Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

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A imprensa redescobre a miséria

A imprensa redescobriu no último final de semana a questão social. No domingo, a Folha de S.Paulo saiu com manchete sobre a queda da desigualdade e destacando que a renda cresceu mais no Nordeste do país do que no Sudeste.

Já o Estado de S.Paulo preferiu destacar o fato de que 10,5 milhões de brasileiros ainda vivem em domicílios com uma renda familiar de até R$ 39 por mês.

As duas reportagens são baseadas em dados do Censo 2010 divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento Social.

Os jornais ofereceram aos leitores um cardápio consistente, com o prosseguimento dos debates sobre a questão do sigilo eterno de documentos históricos, uma reportagem especial do Estadão sobre a luta secreta do cardeal D. Paulo Evaristo Arns contra a violência do regime militar e as homenagens aos 80 anos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Coube ao Globo dar o maior espaço ao ex-presidente, com uma entrevista de duas páginas no sábado.

Também houve lugar para relatos sobre as dificuldades de reintegração social dos jovens que deixam o narcotráfico, por conta das operações policiais que ocupam os morros do Rio de Janeiro.

Foi um fim de semana como havia muito não se oferecia aos leitores de jornais.

Para quem gosta de detalhes, sobra leitura até para meados da semana.

No entanto, percebe-se que o fôlego anda curto nas redações.

O súbito interesse demonstrado nas conquistas sociais, por exemplo, parece se esgotar rapidamente já na segunda-feira.

A nova semana começa e as manchetes voltam ser ocupadas basicamente por declarações.

A questão social abordada no domingo fica em suspenso porque a fila das pautas tem que andar.

Mas ao colocar no mapa da mídia os nomes de cidades como Belágua e Manari, no Maranhão, onde vivem os mais pobres entre os brasileiros, a imprensa já presta um bom serviço.

O desenho das desigualdades, registrado pelos jornais, marca alguns pontos para novas reportagens e cobrança permanente das autoridades.

A qualquer momento, equipes de TV podem se deslocar até esses lugares e mostrar, com imagens vivas, as diferenças de um Brasil que, no Sudeste, sai às ruas para pedir liberdade para a maconha e no Nordeste ainda luta pela sobrevivência.

Fim da era das mordaças

Alberto Dines:

– A mídia impressa rejeitou formalmente na semana passada qualquer embargo à divulgação de documentos oficiais. Fez bem, porque assim atendia ao seu compromisso em defesa da liberdade de expressão. Falta agora uma manifestação formal, firme e inequívoca contra outra ameaça de silêncio, desta vez imposta pela Fifa e pelo COI para encobrir licitações e custos das obras para a Copa e  Olimpíadas.

A opção dos veículos impressos em favor da transparência seria indispensável para desfazer a impressão de que a mídia funciona como um lobby compacto em defesa dos seus próprios interesses e não dos interesses da sociedade. Quanto mais diversificada apresentar-se a mídia, melhor será a sua imagem, quanto mais divergências forem registradas entre a mídia impressa e a mídia eletrônica — notadamente a televisão  – mais confiáveis parecerão os jornais e revistas. As redes de TV dependem da FIFA e do COI para sobreviver.

A mídia impressa não depende de governos, muito menos da generosidade dos caudilhos do esporte mundial e depois que aprendeu a levar a pauta esportiva para a capa e as páginas de opinião ganhou mais visibilidade e mais respeito dos segmentos jovens.  Se a repulsa aos embargos e sigilos conseguir empolgar os torcedores, terminará a era das mordaças.