Sem metas para o clima
Sem debates no plenário e em votação simbólica, a Câmara dos Deputados aprovou os dois projetos de lei que criam a Política Nacional sobre Mudança do Clima, símbolo da pouca determinação brasileira diante do desafio que será interromper o processo de destruição das condições de vida no planeta.
A votação simbólica representa a criação de uma legislação também simbólica, uma vez que os projetos aprovados, segundo os jornais, não fazem menção a metas numéricas de redução das emissões de gases do efeito estufa.
A imprensa também parece concordar com a escolha do governo, de deixar assim, na base da simbologia, a questão que deveria determinar todas a estratégia de desenvolvimento do País para as próximas décadas.
Com exceção do Globo, os grandes jornais brasileiros dão mais destaque ao Movimento dos Sem Terra e suas ações radicais do que ao papel dos produtores rurais na questão ambiental.
A Folha de S.Paulo destaca estudo da Embrapa, divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente, dando conta de que o avanço da tecnologia agropecuária pode contribuir com 20% da meta de redução de 40% nas emissões até 2.020 em relação à média atual.
Mas a proposta do Ministério enfrenta resistências dentro do próprio governo, o que se reflete na legislação aprovada.
Segundo o Estado de S.Paulo, a agropecuária pode ser responsável por até 25% das emissões de gases poluentes, e sua contribuição negativa aumentou 30% nos últimos treze anos.
A atividade que mais influencia a questão climática em território brasileiro segue sendo o desmatamento, conforme destaca o Globo em ampla reportagem: 51,9% das emissões de dióxido de carbono vêm da destruição das florestas.
Assim, feita uma contazinha de padaria, conclui-se que o avanço da agropecuária sobre as reservas florestais é a principal causa da contribuição destrutiva brasileira para as mudanças climáticas.
Mas os jornais, principalmente os paulistas, relutam a cravar que o setor rural precisa ser enquadrado e obrigado, por lei e por todos os instrumentos possíveis, a interromper o ciclo histórico de malefícios.
A questão climática é seguramente o principal desafio do mundo contemporâneo, mas a imprensa, de modo geral, considera mais relevante discutir as ações do MST numa fazenda invadida.
Sem a fiscalização da imprensa, o Congresso Nacional vai referendando uma legislação que apenas tangencia o problema, criando simbologias onde cabem quaisquer números, enquanto a bancada ruralista vai corroendo o sistema de regras que, bem ou mal, vinham dando respaldo à ação dos órgãos de defesa do meio ambiente.
Pouca ciência
Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– A Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais, divulgou neste mês os resultados da pesquisa “Ciência, Tecnologia & Inovação na Mídia Brasileira”, realizada sob coordenação técnica da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi). O estudo monitorou 62 jornais brasileiros entre janeiro de 2007 e dezembro de 2008, e analisou 2.599 matérias sobre o tema publicadas nesse período. A intenção, segundo os autores, foi “traçar o perfil quantitativo e as principais tendências qualitativas do tratamento editorial oferecido pelos veículos impressos brasileiros aos temas relacionados à Ciência, Tecnologia & Inovação”.
A primeira evidência revelada pela pesquisa mostrou o profundo desequilíbrio da cobertura jornalística sobre o tema: os quatro diários considerados de abrangência nacional – Correio Braziliense, Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e O Globo – publicaram em 2008 praticamente um quarto de todo o material analisado, com uma média de 2,3 notícias diárias nos dois anos cobertos pela pesquisa. Na outra ponta, em 2007 os jornais locais publicaram, em média, uma notícia a cada cinco dias.
O tema “Saúde” domina a pauta, responsável por 23% dos textos analisados. A sublinhar a atenção dispensada pelos jornais à questão das mudanças climáticas, em 2007, e das pesquisas com células-tronco, no ano seguinte.
A pesquisa concluiu que o noticiário ainda pode avançar muito nessa área. Cinqüenta e cinco por cento das matérias, por exemplo, têm apenas uma fonte de informação e apenas 15,7% delas fazem alguma contextualização histórica do assunto em foco.
No seminário em que foram apresentados os resultados da pesquisa, o diretor do Departamento de Difusão da Ciência do Ministério da Ciência e Tecnologia, Ildeu Moreira, mencionou um levantamento que mostra que “uma percentagem importante do público tem interesse declarado pela ciência e pouca informação sobre a área”. Caberá à imprensa suprir mais esta lacuna.
Leia aqui o sumário executivo e a versão completa da pesquisa “Ciência, Tecnologia & Inovação na Mídia Brasileira”.