Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Um dia para não esquecer
>>Um computador por testemunha

Um dia para não esquecer


No dia do Jornalista, o 7 de abril de 2011, o Brasil foi apresentado a uma das mais chocantes formas de violência, até então uma notícia que vinha apenas do estrangeiro.


Quando o jovem Wellington Menezes de Oliveira promovia um massacre na escola municipal Tasso da Silveira, no Rio de Janeiro, o Brasil perdia um pouco de sua inocência.


Ao longo de todo o dia, jornalistas, psicólogos, especialistas em segurança e outros pensadores tentavam entender como aquilo tinha sido possível.


A notícia parecia chocante demais, inesperada e inaceitável até para os padrões dos programas policialescos da televisão.


A exibição de vídeos amadores tornava ainda mais dramáticos os relatos do horror.


Nesta sexta-feira, os jornais tentam fazer algumas ponderações.


Uma delas: o assassino certamente sofreu com o “bullying” quando adolescente.


Segundo a Folha de S.Paulo, um ex-colega, Diego Peterson, conta que ele era chamado de “retardado”. ‘Mas eram brincadeiras inocentes”, explica Peterson.


Não eram inocentes para Wellington.


Em algum momento sua mente conturbada entendeu que a origem de seus sofrimentos estava naquela escola.


O que se seguiu extrapola os limites da razão.


Essas e outras interpretações percorrem as descrições dos comentaristas convidados pela imprensa a explicar à sociedade o que se passou ali.


Mas não há explicações simples.


O Estado de S.Paulo tira uma conclusão enviesada: “o caso reacendeu a discussão sobre segurança nas escolas”.


Errado. Quem acende discussões é a imprensa, e trata-se de muito mais do que colocar policiais armados perto dos estabelecimentos de ensino.


Essa é uma prática comum nas grandes cidades brasileiras, que no entanto não impede brigas, ações de traficantes e outras violações dos direitos de crianças e adolescentes.


O centro da questão foi apontado pelo presidente do Senado, José Sarney, que citou o referendo de 2005, quando 62% da população, sob propaganda intensa de jornalistas, parlamentares e lobistas a serviço da indústria de armas e munições, votaram contra o banimento das armas de fogo no País.


O assassino do Realengo tinha duas armas e balas para matar uma centena de crianças.


Onde se escondem aqueles que se mobilizaram para que a venda de armas continuasse praticamente sem impedimentos no Brasil?


Ou vão dizer que o assassino era apenas um louco?


Na ocasião, a revista Veja e alguns de seus mais destacados colunistas defenderam a bancada da bala.


Que sentido tem agora cada sentença da reportagem da revista sobre a tragédia do Rio?


O governo anuncia uma nova política de desarmamento.


Vamos ver como a imprensa vai tratar o assunto daqui para a frente.


Realengo, 7/4/2011
Um computador por testemunha


Alberto Dines:


– O Rio não merece: em três meses, dois horrores. No início de Janeiro, o dilúvio sobre a região serrana do estado, ontem pela manhã, o massacre numa escola em Realengo, zona oeste da cidade.


A primeira tragédia foi a vingança da natureza, a maior catástrofe ocorrida no país em número de vítimas, a segunda teria sido vingança de uma mente doente e perversa, um louco manso, calmo e sanguinário.


A mídia cobriu com rapidez e emoção.  Celulares e câmeras domésticas serviram novamente para reviver o pesadelo com enorme rapidez e impacto. Emissoras de rádio e televisão comoveram o país, atravessaram fronteiras, oceanos e  deixaram aos jornais de hoje a complexa tarefa de responder à perplexidade e às dolorosas perguntas que só agora começam a ser formuladas.


Por que razão, a partir de 1966, as escolas começaram a se transformar em campos de morte quando são casas do saber?


Da China à Finlândia, mas sobretudo nos Estados Unidos, escolas e universidades transformaram-se em campos de batalha onde a doença mental alia-se à doença social, a covardia alia-se ao narcismo e a solidão converte-se em ódio ao semelhante.


Wellington Menezes de Oliveira, aparentemente, preferia atirar na cabeça ou tórax das meninas, nos meninos feria nos braços ou pernas.  Na carta que digitou não há graves erros de português, parece lúcido, fala em Deus, Jesus, insiste em exigir pureza nos rituais do seu sepultamento.


Tinha amor aos animais, mas não possuía amigos, apenas um computador que destruiu antes de iniciar a diabólica faina.