A política na chuva
São Paulo, 9 de 9 de 2009: os paulistanos recolhem o lixo acumulado pelas enxurradas, os jornais contam os mortos, relatam os dramas de quem passou toda a terça-feira dentro de um carro ou de um ônibus na cidade paralisada outra vez em função de chuvas fortes.
Mas, ao contrário de enchentes anteriores, a imprensa não achou culpados nos gabinetes oficiais.
O prefeito Gilberto Kassab, questionado pelo fato de haver cortado em 20% as verbas para a limpeza pública, culpa seus antecessores.
Afirma que a economia na coleta do lixo não teve qualquer relação com os alagamentos que infernizaram a vida dos cidadãos, apesar das cenas registradas pela imprensa, dos montes de sacos de lixo acumulados nas bocas dos bueiros e da evidência de que a administração municipal não cumpriu sua parte.
Ao responsabilizar seus antecessores, o prefeito corre o risco de ofender o governador e ex-prefeito, que lhe deu uma carreira política.
Antes de ser abrigado na chapa que o conduziu ao cargo de prefeito de São Paulo, o que abre perspectivas amplas para qualquer candidato à vida pública, Kassab tinha em seu currículo apenas uma passagem discreta pela Câmara dos Deputados, onde cumpriu quase clandestinamente a missão de enterrar uma Comissão Parlamentar de Inquérito que questionava a constitucionalidade das listas negras da empresa Serasa.
Como prefeito, ganhou popularidade ao disciplinar a publicidade ao ar livre, tornando a cidade menos poluída visualmente, mas isso não o torna invulnerável a erros.
O inferno em que a cidade de São Paulo se transformou nesta terça-feira está muito claramente relacionado à sua decisão de cortar a verba da limpeza pública.
Os jornais não deixam dúvida quanto a isso.
Mas, comparando-se o noticiário desta enchente com o de outras inundações, observa-se claramente que o atual prefeito foi poupado pela imprensa.
Desta vez, o culpado é São Pedro.
O clima na mídia
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Criada em 1993 para incidir na cobertura da mídia sobre a temática da criança e do adolescente, a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) vem aprimorando, de lá para cá, uma eficiente metodologia de acompanhamento e avaliação da imprensa brasileira. O portfólio de pesquisas e documentos que já produziu credencia a entidade como um ator importante no debate sobre o papel da mídia na disseminação de informações sobre políticas de interesse público; funcionando, além disso, como estimuladora de iniciativas em prol da democratização e da qualidade da informação.
Esta semana a ANDI divulgou o documento “Mudanças climáticas na imprensa brasileira”, resultado do monitoramento de 50 jornais de todos os estados, além do Distrito Federal, entre 2005 e 2008. A pesquisa apurou um aumento significativo de matérias sobre o tema a partir do segundo semestre de 2006, e queda também notável no primeiro semestre de 2008. No período de 2005 a 2007, cada veículo impresso publicou, em média, uma notícia a cada quatro dias sobre o assunto; em 2008, verificou-se a média uma notícia a cada sete dias. Esta foi uma tendência também percebida em pesquisas realizadas no exterior.
A notar ainda a concentração do noticiário e análises sobre mudanças climáticas nos principais jornais do país. De 2005 e 2007, os seis jornais mais importantes foram responsáveis por 37% da cobertura; no primeiro semestre de 2008, os mesmos veículos publicaram 48% do material sobre o tema.
De todas as formas, os dados referentes a 2008 indicaram ter havido mudanças no enquadramento da questão: o discurso jornalístico que antes focava prioritariamente as conseqüências das mudanças climáticas, agora dá mais atenção à valorização das estratégias de enfrentamento do problema. Mesmo porque, para a imprensa e para a humanidade, é uma questão de sobrevivência.