Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Plínio Bortolotti

‘Na coluna de domingo passado, sob o título ‘A imprensa deve noticiar suicídios?’ comentei a diretriz do O Povo de não divulgar o assunto, ou fazê-lo em casos ‘muito específicos’, conforme declaração do diretor de Redação, Carlos Ely. O preceito, também adotado por vários outros jornais, leva em conta a recomendação de especialista para evitar a divulgação, devido à influência que as notícias teriam no surgimento de outros casos. Na segunda-feira, um dia depois da publicação da coluna do ombudsman, o jornal trouxe o seguinte destaque na primeira página: ‘Cearense coloca fogo no próprio corpo e morre’. A notícia, manchete da página 10, informava que o ambientalista cearense Anselmo Barros, radicado em Campo Grande (MS), havia se suicidado em protesto contra a construção de usinas de álcool em municípios da região do Pantanal.

Confrontando a notícia com a coluna do ombudsman, um leitor comentou o seguinte: ‘O espaço que o jornal dedicou a um caso de suicídio (do ambientalista), com riquezas de detalhes, prova que divulgar suicídio para O Povo não é uma questão de diretriz ou cultura, mas sim de conveniência’. Carlos Ely responde aos argumentos do leitor negando que se trate de ‘conveniência’. Ele diz que uma consulta aos arquivos do jornal mostrará a coerência em relação ao assunto. ‘Independentemente do local onde aconteça ou das pessoas envolvidas, O Povo mantém a mesma atitude’, diz o diretor de Redação. Sobre o suicídio do ambientalista, Carlos Ely diz se enquadrar nos casos ‘específicos’, que o jornal não pode deixar de divulgar: ‘Foi um ato transcendente à questão individual, tem repercussão pública e pode, inclusive, ter reflexos em uma política governamental, portanto, era mais do que razoável dar a notícia’, diz ele.

Dilema

Ainda sobre esse assunto, vejo também um dilema no título ‘Foi um gesto heróico, diz viúva do ambientalista’, em texto complementar publicado na mesma página da notícia principal. Com a declaração, a mulher procurava dar um sentido à morte do marido – encorajando outros a continuarem a sua luta. Mas, ao mesmo tempo, era uma exaltação ao gesto extremo do ambientalista. O que os jornais deveriam fazer? Publicar manifestação? Escondê-la? Nenhuma resposta é pacífica. No contexto do acontecimento – um protesto político –, parece fazer sentido publicá-la. Mas, ao mesmo tempo, não poderia soar como um incentivo à imolação ‘heróica’?

Ao jornalista não há como agir de outra forma senão analisando cada caso. Se um jornal tivesse como diretriz não divulgar suicídios em hipótese alguma, como procederia, por exemplo, quando se matou Getúlio Vargas? Como agir, agora, no caso dos suicidas homens-bomba?

Casos

Nos casos citadas na coluna passada, seria relevante, do ponto de vista sociológico, investigar o que está acontecendo. Os quatro suicídios no shopping Aldeota Expansão, em cinco anos, levantam questões subjetivas e outras objetivas, que tem de ser avaliadas. À pergunta sobre as providências que estariam sendo tomadas devido às ocorrências, recebi a seguinte resposta da assessoria de imprensa: ‘A estrutura física está de acordo com a legislação aplicável. Além disso, o shopping Aldeota realiza, periodicamente, treinamento de seus fiscais de piso, que estão orientados a abordar pessoas que demonstrem algum sinal de transtorno, contrariedade, choro ou mesmo tristeza, identificação feita com auxílio de um sistema interno de TV’. Seria isso o bastante? Haveria outras providências possíveis? Na cidade Independência, onde aconteceram quatro suicídios e cinco tentativas nos últimos seis meses, não seria relevante discutir as causas da angústia social a levarem esses jovens a atentarem contra a própria vida? É fato que isso não compete apenas ao jornalismo, mas este pode ter um papel relevante se abordar as questões de forma apropriada.

Adesivo irritante

Sempre acho interessante relacionar alguns comentários demonstrativos das variadas preocupações dos leitores. Esta semana, recebi ligação de um leitor com assinatura de fim de semana. De segunda-feira a sexta-feira, ele faz questão de comprar O Povo na visita matinal à padaria de seu bairro. Mas esse costume tem-lhe causado irritação. O leitor se queixa de não conseguir abrir o jornal sem rasgá-lo, devido a um selo adesivo usado para impedir que seja folheado. ‘Tente tirá-lo sem rasgar as páginas, você não vai conseguir’, desafia o leitor. O diretor de Circulação do O Povo, Demócrito Rocha Dummar Filho, diz que o uso do adesivo é exigência de alguns pontos de venda, como padarias e supermercados, visando a evitar aos clientes folhearem o jornal sem comprá-lo.

O assunto, aparentemente sem importância, levanta uma boa discussão. Observo que a maioria das bancas e outros pontos de venda são muito pouco amigáveis. Na maioria, o possível comprador é visto quase como um intruso, quando tenta olhar uma revista ou folhear um jornal. No Rio de Janeiro, São Paulo e em outras cidades, um exemplar de cada jornal fica exposto, pendurado dentro ou fora da banca, de forma que passantes e curiosos (possíveis leitores) possam ler as manchetes e chamadas, costume que não se vê em Fortaleza. Até há pouco tempo, as livrarias da cidade também eram muito pouco amigáveis. Não havia lugar para sentar e era quase proibida uma boa olhada no conteúdo dos livros. Felizmente, nas livrarias, a situação mudou. Hoje, mesas, cadeiras, café e chá, ficam à disposição dos clientes. Pode-se ler um livro inteiro em algumas livrarias sem ninguém a incomodá-lo. Os pontos de venda de jornais e revistas poderiam aderir ao saudável hábito. Isso aproxima o leitor. Hoje, ele folheia. Amanhã, poderá filar a leitura. Um dia irá comprar. E o dono da banca ganhará um cliente fiel.

Fora do ar

Entre sábado e a manhã de quarta-feira, o servidor de e-mails do O Povo esteve fora do ar, devido a problemas técnicos. Nesse período, perderam-se as mensagens enviadas ao ombudsman, ficando alguns leitores sem resposta. A eles, com as desculpas, peço a gentileza de enviarem novamente a correspondência.’