A guerra entre as polícias
Os jornais fizeram uma boa cobertura factual do confronto entre policiais ocorrido ontem perto do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo de São Paulo.
Ao longo de todo o episódio, os sites jornalísticos mantiveram os leitores informados sobre detalhes da crise, considerada a mais grave envolvendo as forças policiais do Estado.
No entanto, as edições de hoje pecam pela falta de informações e análises sobre o que está por trás do conflito.
Ao dar grande destaque à politização da crise, a imprensa dá uma grande volta no problema e desvia a atenção dos leitores de alguns elementos importantes para entender a questão da segurança pública em São Paulo.
Para começar, o Estado de S.Paulo chama de ‘grupo’ a multidão de policiais civis que participava da manifestação.
Sob qualquer critério, uma massa de 2.500 pessoas não pode ser chamada de ‘grupo’.
A Folha de S.Paulo passa longe de analisar a estratégia da cúpula da Segurança Pública que, segundo o Estadão, teria errado ao misturar policiais civis e militares na tentativa de conter a passeata.
Mas o mais importante, os jornais paulistas continuam ignorando a verdadeira situação da segurança no Estado.
A imprensa de São Paulo usa critérios muito diferentes na abordagem da questão da violência, por exemplo, quando se trata de notícias do Rio de Janeiro.
A greve da polícia paulista, que já completa um mês, expõe alguns problemas que a imprensa vem ignorando há muito tempo.
Eles são discutidos abertamente por integrantes das Polícias Civil e Militar em blogs na internet e mostram que no meio da greve está embutida uma reação de parte da força policial contra aquilo que é chamado de ‘banda podre’ da segurança pública.
Pela leitura desses meios alternativos, por exemplo, fica-se conhecendo o caso de um delegado da capital que foi afastado de suas funções por ter descoberto falsificações nas estatísticas de ocorrências policiais na Secretaria de Segurança, ou o caso de um delegado de Santos que sofreu um processo administrativo e perdeu o cargo depois que denunciou um esquema de corrupção na Baixada Santista.
A imprensa presta um bom serviço ao informar o leitor sobre o agravamento das tensões entre as Polícias Civis e Militar, mas a verdadeira guerra não sai nos jornais: ela se dá entre os policiais honestos e aqueles que se associaram ao crime.
A política dentro do armário
A mídia e a baixaria na campanha eleitoral.
Alberto Dines:
– Duas perguntas que entrarão para a história das eleições no Brasil: ‘Ele é casado? Ele tem filhos?’. A propaganda de Marta Suplicy, candidata à prefeitura paulistana, questionando a vida pessoal do seu rival, Gilberto Kassab, está há quatro dias em todas as colunas políticas, mundanas e humorísticas. Saiu da internet para os jornais paulistas, destes para os jornais regionais, para o rádio e a TV. Neste fim de semana, estarão nas revistas.
O episódio merece ser avaliado sob o ponto de vista estritamente midiático. Não foi deslize, nem gafe da candidata. Foi opção estratégica dos marqueteiros. A intenção era criar um pequeno embaraço para o oponente, pois nesta fase o comando das campanhas evita confrontos de grandes proporções, preferem deixá-los para os últimos dias. Não contaram com a percepção do eleitor-internauta, que no segundo turno costuma estar mais atento.
As duas perguntas fazem parte de um grande disparate. Luiza Erundina não é casada, nem tem filhos e foi eleita pelo PT como prefeita da S. Paulo. O jornalista Juca Kfouri comentou ontem com muita graça em seu programa esportivo na CBN que é casado, tem quatro filhos e seria um péssimo prefeito.
A insinuação de que não sendo casado e sem filhos, o prefeito Kassab seria homossexual e homossexuais não podem ser prefeitos vai na direção contrária do que acontece na Europa: Londres e Paris têm excelentes prefeitos, ambos homossexuais assumidos.
O eleitorado mostrou que está mais preparado do que se supunha. Reagiu, a imprensa captou este movimento, permitiu que o debate prosseguisse aberto e agora a justiça eleitoral acolheu as queixas do candidato prejudicado. Não adianta denunciar o ‘complô da mídia e das elites’, faltam dez dias, tempo suficiente para um bom debate sobre o futuro da maior cidade brasileira.