Augusto Nunes, no Jornal do Brasil de domingo (21/3), admitiu que, em sua coluna anterior, utilizou informações do jornalista René Ruschel sem lhe dar o crédito, o que, digo eu, foi um roubo. Nunes teve de fazê-lo porque foi denunciado por Ruschel que, para isso, recorreu ao site Comunique-se, de cujos leitores ele, o lesado, obteve solidariedade.
Para tentar explicar-se, o jornalista do JB reuniu a abundância de 496 palavras, incluindo o título do texto, de acordo com contagem feita pelo Word. Desse seu esforço salta a figura de alguém que, pego com a mão na botija, procura desvalorizar o conteúdo do recipiente, como se isso descriminasse o seu ato. Acabou protagonizando um vexame.
Um vexame, sim, mas nem por isso inútil. Pois desta vez Nunes prestou um serviço ao jornalismo, às avessas. Produziu uma preciosidade de como manobrar um texto para tentar desqualificar um roubo. Para se isentar, mostrou habilidade no manuseio das palavras e partiu para o massacre de alguém que reclamou de ter sido vítima de mão-leve. Essa pérola de Nunes tem de ser levada aos pretendentes a jornalistas, para que aprendam o que não deve ser feito, e a todos que prezam a ética.
No começo da coluna, Nunes diz que não atribuiu ao jornalista Ruschel ‘algumas informações’ que foram aproveitadas em seu artigo sobre o ministro José Dirceu (Casa Civil) por ‘excesso de zelo’, com o objetivo de não prejudicar a sua ‘fonte’ (aspas minhas), que é profissional empregado no fundo de pensão da Itaipu Binacional. Há aí uma mentira e uma omissão. A mentira: não se tratou de um surripio de apenas ‘algumas informações’, mas de muitas informações novas que Ruschel publicou em crônica na imprensa de Curitiba sobre a vida clandestina que Dirceu teve em Cruzeiro do Oeste.
Isso faz lembrar o caso Jayson Blair.
A omissão: a crônica – na verdade, um testemunho, daí a riqueza de informações – foi publicada antes do surgimento do caso Waldomiro Diniz e é neutra (a rigor, é mais para o beneplácito) em relação à conduta de Dirceu, o que Nunes não diz. Não há portanto nenhum cabimento no ‘excesso de zelo’ quanto a uma possível retaliação.
Também logo no início do seu – como direi? – esclarecimento, ele tenta desqualificar o conteúdo da botija ao afirmar que a crônica do jornalista de Curitiba não é ‘lá essas coisas, tanto na forma quanto no conteúdo’. Ora, se é assim, por que ele, com base no conteúdo da crônica, escreveu uma longa coluna, com 509 palavras?
Outra história
Em outro parágrafo, ao reforçar o desmerecimento a Ruschel, Nunes transcreve um trecho da crônica, com a maldosa advertência, antes, de um ‘sem correções’. Nunes não tem obrigação de corrigir os erros de português de Ruschel, agora seu desafeto, mas não deveria se arrogar porque também erra. O título da coluna deste domingo faz referência a um discurso de Dirceu, e é ‘Namorar com o perigo é isso aí’. O jornalista deveria saber que basta dizer ‘namorar’, o ‘com’ é desnecessário – erro que se repete no texto. Já que é para ser maldoso, afirmo que se ele prestasse a atenção no que Dirceu diz, e para isso bastaria ler ao menos o JB, onde trabalha, não cometeria tal desacerto.
O massacre de Ruschel por Nunes vale-se também da dedução capciosa – uma covardia. O jornalista do JB deduz que Ruschel, só porque este reclamou a autoria do que lhe pertence, compactua com a decisão de Dirceu de ter deixado em Cruzeiro do Oeste sua mulher (‘uma jovem desinformada’) e seu filho (‘um bebê’) ao fim de sua clandestinidade. É uma empulhação, porque sobre isso o jornalista de Curitiba não dá nenhum indício.
Somente no último parágrafo Nunes poupa o cronista, e ataca Dirceu, o qual, quando líder universitário, segundo o jornalista do JB, namorou ‘com’ (sic) o perigo de nome Heloísa Helena, uma espiã infiltrada no movimento estudantil. ‘Dirceu caiu nessa.’
Nunes tem sido duro com Dirceu, e é o que se espera neste momento de todo cidadão, mas lhe falta agilidade mental para combater o governo que abriga um ministro suspeito de envolvimento com o crime organizado. Ao lembrar que Dirceu foi bobão ao deixar aproximar-se pela espiã, ele corre o risco de endossar a tese governista de que o petista, também agora, foi ingênuo ao colocar Waldomiro Diniz na sala ao lado da sua, no Palácio do Planalto. E a história pode não ser bem essa. Diante do exposto, bobão mesmo, a partir de agora, é o leitor de Nunes. Pobre leitor!