A popularidade de Dilma
Os principais jornais do país tratam com naturalidade nesta quinta-feira, dia 5, os novos indicadores de avaliação positiva da presidente Dilma Rousseff por parte da população. São 77% de aprovação e apenas 19% de desaprovação, com 5% de abstenções, segundo o Ibope.
As análises dos especialistas consultados pela imprensa circulam em torno da percepção generalizada de bem-estar em função da situação econômica favorável e da interpretação comum segundo a qual a presidente também conta pontos positivos ao se contrapor ao jogo de pressões do Congresso.
Nesse entendimento, o Parlamento acaba representando o núcleo de poder que cria problemas e a presidente encarna a autoridade que recoloca as coisas no lugar.
Paralelamente, o Ibope detectou que a avaliação do governo permanece praticamente igual aos índices de dezembro, com 56% de “ótimo” e “bom”, 34% de “regular” e apenas 8% de “péssimo”.
Nesse quesito, como ensinava o professor de estatística Edmundo Eboli Bonini, recentemente falecido, é preciso trazer para a análise os fatores intangíveis que não aparecem nas planilhas.
Um desses fatores é o modo como a imprensa comunica os feitos do governo e de como essa ideia de “governo” é desmembrada pelo público em entidades diferentes – o Executivo, representado pela presidente, e o Congresso, visto como uma massa despersonalizada.
Algumas perguntas específicas feitas pelos pesquisadores de opinião remetem à observação mais acurada das ações governamentais e aos efeitos das políticas públicas.
É o caso das questões relacionadas ao controle da inflação, que obteve uma avaliação predominantemente favorável e ainda mais positiva do que na consulta de dezembro do ano passado.
Neste quesito, deve-se considerar que, em dezembro, o noticiário da imprensa ainda colocava o aumento de preços entre as grandes preocupações dos economistas.
De lá para cá, entre os temas de economia interna tem-se destacado a questão do câmbio e, eventualmente mas com igual importância, os desafios da indústria.
A questão da indústria e o problema do câmbio não parecem preocupar diretamente a maior parte da população.
O olhar da cidadania
Também se pode observar que, entre os itens mais bem avaliados destacam-se as ações governamentais contra a pobreza e a fome, que valem ao governo uma aprovação de 59%.
Embora esses temas não frequentem costumeiramente o noticiário, há uma percepção geral de que a autoridade se preocupa com os menos favorecidos.
Uma curiosidade mais intensa se manifesta em torno da questão específica sobre a carga tributária.
Esse tema árido, que frequenta nichos especializados da imprensa, começa a entrar no universo de preocupações da chamada nova classe média – formada basicamente por aquelas famílias que ascenderam socialmente no contexto criado pela estabilidade da economia, pelas políticas sociais e pelo modelo econômico baseado no estímulo ao mercado interno, que resulta em maior oferta de emprego e aumento da renda.
A ascensão social e econômica traz novas preocupações a essas famílias quanto ao valor líquido de suas receitas e as introduz como parte interessada nos debates sobre os custos de produção.
Esse aspecto da pesquisa do Ibope merece uma atenção maior dos jornalistas do que a questão da popularidade da presidente, colocada como central no noticiário.
Essa mudança, que à primeira vista pode parecer sutil demais para merecer um trabalho jornalístico mais reflexivo, deve estar no horizonte das questões que influenciam o planejamento estratégico das empresas de comunicação.
Quando se constata que muitos veículos de conteúdo jornalístico se voltam para as classes de renda média – como no caso explícito dos canais abertos da Rede Globo e, mais implicitamente, se pode deduzir das escolhas editoriais da Folha de S. Paulo e do jornal o Globo – seria de se esperar que os mais leves sinais de mudança no universo de preocupações desse público fossem considerados entre as informações estratégicas.
Nesse sentido, têm menos importância os dados sobre a popularidade ou aprovação pessoal da presidente do que a avaliação de desempenho do governo.
As opiniões gerais sobre a pessoa de uma autoridade se formam em torno de um conjunto de signos cuja interpretação pode ser muito influenciada por elementos subjetivos.
As avaliações sobre políticas públicas são informadas por fatores mais concretos e mensuráveis e exigem uma atitude de cidadão.
A percepção mais clara das ações de governo reveladas pela pesquisa Ibope indicam que a nova “classe média” evolui para um padrão de cidadania que convida a um olhar mais cuidadoso por parte da imprensa.