ELEIÇÕES 2006
Voto nulo é política radical, diz psicanalista
‘Há algo novo para além da apatia do cenário político brasileiro. A ‘suspensão das paixões’ nesse campo criou demanda por uma política fora dos partidos, da qual o voto nulo seria uma expressão, diz o psicanalista Tales Ab’Saber, 41. ‘Os cidadãos que votam nulo estão radicalizando a política num momento que ela tende a desaparecer’, disse durante a entrevista realizada em seu consultório, na tarde chuvosa da última sexta-feira. Membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, pensador de esquerda que já declarou o fim do PT, o psicanalista diz discordar de ‘tudo’ que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio de Mello, tem dito para estimular o voto. ‘Voto nulo não é o voto desinformado, incapaz de avaliar, desinteressado. Pelo contrário, é o voto hiperinformado.’ Leia a seguir trechos da conversa com Ab’Saber, que tratou também da blindagem do presidente Lula da Silva (PT) e do fracasso, até aqui, da oposição.
FOLHA – A revista ‘The Economist’ disse [na semana passada] que Lula se beneficia de uma onda de bem-estar e apatia. O sr. concorda?
TALES AB’SABER – É uma apatia que tem duas frentes. A desmobilização no espaço dos cidadãos, que é uma espécie de crise de ideais, e uma apatia do lado dos políticos, que não querem atirar a primeira pedra porque todos os partidos têm envolvimento com a corrupção. Um elemento importante para estabelecer essa espécie de ‘suspensão das paixões’ é a liquidação do PT ao longo do primeiro governo Lula. Se o PT tivesse aproveitado politicamente a crise e radicalizado o debate sobre o espaço da política e sua falência, nesse momento a política teria recuperado a sua dignidade. E cabia ao PT fazer isso, o PT que era o estrangeiro. Mas o PT sacrificou suas estrangeirice, seu pólo crítico, ao convencionalismo da política brasileira. Vivemos um momento de grande desorientação para os cidadãos que tinham conexões políticas. É uma crise com o PT, mas com o PSDB também. O PSDB também não se diferencia nesse processo de corrupção endêmica.
FOLHA – Há grupos que fazem campanhas por democracia direta, regulamentar referendo, plebiscito. Dizem que isso seria um caminho para dar um choque de política.
AB’SABER – Há um movimento conceitual e simbólico que necessita pensar a política fora os partidos, o que é novo. Essa é uma região muito complexa, que tanto pode ser uma proposição republicana, reformista, como essa do professor [Fábio Konder] Comparato, quanto pode ser um começo de um trabalho crítico mais radical. Nesse nível mais radical, poderia ser tanto um voto nulo republicano, para atacar a estrutura viciada da política, quanto um voto nulo radicalmente crítico, quer dizer, um voto que diz ‘o espaço do Brasil é inviável’. Essa experiência negativa se aproxima um pouco da experiência do que é [a facção criminosa] o PCC. A negativa da política pode ser a tradução de que não há negociação mais com o espaço público, do Estado. Aí a relação do cidadão com o que seria o espaço da política é de confronto. Isso é semelhante à facção, e essa uma consciência nova que pode estar começando a surgir e que pode ser importante para o Brasil, um pouco mais de impaciência com um processo que historicamente esboroa e se torna república particular.
FOLHA – Essa reação, do voto nulo, pode ser amadurecimento?
AB’SABER – Tem aí um voto Pilatos, não sujo minhas mãos, que é um pouco imaturo. Mas a posição conflitante, que percebe o isolamento do espaço da política em relação à vida nacional pode ser madura, no sentido de romper com a ideologia conservadora. Ela pode estar formulando uma crítica mais radical ao Brasil. Não é por acaso que é nesse momento de falência do PT que emerge o PCC. O espaço da política que desaparece da vida social é ocupado com uma intensidade maior, que pode ser a própria crítica. Desse ponto de vista, o voto nulo não é nada ingênuo. Há três dimensões do voto nulo: um moral, banal, regressivo; um voto republicano negativo e um voto crítico radical.
FOLHA – Votam nulo pessoas com boa educação, bom nível social, que vivem nos grande centros, não é uma contradição?
AB’SABER – Elas estão fazendo diagnóstico de que não há alternativa pelo interior da trama positiva e oficial da política. Elas têm condição de fazer esse diagnóstico e estão acreditando nele. Elas estão identificadas com o choque negativo. Vamos acertar o espaço da política por fora dele. Essa é a política que pode ser interessante agora, deslegitimar, isso é uma posição radical que começa a ganhar forma e prática. Voto nulo não é o voto desinformado, incapaz de avaliar, desinteressado, pelo contrário, é o voto hiperinformado.
FOLHA – O ministro Marco Aurélio comparou o voto nulo a uma avestruz que na tempestade de areia enfia a cabeça em um buraco.
AB’SABER – Eu não concordo com nada do que diz o ministro. Inclusive quando ele diz que votar é ser patrão. É uma distorção radical do sentido do que é espaço público, política, igualdade de direitos. Essa não é uma relação de submissão e de poder direta, como é a de patrão e empregado. Nesses pequenos sintomas a gente vê a crise do oficialismo da política. Eles querem convocar o cidadão, e convocam por aquilo que é antipúblico. O sentido é de submissão, da república particular, a ideologia é a do mercado. É muito grave isso tudo.
FOLHA – Por que, nesse quadro, Lula foi poupado?
AB’SABER – Lula foi muito esperto ao perceber o afundamento do navio do PT. O partido correspondia ao interesse mais radical das classes médias esclarecidas. Ele rompeu com essas forças, já no início do governo, depois ele deixou o PT afundar. Com base no quê? Na identificação afetiva. Percebeu que o enraizamento dele na classe média crítica tinha ruído e passou a falar diretamente, por meio da fantasia da proximidade, algo da velha cordialidade brasileira, com as classe pobres, principalmente do Nordeste. Isso só funciona porque essas classes trabalhadoras perderam totalmente a confiança na política das elites, não há alternativa do outro lado, dos coronéis, dos bacanas de São Paulo, que têm livros escritos em cinco línguas. Essa é uma crise da direita. O Lula ganha porque a direita não consegue apresentar uma alternativa minimamente viável para essa experiência de classe. O Lula é muito fraco, o discurso dele, no entanto, é o único que funciona, todos os outros são mais fracos.
FOLHA – A oposição a Lula, desde o início, foi marcada por crises. Desde a escolha entre Alckmin e Serra.
AB’SABER – Às vezes temos impressão de que foi uma candidatura escolhida para perder. Certamente é como [o banqueiro] Olavo Setúbal falou na Folha. Não há nenhum constrangimento com a vitória de Lula. Os grandes poderes estão tranqüilos com a vitória de Lula. Para uma grande direita, Lula pode ser um dispositivo ideológico ainda mais interessante neste momento, ele pode conter ainda mais a crise social brasileira. E não é certo que o Alckmin possa fazer isso. O governo bonzinho, chuchu e gerencial do Alckmin em São Paulo terminou em PCC.
FOLHA – Como será um eventual segundo mandato de Lula? O programa de governo apontava, na semana passada, para maior controle da mídia. A situação fala em lacerdismo da imprensa.
AB’SABER – Acho que Lula não vai ter nenhuma força para intervir em campos mais polêmicos. O segundo mandato vai ser um tipo de sarneyzação, algo como o segundo mandato de FHC, em que o Lula vai ter duas questões políticas essenciais: ou ele trabalha para enraizar o PT na estrutura do Estado brasileiro, como aconteceu com o PMDB, ou trabalha para salvar a pele dele e sair relativamente ileso de uma feroz luta pelo poder que vai se instalar logo.
Acho que ele vai trabalhar para se salvar de um processo grave de renovação da política. Essa sinalização de que Lula, se vencer, sairá como um tirano, quase um ditador, isso é propaganda, não é real. É evidente que sai fortificado, mas a composição política do segundo mandato é muito complicada.’
Painel do Leitor
Encontro com Lula
‘‘Paulo Nogueira Batista Júnior, por quem tenho respeito e amizade, relatou, em sua coluna ‘Um encontro com o presidente Lula’ (Dinheiro, 31/8), o encontro de intelectuais com Lula, dando ênfase aos ataques que ele proferiu ao Banco Central. Ficou parecendo que essas foram as únicas críticas substanciais apresentadas ao presidente -por alguém que furou a lista dos oradores inscritos.
Ora, antes de sua intervenção, um dos inscritos na lista leu um manifesto, assinado por 213 intelectuais, que condena ‘os recentes escândalos que têm despertado perplexidades’. Outro inscrito afirmou, em seguida, que os delitos praticados por membros do PT e do governo, ‘incorrendo em penas previstas no Código Penal’, haviam deixado muitos militantes do PT ‘humilhados e ofendidos’. E Maria Rita Kehl, também inscrita na lista, disse que esperava um PT e um governo petista livres dos ‘vícios e dos crimes’ que marcaram o período recente.
Havia, portanto, no encontro, gente que acredita que a questão ética do PT e do governo é muito mais importante do que o atual nível da taxa de juro.’
LUIZ FELIPE DE ALENCASTRO, historiador (Paris, França)
Resposta do colunista Paulo Nogueira Batista Júnior – Com todo o respeito e a amizade que tenho por Luiz Felipe Alencastro, digo que o clima dominante no encontro dos intelectuais com o presidente na segunda-feira passada em São Paulo era de apoio e deferência. O manifesto que ele menciona, apesar da perplexidade com os escândalos, pedia voto em Lula. Todos ou quase todos os inscritos na tal lista de oradores declararam voto no presidente. Alguns fizeram ressalvas críticas; outros, nem isso.’
ENTREVISTA / LE CARRÉ
‘Todos somos espiões’, afirma escritor britânico
‘DO ‘MORGENAVISEN JYLLANDS-POSTEN’, EM COPENHAGUE – John le Carré, que tem 74 anos e é o celebrado autor de 20 romances sobre espionagem internacional, é conhecido como um velho irado. Quando ele nos recebeu em sua suíte no Hotel d’Angleterre, em Copenhague, sua fama de irascível pareceu ser merecida. Após uma hora e meia de conversa, porém, ficou claro que Le Carré, célebre por ter feito a crônica das lutas dos bastidores da Guerra Fria, não é apenas um senhor irado, mas furioso.
Le Carré está furioso com as injustiças sofridas pelas populações dos países em desenvolvimento, com as falhas da ‘guerra ao terror’, com o poder irrestrito das corporações multinacionais, com a hipocrisia de qualquer espécie. Esta ira move seu romance mais recente, ‘The Mission Song’, sobre a tentativa de um grupo de multinacionais de roubar o Congo [República Democrática do Congo, ex-Zaire] de seus recursos naturais. Enquanto os diversos atores na trama conspiram, eles são espionados pelo intérprete Bruno Salvador, filho de um missionário britânico que se desviou de seu caminho e de uma mulher congolesa. Embora seja casado com Penelope, filha da alta classe britânica, branca, Salvo, como o intérprete é chamado ao longo do livro, se apaixona por Hannah, uma imigrante recente do Congo.
PERGUNTA – Ele é um desajustado, como muitos de seus outros personagens principais.
JOHN LE CARRÉ – Eu quis mostrar a hipocrisia de nos chamarmos a nós mesmos de sociedade do arco-íris e dizer que todos são iguais, ou de afirmar que não tomamos nota da cor dos outros -o que eu acho que é mentira total. Com nossos preconceitos raciais, vamos precisar de pelo menos um século de educação até conseguirmos integrar as pessoas e começar a respeitá-las.
PERGUNTA – O Congo também faz parte da história. O sr. é fascinado por esse país.
LE CARRÉ – Escolhi o Congo porque sinto fascínio por perdedores. Gosto de histórias sobre fracos e oprimidos. E o Congo é o maior perdedor de todos. O país é uma tragédia absoluta. É um campo de batalha de aluguel para todo o mundo de fora, e os congoleses se arrebentaram todas as vezes. Existem apenas 50 km de estrada pavimentada no Congo, mas os minerais, ouro e diamantes do país valem bilhões.
PERGUNTA – O que o uso feito das zonas de conflito em seus livros diz sobre o Ocidente?
LE CARRÉ – É uma espécie de efeito colonial que se revela quando exigimos que eles façam eleições, como acabou de acontecer no Congo. É bobagem pura. Não podemos exportar a democracia dessa maneira. A democracia não funciona se não se tem uma administração, um Judiciário, uma força policial decente. Nada disso existe no Congo. Não há infra-estrutura, nem linhas de comunicação. Em lugar disso há muita cultura tribal e guerra entre clãs, então a eleição estava fadada ao fracasso, porque as pessoas votam segundo critérios étnicos. O vencedor leva tudo, e o perdedor dirá que a eleição foi fraudada. A eleição pertence aos países doadores e ao Banco Mundial em medida igual à que pertence ao Congo. Não há dúvida de que uma eleição era necessária, mas é difícil acreditar que ela fornecerá as respostas, sem o resto da estrutura.
PERGUNTA – Fico com a impressão de que, em seus livros mais recentes, o estilo se tornou mais lírico, mas sua mensagem ficou mais forte, mais irada e mais direta. Por quê?
LE CARRÉ – Espero que as duas coisas sejam verdade. É claro que muitas pessoas dirão que é a ira e o radicalismo da velhice, mas vivemos numa época em que as nuances e variações políticas estão sendo reduzidas a simplificações assustadoras. Li hoje que Bush disse em um discurso que, se deixarmos a guerra no Iraque correr contra nós e trouxermos o nosso pessoal para casa, eles virão para cá, nos procurar na América. Ele deixa de lado o fato de que o Iraque não tem nada a ver com o terror. No entanto, através da repetição interminável e graças à atitude vergonhosamente passiva da mídia corporativa americana, essas mentiras estão entrando na percepção das pessoas comuns. A guerra contra o terror é uma guerra muito difícil contra uma ideologia, mas os EUA a transformaram numa guerra territorial.
PERGUNTA – O que o sr. quer dizer com isso?
LE CARRÉ – O exemplo mais recente e mais terrível que vimos é o Líbano. Se você mata um terrorista e cem civis, você está mais distante do terror ou mais próximo dele? Estou falando aqui de nossa preservação e da erradicação do terrorismo. Você não vai conseguir isso atirando 25 mil toneladas de bombas nas montanhas de Tora Bora, no Afeganistão, ou eliminando o Partido Baath, que era a única estrutura administrativa do Iraque, ou cometendo abusos em Abu Ghraib. Você não realiza nada se abandona seus princípios democráticos. É preciso ser capaz de aceitar perdas. A lógica que os americanos estão obedecendo neste momento teria exigido que bombardeássemos Dublin quando o IRA nos atacava. É completamente insana.
PERGUNTA – O que eles deveriam ter feito depois do 11 de Setembro?
LE CARRÉ – Não nutro nenhuma ternura liberal em relação ao terrorismo. Sou inteiramente a favor de que se matem todos os que participaram dos ataques de 11 de Setembro. O que me assusta demais é que nos deixamos levar pelo feitiço do controle das mentes, da simplificação e da psicose de massas e que estamos sendo tragados pela retórica americana. Me incomoda ouvir que Angela Merkel [chanceler alemã] está se aproximando da posição americana ou que a Dinamarca está fazendo o mesmo. Não deveríamos ter declarado uma guerra ao terror depois do 11 de Setembro. Deveríamos ter disponibilizado muitos recursos às forças especiais, e a melhor inteligência possível, e as utilizado para atacar diretamente a jugular das pessoas responsáveis, matando-as. Ninguém teria se importado. Em lugar disso, terminamos com a guerra no Iraque. Não é apocalíptico demais dizer que esse foi possivelmente o primeiro passo em direção à catástrofe global.
PERGUNTA- De que maneira as coisas mudaram em relação à realidade que o sr. descreveu em seus livros sobre a Guerra Fria?
LE CARRÉ – A Guerra Fria foi uma guerra de ambiguidades. Meu próprio envolvimento me deixou dividido em relação ao que era certo e o que era errado. A questão era até onde deveríamos ir para defender uma sociedade decente -e, ao mesmo tempo, procurar assegurar que a sociedade continuasse a ser decente. De certo modo, é a mesma pergunta que tentei responder em minhas obras posteriores. Acho apenas que agora, na velhice, tenho consciência maior da insensatez particular do momento, um senso maior da catástrofe. A outra coisa que vi, e que considero profundamente perturbadora, é o uso inapropriado feito da inteligência para justificar posições políticas previamente tomadas que, na realidade, não têm justificativa -como foi feito no Iraque. Isso não acontecia em minha época de espião, cem anos atrás. Naqueles tempos a inteligência era uma ciência pura, mas não é esse o caso hoje, evidentemente.
PERGUNTA – Nos velhos tempos, era o conflito entre as superpotências da Guerra Fria que ameaçava o indivíduo. Hoje é a corporação multinacional que desempenha papel grande em seus livros. Por quê?
LE CARRÉ – O poder das grandes empresas tem estado presente em vários de meus livros mais recentes porque ele cria a aura de algo tão grande, tão incompreensível e que não presta contas a ninguém, que você acha que não pode fazer nada contra isso, como indivíduo. O inimigo é indefinível. Os inimigos são organizações gigantes que têm um pé no Liechstentein, outro nas Antilhas Holandesas, que fazem suas reuniões de conselho na Inglaterra. E, quando você sabe que Tony Blair se preocupa mais com a opinião de Rupert Murdoch do que com o que pensa seu eleitorado, você tem que se preocupar. Eu percebo uma erosão do conceito de nação e de democracia, exatamente como o que Mussolini descreveu. Ele falou: ‘A democracia termina e o fascismo começa onde o poder político e o poder das empresas são inseparáveis’. Seria possível acrescentar a essa lista o poder religioso e o da imprensa. Todos os quatro estão nas pontas dos dedos da direita americana.
PERGUNTA – O sr. sente que seus livros integram um gênero determinado?
LE CARRÉ – Me sinto um autor. Deixo a cargo da burocracia literária definir o resto. Não vou a festas literárias. Não troco figurinhas com os críticos de Londres. E não permito que meus livros sejam candidatos a prêmios. Não sei lhe dizer se Salman Rushdie é melhor que Philip Roth. Ninguém sabe.
PERGUNTA – Mas o sr. não emprega o thriller ou o romance de espionagem para formular perguntas relevantes, mais do que para entreter?
LE CARRÉ – Chame-os de romances de espionagem, já que a identidade do espião é tão próxima da natureza do indivíduo que o leitor não tem problema em identificar-se com ele. Compactuamos muito e construímos muitas pontes falsas. Todos nós andamos por aí nutrindo pensamentos secretos que nunca comunicamos -nem mesmo àqueles a quem amamos mais. Talvez precisamente por amá-los. Moldamos uma identidade a partir do que compactuamos conosco. E temos a máscara que vestimos quando nos apresentamos diante das pessoas, a maneira como vestimos nosso disfarce, como moldamos nossas vozes ou olhamos uns para os outros. São todos o fazer de conta que fazemos na vida. Dizemos: ‘Eu te amo’ para sermos educados, para consolar ou para pagar pessoas, mesmo que não estejamos falando a sério. Trate um personagem humano como espião, rotule-o de espião num romance, e o leitor ficará de seu lado e você poderá levá-lo para onde você quiser, para onde ele não esperava ir, e ele o acompanhará, porque somos todos espiões.
JESPER STEIN LARSEN é repórter de Cultura do ‘Jyllands-Posten’, da Dinamarca. A entrevista foi distribuída pelo New York Times Syndicate
Tradução de CLARA ALLAIN’
INTERNET
Blog é condenado por comentário ofensivo de leitor
‘O blog Imprensa Marrom, de crítica à imprensa, foi condenado em primeira instância a pagar R$ 3.500 por danos morais a João Pedro Boria Caiado de Castro, por ofensas postadas nos Comentários do site por um usuário.
A decisão foi divulgada na semana passada e é a primeira condenação no Brasil por Comentários, ou seja, não por texto de quem faz o blog, mas de um de seus leitores -com veiculação automática. Embora raros, há casos semelhantes no exterior, por exemplo, na Argentina.
A ação vem desde setembro de 2004 e chegou a retirar o Imprensa Marrom (imprensamarrom. com.br) do ar, através de liminar, posteriormente revisada no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Fernando Gouveia, 29, que lançou o blog em 2001 junto com outros amigos, sublinha que nem mesmo a possibilidade de identificação do usuário foi tomada em consideração.
Na sentença da juíza Ana Paula Theodosio de Carvalho, de São José dos Campos, é ‘inafastável a responsabilidade do requerido’, pois, ‘ao disponibilizar espaço para divulgação democrática (termo utilizado na contestação) do conteúdo inserido por terceiros, assume o risco sobre as expressões ofensivas veiculadas’.
Avaliando a repercussão da decisão, Gouveia afirma que já recorreu.’
TELEVISÃO
Band dá ‘vida’ a paisagens do Rio antigo
‘A Band vai empregar tecnologia de ponta para produzir sua próxima novela, ‘Paixões Proibidas’, trama que se passa em 1805. Paisagens do Rio de Janeiro e Lisboa dessa época serão totalmente reconstruídas por computação gráfica.
Segundo Ignácio Coqueiro, diretor da novela, escravos, embarcações e carruagens vão aparecer em movimento dentro de paisagens do século 19.
O truque é trabalhoso _um minuto de imagens leva uma semana para ser finalizado.
Coqueiro já gravou várias tomadas do centro do Rio. No computador, essas imagens passarão por uma faxina: todos os elementos modernos, como prédios e fios, serão eliminados por técnicos da PUC-RJ. Gravuras da época, de Thomas Ender, servem de modelo.
Enquanto isso, Coqueiro grava em um terreno descampado cenas de escravos caminhando e carruagens em movimento. Ele usa como fundo um grande telão azul, cor que irá desaparecer das imagens. Na próxima etapa, essas cenas serão fundidas com as paisagens do Rio antigo já trabalhadas em computador. Ficará parecendo que os escravos estavam na paisagem.
‘Paixões Proibidas’ mistura três livros do escritor português Camilo Castelo Branco e promete ter muitas cenas de sexo, afinal será exibida depois das 22h, a partir de novembro. ‘Vou gravar cenas de nudez, mas sem constranger o telespectador nem os atores.’
PISTA QUENTE 1 A modelo Fernanda Lima voltou atrás e vai participar da segunda edição de ‘Dança no Gelo’, que estréia no final do mês no ‘Domingão do Faustão’. Ela topou fazer o quadro mesmo sem ter o tempo que os demais competidores terão para ensaiar, porque está nos Estados Unidos a trabalho.
PISTA QUENTE 2 O elenco do ‘Dança no Gelo 2’, por enquanto, está assim: Fernanda Lima, Wanessa Camargo, Flávia Alessandra, Lucimara Parisi (diretora do ‘Domingão’), André Gonçalves, Xanddy (marido de Carla Perez) e Iran Malfitano.
DISQUE-BABÁ Está marcado para 8 de outubro, às 16h, a estréia da segunda temporada de ‘Supernanny’, sucesso no SBT.
ESTÁ BOMBANDO Diretor artístico da Globo, Mário Lucio Vaz tem sido só elogios para Marjorie Estiano, a Marina de ‘Páginas da Vida’. A moça, que também é cantora, já está ‘reservada’ para a próxima novela de Aguinaldo Silva.
ZORRA TOTAL Xuxa Meneghel começa no próximo sábado a rodar seu novo filme, em que fará duas irmãs gêmeas. No elenco, quatro nomes do humorístico ‘Zorra Total’, que passa por boa fase no Ibope: Fabiana Karla, Maria Clara Gueiros, Leandro Hassum e Marcius Melhem.
BURACO NEGRO ‘Cristal’, do confuso SBT, será encurtada e acabará no início de novembro. A novela não será substituída imediatamente por uma nova produção feita no Brasil. Não dá tempo.’
Bia Abramo
Mães podem ser surpresa do ano na TV
‘CHEGA DE ‘Supernanny’ e vivam as mães ‘de verdade’ do ‘Mothern’. O seriado pode comemorar pelo menos duas primeiras vezes: é a primeira série de ficção do GNT, o canal que vem criando uma programação interessante voltada ao público feminino, e é a primeira obra de ficção feita para a TV saída de um blog.
Apesar de resultados desiguais, o GNT vem se firmando como uma alternativa para a mulher urbana moderna muito ocupada consigo mesma, um tanto oprimida pelos padrões de beleza que circulam na mídia, questionadora dos papéis tradicionais, mas, muitas vezes, pouco corajosa na hora de afirmar sua diferença. É claro que essa é uma generalização, e as generalizações são problemáticas por uniformizar a variedade da experiência, mas, de qualquer maneira, é com uma concepção parecida com essa que deve trabalhar o GNT.
E nada como a sensação de comunidade proporcionada pela rapidez e acessibilidade da comunicação pela internet para criar espaços de convivência capazes de dar à diferença um caráter mais coletivo. A experiência da maternidade, que é tão codificada em termos de idealização, é uma das que se beneficiaram tremendamente com as possibilidades da internet. O blog que deu origem ao programa, no qual as duas publicitárias foram captando e moldando maneiras de ser mãe ‘sem perder a antena para o mundo’, não é uma experiência isolada.
Fóruns nos quais mães trocam de conselhos a receitas do que fazer para o bebê parar de soluçar pipocam na rede e servem de alento e consolo para muita mulher aflita.
O mérito de ‘Mothern’ é devolver à mãe a prerrogativa de falar acerca da maternidade. A babá quase perfeita do reality show e os inúmeros especialistas que pontificam sobre todos os aspectos dessa relação podem até ser úteis vez por outra, mas não se comparam à aventura de conversar com uma outra ‘mãe que pensa’. Esse era, justamente, o nome de uma seção pioneira da ‘Salon Magazine’, uma das primeiras e melhores revistas culturais online, que reunia artigos e ensaios sobre os desafios de ser mãe.
Falta, na TV, acertar melhor o roteiro, que, por ora, ainda não superou a fase de parecer uma coleção de esquetes e diálogos engraçados e/ou fofos. Se conseguir resolver isso, com a turma de atrizes bacanas e desconhecidas do grande público, tem boa probabilidade de vir a ser a surpresa do ano.’
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