência e instrumentalizada por jornalistas ligados ao governo federal’.

Em declaração reproduzida por seu jornal, o diretor de Redação, Otávio Frias Filho, considera que a distribuição irrestrita da crítica interna era incongruente, uma vez que o próprio conteúdo do jornal na internet é restrito aos assinantes.

Cabe ao ombudsman criticar, e à direção tomar as decisões que considera mais adequadas, afirma.

Ou seja, manda quem pode, obedece quem tem juizo.

Para os leitores do jornal, sobra uma insuperável desconfiança de que a transparência nessa relação foi reduzida, e que, a despeito de todas as qualificações do novo titular, a figura do ombudsman fica um pouco menor com a nova restrição.

Mas, como diz seu diretor, cabe ao jornal tomar as decisões que considera mais adequadas.

De qualquer modo, resta ainda uma questãozinha a merecer melhor esclarecimento.

O que significa exatamente a instrumentalização da crítica interna por jornalistas ligados ao governo federal?

Lançada assim, sem maiores explicações, a afirmação deixa no ar algumas suspeitas que, a rigor, o bom jornalismo não recomenda, já que é função da imprensa esclarecer, não produzir mais dúvidas.

Ficam os leitores agora imaginando quem são os ‘jornalistas ligados ao governo federal’, e como isso poderia prejudicar um jornal.

Por que não preocupar-se também com ‘jornalistas ligados ao prefeito’, ‘jornalistas ligados ao governador’, ‘jornalistas ligados à Fiesp’ ou à torcida organizada do Corinthians?

A menos que tenha outros interesses além da notícia, um jornal não deveria levar muito em conta o que pensam dele os eventuais donos do poder.


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O governo da Argentina observa a imprensa

A presidente da Argentina, Cristina Kirschner, reagiu de maneira nada original aos conflitos com a imprensa do seu país.

Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:

– No embalo das críticas assacadas contra a mídia durante o recente protesto de produtores agropecuários, a presidente argentina Cristina Kirchner decidiu ressuscitar um tal Observatório de Discriminación en los Médios, idéia gestada na Universidade de Buenos Aires e encampada pelas faculdades de Ciências Sociais de todas as universidades públicas.

Participam do empreendimento o Instituto Nacional contra a Discriminação, Xenofobia e o Racismo (Inadi) e o Comitê Federal de Radiodifusão (Comfer) – o primeiro vinculado ao Ministério da Justiça e o segundo, uma autarquia ligada à presidência da República.

É aí que mora o perigo: o viés acadêmico não disfarça tratar-se de um observatório de mídia com forte presença do governo. O Foro de Periodismo Argentino (Fopea), entidade que congrega jornalistas de todo o país, notou ali uma ‘ameaça potencial’ a veículos e jornalistas que não endossem as posições governamentais. E a Asociación de Entidades Periodísticas Argentinas (Adepa) sublinhou que a multiplicidade de formas de expressão possibilitadas pelas novas tecnologias ‘convertem a intenção controladora numa caricatura de dominação’.

A história recente das relações do governo argentino com a mídia não é nada edificante. Na gestão de Néstor Kirchner, a administração federal adotou uma clara postura de discriminação informativa, além de fazer uso político da veiculação de publicidade oficial paga. Agora, o que era ruim pode piorar.

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