Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

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Dia de pânico da imprensa

Ainda está nas bancas a edição da revista Veja que celebra o surgimento, no Brasil, de 164 novos milionários por dia.

A ‘Supereconomia’ anunciada pela publicação brasileira de maior circulação estremece em seus pilares, e a imprensa aceita e espalha a idéia de pânico geral.

Com as bolsas americanas fechadas, por causa do feriado do Dia de Martin Luther King, boatos e especulações superaram a racionalidade e o mundo financeiro sucumbiu ao pessimismo.


Segundo o Estado de S.Paulo, até mesmo o humor dos britânicos, que nada teria a ver com o mercado de ações, influenciou no comportamento das bolsas em outros países.

O psicólogo inglês Cliff Arnall é autor de uma tese, divulgada em 2005, segundo a qual existem razões objetivas para que os britânicos tenham sempre um ‘dia mais triste do ano’, que cai normalmente na segunda-feira da última semana cheia de janeiro.

Segundo Arnall, os espíritos ficam mais abatidos por causa do término dos feriados de fim de ano, a chegada das faturas das compras de Natal e as primeiras decepções com as promessas de ano novo.

O estudo, que não tem base científica, indica que ontem seria o dia mais triste do ano para os ingleses.

Quem conhece o inverno nas ilhas de sua majestade pode acrescentar o clima entre os fatores de melancolia.

Pois a imprensa diz que chamado o ‘Blue Monday’, ou segunda-feira triste, pode ter influenciado o comportamento das bolsas de todo o mundo: imersos em sua tristeza de janeiro, os investidores ingleses ficaram ainda mais apreensivos com o pacote de medidas anunciado na sexta-feira pelo governo americano para estimular a maior economia do mundo.

De olho na Bolsa de Londres, o resto do mundo foi na onda.


Que falta racionalidade ao mercado financeiro, é fato sabido no jornalismo especializado: as bolsas sempre reagem com certo exagero, para o otimismo ou para o pessimismo, diante de novidades.

O problema é quando falta racionalidade à imprensa, que deveria estar ponderando todos os fatores objetivos que afetam o mercado para, assim, oferecer ao seu público melhores instrumentos para enfrentar a turbulência.

A revista Veja que celebra os heróis do capitalismo ainda nem foi digerida pelos leitores, e o retrato pintado pelos jornais passa a impressão de que estamos diante do apocalipse.


As mesmas fontes

A leitura dos cadernos de economia e negócios dos principais jornais brasileiros dá a impressão de que eles foram pautados pelo mesmo jornalista: muitas das fontes se repetem, os títulos são praticamente sinônimos entre si e a abordagem geral traz a mesma visão dos fatos.

O noticiário repete, com poucas nuances, o material fornecido pelas agências internacionais de notícias.

As fontes locais são os personagens de sempre no noticiário especializado.

Os retratos do dia de turbulência que abalou o mercado financeiro internacional têm em comum, em todos os jornais, o espaço relativamente pequeno para as análises sobre o possível efeito da crise sobre a economia brasileira.


Perdido no noticiário, um curto editorial do Estadão afirma que o Brasil teria poucas perdas, e que os investimentos no crescimento da indústria brasileira continuarão evoluindo em 2008.

Mas o leitor atento certamente sente falta, nos principais jornais do País, de uma conexão entre as turbulências no mercado financeiro internacional e as condições objetivas da economia nacional para enfrentar essas dificuldades.

Falta, por exemplo, um retrato do setor energético, que permita aos observadores entenderem a importância de outras restrições à continuidade do bem-estar econômico que se registra ao longo dos últimos anos.

Depois de algumas semanas em que a imprensa assombrou a sociedade com o risco de racionamento de energia, o tema precisa ser retomado com informações objetivas.

Afinal, a leitura dos jornais de hoje não permite a ninguém adivinhar o alcance e a durabilidade da crise financeira que sacudiu ontem os mercados.