Mutação em curso
Nesta sexta-feira, dia 18, a imprensa amanheceu em estado de transe à espera das notícias sobre o lançamento inicial de ações da empresa Thefacebook.com.
Durante semanas anteriores, o fundador do maior e mais impactante fenômeno da internet promoveu uma apresentação itinerante de seu projeto para banqueiros e investidores, e nos últimos dias uma série de notícias negativas ameaçou minar o valor inaugural de suas ações.
Na véspera do acontecimento, os especialistas se dividiam entre aqueles que esperavam um estrondoso sucesso – com os títulos sendo negociados a US$ 38, no teto das estimativas, ou de uma quebra maior do que 50% do valor estimado.
Como sempre, o mercado se move em parte com base em cálculos de desempenho, e em parte com base nas especulações. Em qualquer caso, pesa muito o sentimento coletivo dos potenciais investidores.
No caso do Facebook, pesa muito a própria percepção dos investidores como usuários, que agregaram rapidamente à sua cultura o relacionamento proposto pelo negócio e entendem que as redes sociais digitais já estão consolidadas na sociedade contemporânea como extensões da vida comum.
Mas para os consultores de investimento, há outras ponderações a serem feitas.
Uma delas é a pergunta central do capitalismo: de onde virá o dinheiro?
No cálculo que considera US$ 38 a ação, estima-se que o Facebook irá alcançar um valor público inicial de US$ 104 bilhões, o que seria o terceiro maior lançamento em toda a história do mercado acionário americano.
No caso de uma alta valorização no lançamento, pode haver perdas em sequência se a procura se estancar, mas muitos analistas esperam o contrário: com um preço pouco abaixo das expectativas e somando-se o intenso noticiário a respeito, provavelmente haverá uma grande demanda nos dias seguintes, produzindo lucros imediatos e consistentes.
As ações do Linkedin, a rede social dedicada ao mercado profissional, dobraram no primeiro dia de negociações na Bolsa de Nova York, em 19 de maio de 2011.
O Facebook tem um alcance ainda maior e começa a ser descoberto pelas pequenas empresas como meio de divulgação de seus negócios.
Seu potencial para mudar o relacionamento das empresas com as pessoas é ainda desconhecido, uma vez que as métricas de audiência ainda não conseguem identificar o humor produzido pelas mensagens de publicização de negócios.
Mas não há dúvida de que, dependendo do que houver no mercado de ações nos próximos dias, estaremos no meio de uma importante mutação do capitalismo.
A imprensa na encruzilhada
Quanto ao objeto das nossas observações, a imprensa, muito tem sido afirmado e pouco se pode comprovar.
O que se sabe é que jornais, revistas, emissoras de televisão e de rádio constituídas sobre empresas de tipo tradicional, administradas por hierarquias rígidas e centralizadas, tentam participar da novidade à sua maneira, procurando colecionar “seguidores” e grupos de fãs nas redes sociais digitais.
Na complicada avaliação dessa relação, as empresas valorizam muito o número de “recomendações” que uma reportagem alcança, mas não são capazes de seguir o desenvolvimento das opiniões a partir daí.
São muito comuns os casos em que uma notícia de jornal é recomendada na rede para ser desmentida ou criticada em seguida, como foi o caso do objeto não identificado que atingiu a cabeça de um candidato durante a campanha eleitoral de 2010.
O que não se pode mais ignorar é que estamos assistindo e participando da consolidação de um processo acelerado de mudanças no sistema capitalista.
As redes sociais digitais representam claramente a capacidade de monetização de valores simbólicos e culturais, o que embaralha os conceitos de bens e produtos de consumo com outras questões, como a busca do prazer, a reputação social, a capacidade de agregar e influenciar pessoas, e novas formas de militância política.
O advento das comunicações digitais em rede talvez possa ser comparado às mudanças no período pós-industrial do capitalismo.
Já há indícios de que nas redes virtuais o capitalismo se torna social, o que implica em mudanças ainda mais profundas nos modos de relacionamento econômico.
Os jornais, como os conhecemos, surgiram na passagem do século 16 para o século 17, e participaram ativamente da difusão das ideias do Iluminismo, ajudando a consolidar o poder da burguesia.
O modo de fazer jornalismo mudou pouco em sua essência de lá para cá, enquanto tudo em volta se transformava.
Agora é a encruzilhada e as empresas tradicionais de mídia terão que demonstrar rapidamente sua capacidade de se reinventar.
Levando-se em conta o conservadorismo típico de suas estratégias, provavelmente vamos ver um jornalismo social em expansão e um jornalismo-proprietário em decadência.