Um rosário de frustrações
Os principais jornais do país saem por linhas diversas nesta quinta-feira, dia 21, ao comentar o documento final que deverá ser assinado pelos chefes de governo presentes à Conferência das Nações Unidas pelo Desenvolvimento Sustentável.
Entre os diários de circulação nacional, apenas o Globo leva em conta as dificuldades naturais para a busca de medidas concretas diante de um cenário de crise nos principais mercados do mundo, destacando algumas perspectivas que se abrem para os defensores do meio ambiente e de mudanças concretas no modelo econômico predador e socialmente injusto.
Os demais jornais fazem coro aos manifestantes que ocuparam as ruas do Rio de Janeiro para protestar contra os termos do acordo.
O Estado de S. Paulo chamou o resultado, em editorial, de “consenso do quase nada”, dando razão às duras críticas das Organizações Não Governamentais e às restrições feitas pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, ao texto que representa o compromisso dos países presentes no evento.
Para o jornal paulista, trata-se de um ajuste tipicamente diplomático, observando que os profissionais da negociação consideram um triunfo o fato de se chegar a uma versão aceita por todos os participantes, seja qual for ela.
No caso da Rio+20, sugere o jornal, a única qualidade do acordo obtido seria o fato de que a única alternativa para ele era a falta de acordo.
Mas , segundo o editorial, as propostas que levaram ao consenso “de nada valem”.
A Folha de S. Paulo, na mesma linha, foi ainda mais contundente ao iniciar seu editorial com a frase: “Malogrou a Rio+20”.
Citando explicitamente o secretário-geral da ONU, que desejava um documento final mais ambicioso, a Folha não encontrou palavra mais adequada do que “fracasso” para definir os termos do compromisso que os representantes do países membros da conferência deverão assinar até o encerramento do encontro, marcado para esta sexta-feira, dia 22.
A única qualidade vista pelo jornal foi o esforço do Itamaraty, representando o país anfitrião, para evitar que o evento terminasse como a conferência de Copenhague, em dezembro de 2009, que foi considerada pela imprensa mundial como um grande fracasso.
O principal desafio
O Globo apresenta uma visão diferente.
Para o jornal carioca, o principal mérito do documento que deve encerrar a cúpula é o de evitar o fracasso do encontro e manter os líderes mundiais mobilizados e comprometidos com a negociação de temas urgentes e complexos, como a necessidade de se criar um modelo de desenvolvimento sustentável e consolidar as bases do sistema produtivo e negocial que vem sendo chamado de “economia verde”.
Mais realista que seus concorrentes, o Globo observa também em editorial que não seria um encontro dessa natureza que iria resolver toda a questão da sustentabilidade, como metas e fontes de financiamento, ainda mais num contexto de crise econômica aguda na Europa e em ano eleitoral nos Estados Unidos.
Entre os pontos positivos, o jornal carioca destaca o fato de que a versão final do documento registra, já no primeiro parágrafo, que “a erradicação da pobreza é o maior desafio global e uma exigência indispensável para o desenvolvimento sustentável”.
De fato, para muitos especialistas que participam há décadas do movimento por mudanças fundamentadas nos princípios ecológicos, um dos principais desafios tem sido o de deslocar os debates das preocupações puramente ambientalistas e expandi-los para a questão da desigualdade social e das perversidades do sistema econômico concentrador de riqueza.
Essa busca, aliás, tem provocado críticas dos setores mais conservadores que têm acesso à imprensa, os quais acusam os militantes ambientalistas de serem na verdade esquerdistas dissimulados sob uma bandeira verde.
Os jornalistas que cobrem o setor há mais tempo sabem que só haverá mudanças significativas quando se consolidar a consciência de que o mundo precisa de novas formas de produção e distribuição de bens, alimentos e serviços que não apenas respeitem o meio ambiente, mas também contribuam para acabar com as iniquidades e reduzir a violência associada às desigualdades sociais e à corrupção.
Os especialistas sabem que um modelo como esse poderá oferecer até mesmo ao capital financeiro melhores condições operacionais, pela redução dos riscos em todos os negócios.
O pessimismo dos editoriais revela uma visão parcial do desafio mais complexo que a humanidade já enfrentou.