O pânico na imprensa
O cenário estava montado para o final feliz, mas o que se viu foi a continuação do drama, que se espalhou do palco para a platéia e produziu uma situação de pânico sem precedentes em todo o mundo.
Ao longo do dia de ontem, quando ficou claro que a Câmara de Representantes dos Estados Unidos rejeitaria a proposta de socorro ao sistema financeiro, os sites dos jornais começaram a reproduzir os sinais de desorientação do mercado.
Como todos, inclusive a imprensa, haviam apostado no pacote salvador, a rejeição por parte dos deputados americanos deixou o mercado e a própria mídia sem referências.
O Estado de S.Paulo oferece uma explicação parcial para o fato de grandes instituições financeiras e de comunicação terem embarcado na quase euforia pela iminência do socorro público à quebradeira privada.
Segundo analistas citados pelo jornal, a estratégia de comunicação do plano, por parte do governo Bush, foi péssima.
Poderia acrescentar que a imprensa também deixou de informar a opinião pública sobre os sinais de que as bancadas dos partidos Democrata e Republicano poderiam se rebelar contra a orientação de seus líderes.
Afinal, lá como cá, os deputados pensam primeiro em seus próprios mandatos e só depois no mérito das propostas.
Entre as falhas da ação de marketing do governo Bush, segundo esses analistas, estaria a falta de informações sobre as conseqüências da operação de socorro às instituições financeiras para o cidadão comum, o eleitor.
Não foi dito, por exemplo, que os contribuintes poderiam receber de volta pelo menos uma parte dos 700 bilhões de dólares que seriam repassados aos bancos.
Com a idéia, generalizada, de que se tratava de uma simples doação às instituições financeiras, paga pelo contribuinte, não houve como convencer os parlamentares a colocar sua reputação em risco.
O que o jornal não admite é que parte da responsabilidade pela desinformação deve ser colocada na conta da imprensa.
O noticiário repetiu durante todos estes dias como seria a operação financeira, mas omitiu outras questões que também interessam ao público.
Como, por exemplo, o dia seguinte do resgate.
A natureza do pacote
Hoje os jornais descrevem com mais detalhes o projeto que foi rejeitado.
Mas esse material tem pouca utilidade para os leitores, uma vez que nos próximos dias o que estará em votação no Congresso americano será outra proposta.
Algumas declarações colhidas de parlamentares que se opuseram ao pacote de socorro aos bancos indicam que o governo americano terá de explicitar melhor se a operação representa a estatização do passivo das instituições sob risco de falência ou se se trata de um negócio dentro dos padrões capitalistas.
Fala-se em limitação para os bônus milionários recebidos pelos executivos responsáveis pela ciranda que conduziu à crise, mas não há referências a possíveis punições.
No meio do noticiário sobre o pânico, o Globo acha espaço para fazer gracinhas.
Uma nota na seção de economia informa sobre as agruras do dono da revista Playboy, cujas ações caíram cerca de 60% neste ano.
Numa página dedicada às dificuldades políticas do presidente George Bush em final de mandato, o Globo informa que, aos 82 anos, Hugh Hefner acaba de perder a namorada de 28 anos e se vê obrigado a reduzir o número de empregados na famosa mansão de Playboy.
A notícia não tem nada a ver com as crise financeira.
Por essas e outras é que o jornal carioca não é levado muito a sério longe da orla da praia.
A crise e os detalhes do programa de socorro ao sistema financeiro dos Estados Unidos é o tema do Observatório da Imprensa na TV.
Qual é a verdadeira natureza do pacote?
Trata-se de uma guinada no capitalismo, ou de um negócio nos moldes tracicionais do sistema?
O governo americano estaria estatizando as perdas da iniciativa privada ou se trata apenas de um desvio temporário nos cânones do liberalismo?
E como a imprensa tem se comportado diante da crise?
Hoje, à meia-noite e dez pela TV Cultura, e pela TV Brasil, ao vivo, às 22h40.