Jornal não acaba, muda
Comemorou-se ontem o crescimento da circulação mundial de jornais de quase 2% no ano passado em relação a 2005. A América Latina teve a maior expansão, 4,5%.
O jornal impresso não vai acabar, vai mudar.
Os dados, da Associação Mundial de Jornais, trazem também um elemento preocupante. Na América do Norte a circulação continua caindo. E é lá que as tendências costumam emergir.
Mas a circulação não pode ser o critério exclusivo para medir o papel do jornal.
Democracia e religião
Alberto Dines diz que o Estado democrático é necessariamente laico.
Dines:
– Isso está na Constituição desde o início da era republicana, mas quando o presidente Lula declarou ontem, diante do papa Bento XVI, que o Estado brasileiro é laico pareceu a todos que anunciava algo extraordinário. O estado democrático é necessariamente laico, leigo, secular, os governantes não têm o direito de interferir nas crenças ou descrenças individuais. Apesar de não conter qualquer novidade, a declaração do presidente Lula soou como uma proclamação diante das ameaças do Vaticano de excomungar os políticos que favorecerem a legalização do aborto. Novidade ou não, é um compromisso renovado, veemente e público. É um compromisso não apenas do governo, mas de todos os poderes, inclusive da mídia. Não é demais repetir que a mídia eletrônica é uma concessão pública e, como tal, não pode contrariar os fundamentos do Estado concedente. A maioria das tevês brasileiras contraria flagrantemente as exigências de um estado laico: assumem-se como porta-vozes de diferentes confissões e chegam mesmo a confrontar-se em perigosas guerrilhas santas. A esmerada cobertura do Jornal Nacional ontem à noite foi um pouco além dos limites de uma mídia laica dentro de um estado laico. A emoção dos fieis diante do Sumo Pontífice é uma realidade que deve ser compartilhada por todos, mas a catequese religiosa através da TV fere o caráter leigo do estado brasileiro ontem reafirmado de forma tão enfática pelo presidente da República.
Fé e costumes
No Globo, Míriam Leitão defende o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, do que classifica como reação obscurantista da Igreja católica em diferentes episódios.
A Folha destaca que a Record, emissora do bispo Edir Macedo, chefe da Igreja Universal do Reino de Deus, defendeu o aborto na cobertura da visita do papa, ontem. Diz apenas que o Jornal Nacional, da Globo, ouviu os dois lados sobre a questão. Justiça seja feita. O Jornal Nacional valorizou declarações diretas e indiretas a favor do aborto, apresentadas no início e no final da reportagem.
Opinião de Boni
Da conversa mantida ontem entre o presidente Lula, o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, e o José Bonifácio Oliveira Sobrinho, que comandou durante muitos anos a Rede Globo e hoje é empresário e produtor de televisão, só se sabe que ele é a favor da TV pública. Boni, segundo o noticiário das últimas semanas, chegou a ser convidado a dirigir a nova rede e não aceitou.
Videopolítica
O deputado Clodovil Hernandes, eleito por uma legenda chamada PTC, Partido Trabalhista Cristão, declarou no dia seguinte ao da votação, em outubro de 2006, entre outras coisas, abre aspas: “O emprego no Brasil é uma porcaria porque todo mundo quer direitos. Deveres ninguém quer”, fecha aspas.
Clodovil foi o terceiro mais votado em São Paulo. Não corre o risco de fazer nenhuma proposta relevante ou de falar algo que tenha significado para a vida política do país fora de lugares-comuns reacionários.
O mais votado em São Paulo foi Paulo Maluf, com 740 mil votos. O segundo foi Celso Russomano, 573 mil votos. Em seguida a Clodovil, que teve quase 500 mil votos, veio Enéas Carneiro, que morreu no domingo passado, 390 mil votos. Russomano, Clodovil e Enéas são, cada um a seu modo, produtos midiáticos.
Guerra e gás
Quem queria guerra com a Bolívia sai frustrado da negociação do governo de Evo Morales com a Petrobrás. Morales recuou. Setores da mídia não entendem, ou fingem não entender, que se Morales não fizer um discurso radical, cai.
PCC e silêncio
Faz um ano da primeira onda de ataques do PCC em São Paulo. O Conselho Regional de Medicina contou 493 assassinatos a tiros entre 12 e 19 de maio de 2006. Quase nada se apurou. O poder não tem interesse em apurar.